CONTRA O LATROGENOCÍDIO DO POVO LÍBIO


CONTRA O LATROGENOCÍDIO DO POVO LÍBIO



Mantemos a recomendação do vídeo de Jean-Luc Godard, com sua reflexão sobre a cultura européia-ocidental, enquanto a agressão injusta à Nação Líbia perdurar.




Como contraponto à defesa de civis pelos americanos, alardeada em quase todas as recentes guerras de agressão que promovem, recomendamos o vídeo abaixo, obtido pelo Wikileaks e descriptografado pela Agência Reuters

sexta-feira, 27 de março de 2009

A Crônica do Futebol e o que ela não fala, por Mateus Alves da Silva

- em março/09

No universo lúdico do homem, é inegável o papel dos esportes. Acompanhando o processo civilizatório, eles acabaram, de certo modo, substituindo os embates diretos em que se buscava, não a sobreposição apenas no campo moral do adversário, como se dá no geral nas práticas esportivas atuais, mas, sim, a sobreposição em relação à própria pessoa do oponente, como ocorria, por exemplo, com os gladiadores romanos, os combates medievais ou os lutadores indianos, cujo triunfo era a quantidade de dentes arrancados, de olhos vazados etc.

É meio complicado dizer se houve algum avanço do ponto de vista do desenvolvimento daquilo que sonhamos, e pressupomos, existir como humanismo. Certo é, no entanto, que, em geral, a despeito de práticas chamadas esportivas como essas que ainda há, por exemplo, nos chamados “vale-tudo”, nos realizamos nesse espaço lúdico por meio de outras formas de dizer que somos melhores. Pelo menos, mesmo nas tais “lutas livres”, conquanto tintos de sangue, não precisamos mais comer a carne do abatido.

A essência da competição, entretanto, continua a mesma, e, se nossa equipe se sobressai, não há como negar um certo gosto na boca, tão agradável agora como antes. E que, talvez, continue sendo mais agradável para a platéia do que para os próprios confrontantes.

Cá entre nós, brasileiros, dizer dessas batalhas atualizadas é, necessariamente, tocar no futebol, ou no ludo pedium (jogo, sonho, com os pés).

Afinal, é esse o grande ramo esportivo que consegue nos mover; desde o carioca mais carioca da zona mais carioca do Rio de Janeiro até o paulista mais paulista da zona mais paulistana de São Paulo. Ou, se quiserem, desde o índio atualmente mais índio da aldeia mais indígena do Alto Xingu até o peão mais peão da última estância de los pampas gaúchos.
Somos, em termos de realização lúdica, um imenso estádio de futebol. Pelo menos no domingo à tarde.

E, por conta disso, há que se observar até mesmo o significado econômico dessa realização, enquanto espetáculo e espetáculo público.

Basta ver o seguinte: considere, por exemplo, a sabida existência de, num só Estado da Federação, como, por exemplo, o de Minas Gerais, de mais de mil clubes de futebol. Coloque aí apenas o material esportivo que isso mobiliza e já se tem certo volume. Acrescente aparato administrativo, some material de torcidas etc. Por fim, considere a movimentação midiática, incluindo a venda de produtos atrelada, e vejamos a que parcela do PIB se chega. Enorme, sem dúvida.

Diante disso, talvez, fosse o caso de sondarmos como se dá a estruturação disso tudo, a começar pela forma como são formados seus personagens principais, ou seja, os atletas do futebol.

E essa, asseguro-vos, em geral, é de entristecer qualquer um.

Ora, basta dizer que já não se tem mais sequer o necessário espaço físico para isso, pois os campos de futebol foram simplesmente tragados pela voracidade da especulação imobiliária. O que sobrou é deveras insuficiente e sofrível. Joga-se, hoje, principalmente em estágio de formação, em cada coisa de arrepiar os cabelos.

