em 16/6/2009
Reproduzido do blog do autor; 12/6/2009; título original "Blog dá um susto na grande imprensa"
Muito se fala sobre blog da Petrobras criado para responder a perguntas enviadas pela imprensa e defender-se de pautas negativas, por conta da CPI no Congresso. O Fatos e Dados foi lançado no início de junho para "manter um canal de comunicação rápida e direta com o público, dedicado a apresentar fatos e dados recentes da Petrobras, o posicionamento da empresa sobre as questões relativas à Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) e esclarecimentos solicitados pela imprensa".
A grande polêmica gerada pelo blog decorre da iniciativa da Petrobras publicar as pautas (perguntas) dos jornalistas, com as respostas da empresa, antes da publicação da matéria. Para a grande imprensa e jornalistas de redação, essa iniciativa estaria ferindo o princípio da exclusividade. Para advogados e professores de comunicação, embora não seja ilegal, a iniciativa pode ser incorreta e até autoritária. Segundo a Petrobras, a publicação visa dar transparência ao seu relacionamento com a imprensa.
Nem tanto ao céu, nem tanto a terra. Trata-se de um bom case de comunicação. Essa provocação à grande mídia, se aparenta uma ousadia, desafia a empresa a ser mais transparente e enfrentar uma pressão maior da imprensa. Não há dúvida de que estamos em outros tempos. Os blogs e demais redes sociais representam um avanço em relação ao atraso da imprensa tradicional. Por isso chega a ser patética, para não dizer ridícula, a manchete da Folha de S.Paulo do dia 2 de junho: "Avião com 228 a bordo some no mar no trajeto Rio-Paris". Qualquer criança no uso da razão já conhecia essa notícia um dia antes da manchete.
Mas voltemos à polêmica. Nos primeiros dias o centro das críticas foi a iniciativa da Petrobras de antecipar no blog as respostas de pautas, mesmo as exclusivas. A Associação Nacional de Jornais (ANJ) reagiu, pela "prática contrária aos princípios universais da liberdade de imprensa". A grande imprensa acusou a Petrobras de atentar contra a ética, por adiantar no blog temas exclusivos do jornalista. É verdade que a Associação Brasileira de Imprensa (ABI) considerou legítima a iniciativa, em nota de conteúdo mais político do que técnico. Jornalistas se dividiram em críticas e elogios à tentativa ousada de intimidar ou de enfrentar o poder da imprensa. Nada mais do que o jus sperneandi.
Diante da escorregada da Petrobras, em querer reinventar o jornalismo, publicando antecipadamente as perguntas e respostas das pautas, até mesmo exclusivas, houve pressão para que a empresa voltasse atrás. Isso aconteceu em 10 de junho, quando o blog admitiu que "dará publicidade ao conjunto de perguntas e respostas (...) a partir da zero hora do dia em que está prevista a publicação da reportagem". Daria assim tempo de os veículos de comunicação trabalharem o tema antes da divulgação pelo blog.
Apesar do recuo, a logística burocrática para controlar essa divulgação deverá ser tão complicada, que até mesmo para a Petrobras, com 1.150 funcionários na área de comunicação, não será fácil. A questão suscitada por alguns órgãos de imprensa é a Petrobras querer determinar quando a matéria deverá sair, decisão, naturalmente, que só compete ao veículo. Como se sabe, muitas vezes uma matéria programada para sair amanhã, cai na hora do fechamento, por conta de outras mais importantes que entram na última hora. E aí? Como ajustar quem publica o quê?
A Petrobras tem apregoado nas suas justificativas o compromisso de publicar os esclarecimentos com o máximo de transparência. Depende. As fontes oficiais gostam muito dessa palavra. Aliás, transparência é uma das palavras mais ouvidas e usadas em Brasília. Mas, em contraposição, é a que menos se pratica. A resposta da Petrobras sempre vai representar o viés da empresa. Mas é importante que a opinião pública, incluídos funcionários, acionistas, clientes, fornecedores, investidores internacionais e tantos outros conheçam a explicação que ela deu à imprensa.
O fim do furo
A Petrobras, desde o início da polêmica, descartou que a publicação das perguntas dos jornalistas caracterizasse quebra do sigilo, por considerar que as informações prestadas pertencem à empresa. Esse argumento não resistiu, pela completa insensatez. A Petrobras diz que não há quebra de sigilo, porque "a relação entre a Petrobras e os veículos de comunicação que a interpelam é essencialmente pública (...) Tanto as respostas da Petrobras são públicas quanto as perguntas dos repórteres também o são, ou deveriam ser".
Outra polêmica suscitada. As perguntas de um repórter não são públicas, até o momento em que ele as publiciza, ao divulgar a reportagem. A não ser que a Petrobras esteja decretando o fim do furo e da exclusividade, um diferencial que continua sendo perseguido por todos os jornalistas em qualquer lugar do planeta. Na relação entre imprensa e fonte, o problema não é de confidencialidade, como também alegaram alguns editoriais da grande imprensa. Existe, apenas um acordo tácito de confiança de que a pauta é exclusiva e deve ser preservada, ainda que seja um tema indigesto para a corporação. Pelo menos sempre foi assim.
Um outra pergunta. A Petrobras aboliu a prática de dar entrevista ou informação exclusiva para algum jornalista ou colunista, outra rotina nas relações entre fontes e jornalistas? Ela vai publicar as exclusivas antes ou depois da entrevista? Como diz Cláudio Weber Abramo, "o princípio deveria ser o mesmo – se a ideia é comunicar-se com o público sem a intermediação dos veículos de comunicação, então essas notícias `plantadas´ precisariam também ser divulgadas no blog da empresa assim que formuladas por sua assessoria de imprensa" (ver "Quando a fonte abre o jogo").
Sem dúvida, a ideia do blog pode ter sido uma boa sacada para enfrentar a arrogância da imprensa e para preservar a fidelidade às informações fornecidas aos jornalistas. O único perigo é associar a criação do blog, legítima e oportuna, à defesa de temas relacionados com a CPI. Pode passar a ideia de que a Petrobras quer apenas se defender dos ataques por conta das investigações. E mais: se o blog nasceu em função CPI, o seu tempo de vida útil é só enquanto durar a Comissão?
Como fica o consumidor ou leitor
Permeou bastante nessa discussão o direito da Petrobras publicar quando e onde quiser as informações que lhe dizem respeito. Tudo bem. Vamos refletir sobre isso. Um acionista da Petrobras, aqui e no exterior, gostaria de saber notícias da empresa unicamente por uma única fonte, ou seja, a própria Petrobras? Certamente não. A imprensa – num conceito elástico que incluiria qualquer tipo de publicação – tem um papel importante na fiscalização e acompanhamento do poder público. Isso inclui empresas de comunicação, jornalistas autônomos, blogueiros e comentaristas de todos os matizes, que fazem parte dessa teia. É extremamente salutar para a sociedade que as instituições e governos sejam acompanhados por opiniões diversificadas, não importando se a grande mídia ou as redes sociais.
A Petrobras não pode pretender ser a única fonte das próprias notícias. Até pelos múltiplos interesses em que está envolvida. Tem todo o direito de editar e responder como bem entende, mas os consumidores e acionistas precisam também ter o contraponto, que só pode vir de outras fontes. O problema está em que os jornalistas das redações transformaram a notícia em debate, criando um antagonismo entre a versão e a pauta, uma brigando com a outra. De tanto distorcer, acabaram com a boca torta. Agora reclamam. Essa reação, por mais polêmica que seja, resulta de anos de arrogância e edição de reportagens com o objetivo mais de emplacar a primeira página do que informar. Afrouxaram os controles, permitiu-se um tipo de jornalismo investigativo que beira, em muitos casos, a apuração policial, dando pouca margem ao contraditório.
Mas um blog não vai resolver esse impasse. Ao se admitir que um blog resolveria por si só o dilema da transparência das organizações, alguém acreditaria que o Congresso Nacional divulgaria no seu blog todos os contratos de "fantasmas" que assinou nos últimos anos, incluindo os secretos, que contratam neto de Senador ou esposas de parlamentares? Será que esse blog publicaria todos os gastos com passagens, incluindo roteiros, de suas excelências, tudo pago com o dinheiro público, ainda que pautado por jornalistas? Claro que não. Esse é um papel que cabe a outras forças da sociedade, como a imprensa, as redes sociais, as universidades, agências independentes, ONGs e tantas outras surgidas nos últimos anos.