A crônica esportiva, a cargo, em geral, desses senhores que, aliás, às vezes, parecem mal distinguir entre a bola e a trave, deveria ser, no mínimo, mais respeitosa com os rapazes que conseguiram chegar à prática profissional do futebol. Assim como deveria ser mais respeitosa com seus treinadores e com as equipes técnicas, desde o roupeiro até os departamentos médicos.
Ou não sabem, ou convenientemente não querem saber, das dificuldades desses todos? É lógico que sabem, ou deveriam saber. Afinal, que cronistas são esses que desconhecem as condições de trabalho do objeto de seu ganha-pão?

Se não há sequer espaço físico decente para se iniciar nessa carreira, o resto se imagina.

Mas não é mera imaginação, não, senhores meus, é real. São reais os campos em que se treina, aspirando poeira semanal de fazer inveja a qualquer silicótico. São reais os treinadores que ali se apresentam com salários atrasados por mais de 3 meses. Alguns treinando equipes, até mesmo de clubes importantíssimos, sem o mero benefício de um almoço, porque o dono da mercearia resolveu achar real a conta pendente. E os cronistas falam de “salários atrasados” sem a menor cerimônia, como se estivessem falando de safras de vinho.

São reais os meninos que se deslocam, em grandes centros, mais de 2 horas a pé, pela falta de um simples vale-transporte, para se apresentar no treino E, se não chegam ou chegam de “corpo mole”, haverá ainda outro um que se deslocou duas horas e meia em condições semelhantes e lhe tomará o lugar. E lhe tomara o lugar para correr horas seguidas em campos que são verdadeiras armadilhas para meniscos e ligamentos.Tudo isso, para, lograrem o êxito de se apresentarem no profissional um dia, como jogadores ou técnicos, e depois, serem tratados pela crônica esportiva refrigerada como se fossem a quintessência do nada.

E a realidade é cruel na forma e no conteúdo. O conteúdo, aliás, compreende todo um drama humano de fazer inveja a qualquer dramaturgo. Não raro, sobre as pernas franzinas que ali se apresentam, há toda uma carga de esperança de redenção familiar. É o pai que, saído diretamente do turno noturno na fábrica, os olhos chispados de sono, espera pelo gol ou pelo acerto do passe como se fosse a justificativa de mil e tantas humilhações. É a mãe que percorreu quilômetros desde a estação do trem ou do ônibus, acompanhando como podia, até render-se ofegante e dizer: - vai, filho, corre na frente, para não se atrasar, que eu já não aguento mais.

O Ministério Público mesmo volta e meia cai em cima de clubes esportivos e até mesmo de agentes empresários, por manterem meninos deslocados de outras partes do país em concentrações insatisfatórias. Deveria perguntar por que é que se submetem a isso. Certa vez, um amigo meu questionou um rapaz na porta de um cinema em Brasília, indagando-lhe por que ele havia deixado sua terra lá nos confins do Piauí, para ir vender balas na Capital. Resposta simples e objetiva, na lata: - “lá nem bala tem”.

O quadro é muito complexo, mas não nos dispensa de estarmos atentos para o drama humano que ele envolve.

Respeito, portanto, senhores da crônica esportiva. Se querem avacalhar alguém, comecem por perguntar qual é o grau de colaboração que prestam, nessa área da formação dos atletas, por exemplo, essas grandes e famosas corporações cujas marcas são expostas e vendidas nos corpos de tais profissionais. Comparem o seu faturamento e o quanto investem, por exemplo, para criar a base que faz rolar seu negócio. Indaguem, por exemplo, quantos campos de futebol a Nike e a Adidas já criaram e mantém aqui no Brasil. Perguntem quantas equipes de base elas sustentam.

Verão que é nada. Abocanhamento só. Gula desmedida. Exploração do próximo.

E vão continuar despejando sua santa e indignada ira apenas no chute errado ou na escalação mal feita?!.

- escrito para publicação no blog, em março/09

Nenhum comentário:

Postar um comentário