Embora a idéia do blog seja um avanço nas relações entre fonte e imprensa, para ser transparente, existem também outros mecanismos. Por que não utilizar o site da instituição? É o endereço natural para quem deseja saber o que acontece na organização. O problema é que os sites estão mais voltados hoje para fazer pirotecnia mercadológica do que em esclarecer e informar. Basta dar uma olhada nos sites das telefônicas. Em resumo, mesmo com o compromisso da transparência, não há nenhuma garantia para a sociedade de que a simples criação de um blog vai torná-la mais transparente.
Por que a grande mídia esperneou?
A grande mídia está numa encruzilhada. Nos países desenvolvidos, jornais e revistas perdem receita e leitores. Os jornais lutam com dificuldades para manter o padrão do jornalismo de 30 anos atrás, pelo menos. Reduziram os quadros e caiu a qualidade. Ao mesmo tempo, a "revolução das fontes", faz cada vez mais o jornalismo se auto-referenciar. A mídia, mesmo nos portais da internet, se repete e as coberturas são pasteurizadas e comoditizadas. As diferenças são muito pequenas. Com isso, a concorrência da internet, principalmente de sites e blogs independentes, conduzidos por jornalistas experientes e consagrados, é uma ameaça real ao futuro da mídia tradicional.
Além disso, no Brasil, principalmente após o impeachment do ex-presidente Fernando Collor, a imprensa arvorou-se em promotor, juiz e algoz. Valendo-se do denuncismo fácil, até os órgãos fiscalizadores embarcaram nesse jornalismo de vazamentos. Deu no que deu. Os grandes jornais e revistas passaram a pautar o Congresso, CPIs, Polícia Federal, TCU e outros órgãos de fiscalização. Ou seja, pautam o país. Documentos incompletos ou ainda em apuração vazam com a mesma velocidade com que somem da mídia, diante das evasivas, inconsistências ou explicações dos envolvidos.
Quando a imprensa reclama de "quebra de confidencialidade", certamente isso só vale quando ela prova do próprio veneno. Apenas um exemplo. A quebra de sigilo bancário, fiscal e telefônico nas CPIs, significa transferir essas informações sigilosas às Comissões. Elas não podem, portanto, ser vazadas. O sigilo é transferido, não aberto. O que fazem os jornalistas, auxiliados por fontes inescrupulosas e que gostam de fazer média com a mídia? Expõem todos os dados confidenciais de qualquer pessoa, sem qualquer escrúpulo, assim como gravações, muitas vezes integrantes de processos que correm em sigilo. Criou-se o jornalismo do menor esforço, a indústria do dossiê.
Durante a CPI dos Correios, em 2005 e 2006, foram produzidas manchetes infladas por fontes interessadas, que acabavam murchando no dia seguinte, porque as reportagens não tinham qualquer sustentação técnica ou comprovação em documentos ou fatos. Eram rapidamente desmontadas pelas fontes. Elas simplesmente saíam da cabeça do jornalista, pautado por políticos, empresários, desafetos, concorrentes, candidatos a cargos no governo, com factóides que não duravam 24 horas. Revistas semanais disputavam uma verdadeira gincana para ver quem dava o furo da semana. Resultado, apareciam matérias surrealistas, com erros de apuração e sem qualquer fundamentação. Mas, e daí? A sociedade seria melhor sem essa imprensa, ainda que com imperfeições e interesses? Ninguém acredita.
Malgrado todos esses defeitos, a grande imprensa continua sendo o principal meio de informação da sociedade. É óbvio que o leitor, telespectador, ouvinte quer saber o que acontece no país pela imprensa. É onde se digladiam as diversas forças que compõem a sociedade. E não pelos blogs ou jornais internos. É só fazer uma pesquisa. Em que você acredita mais? Nas informações publicadas pela Petrobras ou nas notícias divulgadas sobre ela na imprensa? A resposta é óbvia. Nenhuma empresa, mesmo na iniciativa privada, por mais transparente que seja, vai esquentar informações para se questionar, levantando mazelas, suspeitas, questionando atos de gestão ou denunciando funcionários. São assuntos internos conduzidos pelas auditorias, sempre em segredo.
Posto isto, o papel da imprensa como ombudsman da sociedade continua intocável e inatacável. Os modos de fazer é que estão mudando. Os grandes furos de reportagem estão acabando, porque qualquer pessoa pode ser um editor de informação. Ninguém quer tirar o poder de edição da imprensa. Foi a força da internet e das redes sociais que tirou. Quem deu a notícia do atentado na Universidade Virgina Tech, nos EUA, em 2007, foram os alunos por meio de torpedos enviados aos pais, amigos e parentes. A mídia só chegou depois. Na Alemanha, em maio, um candidato ficou sabendo do resultado da eleição pelo twitter, antes de ser publicado o resultado oficial.
A imprensa continua ainda a ser o vetor natural de informações sobre o que acontece na sociedade. O problema de um blog em nome da empresa, feito sob o viés do pensamento único e da autoproteção, é que nem sempre ele conta tudo. No caso do Fatos e Dados, até mesmo as centenas de comentários recebidos podem ser uma ameaça à credibilidade. Internautas que enviaram críticas ou sugestões de temas para apuração na CPI se queixam de que os comentários foram expurgados e não apareceram. Se é verdade, aí a coisa se complica. Blog no ar implica riscos, ou seja, receber comentários favoráveis ou desfavoráveis. Desde que não sejam ofensivos, desrespeitosos, devem todos ser postados. Se transparência é um propósito, vale em todos os sentidos. Como diz o professor Carlos Chaparro, "no blog, a empresa se expõe, inclusive em suas fragilidades. Uma delas, a de só dizer o que lhe convém, fazendo propaganda e não jornalismo".
BLOG DA PETROBRÁSUm susto na grande imprensa
Por João José Forni em 16/6/2009
Reproduzido do blog do autor; 12/6/2009; título original "Blog dá um susto na grande imprensa"
Muito se fala sobre blog da Petrobras criado para responder a perguntas enviadas pela imprensa e defender-se de pautas negativas, por conta da CPI no Congresso. O Fatos e Dados foi lançado no início de junho para "manter um canal de comunicação rápida e direta com o público, dedicado a apresentar fatos e dados recentes da Petrobras, o posicionamento da empresa sobre as questões relativas à Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) e esclarecimentos solicitados pela imprensa".
A grande polêmica gerada pelo blog decorre da iniciativa da Petrobras publicar as pautas (perguntas) dos jornalistas, com as respostas da empresa, antes da publicação da matéria. Para a grande imprensa e jornalistas de redação, essa iniciativa estaria ferindo o princípio da exclusividade. Para advogados e professores de comunicação, embora não seja ilegal, a iniciativa pode ser incorreta e até autoritária. Segundo a Petrobras, a publicação visa dar transparência ao seu relacionamento com a imprensa.
Nem tanto ao céu, nem tanto a terra. Trata-se de um bom case de comunicação. Essa provocação à grande mídia, se aparenta uma ousadia, desafia a empresa a ser mais transparente e enfrentar uma pressão maior da imprensa. Não há dúvida de que estamos em outros tempos. Os blogs e demais redes sociais representam um avanço em relação ao atraso da imprensa tradicional. Por isso chega a ser patética, para não dizer ridícula, a manchete da Folha de S.Paulo do dia 2 de junho: "Avião com 228 a bordo some no mar no trajeto Rio-Paris". Qualquer criança no uso da razão já conhecia essa notícia um dia antes da manchete.
Mas voltemos à polêmica. Nos primeiros dias o centro das críticas foi a iniciativa da Petrobras de antecipar no blog as respostas de pautas, mesmo as exclusivas. A Associação Nacional de Jornais (ANJ) reagiu, pela "prática contrária aos princípios universais da liberdade de imprensa". A grande imprensa acusou a Petrobras de atentar contra a ética, por adiantar no blog temas exclusivos do jornalista. É verdade que a Associação Brasileira de Imprensa (ABI) considerou legítima a iniciativa, em nota de conteúdo mais político do que técnico. Jornalistas se dividiram em críticas e elogios à tentativa ousada de intimidar ou de enfrentar o poder da imprensa. Nada mais do que o jus sperneandi.
Diante da escorregada da Petrobras, em querer reinventar o jornalismo, publicando antecipadamente as perguntas e respostas das pautas, até mesmo exclusivas, houve pressão para que a empresa voltasse atrás. Isso aconteceu em 10 de junho, quando o blog admitiu que "dará publicidade ao conjunto de perguntas e respostas (...) a partir da zero hora do dia em que está prevista a publicação da reportagem". Daria assim tempo de os veículos de comunicação trabalharem o tema antes da divulgação pelo blog.
Apesar do recuo, a logística burocrática para controlar essa divulgação deverá ser tão complicada, que até mesmo para a Petrobras, com 1.150 funcionários na área de comunicação, não será fácil. A questão suscitada por alguns órgãos de imprensa é a Petrobras querer determinar quando a matéria deverá sair, decisão, naturalmente, que só compete ao veículo. Como se sabe, muitas vezes uma matéria programada para sair amanhã, cai na hora do fechamento, por conta de outras mais importantes que entram na última hora. E aí? Como ajustar quem publica o quê?
A Petrobras tem apregoado nas suas justificativas o compromisso de publicar os esclarecimentos com o máximo de transparência. Depende. As fontes oficiais gostam muito dessa palavra. Aliás, transparência é uma das palavras mais ouvidas e usadas em Brasília. Mas, em contraposição, é a que menos se pratica. A resposta da Petrobras sempre vai representar o viés da empresa. Mas é importante que a opinião pública, incluídos funcionários, acionistas, clientes, fornecedores, investidores internacionais e tantos outros conheçam a explicação que ela deu à imprensa.
O fim do furo
A Petrobras, desde o início da polêmica, descartou que a publicação das perguntas dos jornalistas caracterizasse quebra do sigilo, por considerar que as informações prestadas pertencem à empresa. Esse argumento não resistiu, pela completa insensatez. A Petrobras diz que não há quebra de sigilo, porque "a relação entre a Petrobras e os veículos de comunicação que a interpelam é essencialmente pública (...) Tanto as respostas da Petrobras são públicas quanto as perguntas dos repórteres também o são, ou deveriam ser".
Outra polêmica suscitada. As perguntas de um repórter não são públicas, até o momento em que ele as publiciza, ao divulgar a reportagem. A não ser que a Petrobras esteja decretando o fim do furo e da exclusividade, um diferencial que continua sendo perseguido por todos os jornalistas em qualquer lugar do planeta. Na relação entre imprensa e fonte, o problema não é de confidencialidade, como também alegaram alguns editoriais da grande imprensa. Existe, apenas um acordo tácito de confiança de que a pauta é exclusiva e deve ser preservada, ainda que seja um tema indigesto para a corporação. Pelo menos sempre foi assim.
Um outra pergunta. A Petrobras aboliu a prática de dar entrevista ou informação exclusiva para algum jornalista ou colunista, outra rotina nas relações entre fontes e jornalistas? Ela vai publicar as exclusivas antes ou depois da entrevista? Como diz Cláudio Weber Abramo, "o princípio deveria ser o mesmo – se a ideia é comunicar-se com o público sem a intermediação dos veículos de comunicação, então essas notícias `plantadas´ precisariam também ser divulgadas no blog da empresa assim que formuladas por sua assessoria de imprensa" (ver "Quando a fonte abre o jogo").
Sem dúvida, a ideia do blog pode ter sido uma boa sacada para enfrentar a arrogância da imprensa e para preservar a fidelidade às informações fornecidas aos jornalistas. O único perigo é associar a criação do blog, legítima e oportuna, à defesa de temas relacionados com a CPI. Pode passar a ideia de que a Petrobras quer apenas se defender dos ataques por conta das investigações. E mais: se o blog nasceu em função CPI, o seu tempo de vida útil é só enquanto durar a Comissão?
Como fica o consumidor ou leitor
Permeou bastante nessa discussão o direito da Petrobras publicar quando e onde quiser as informações que lhe dizem respeito. Tudo bem. Vamos refletir sobre isso. Um acionista da Petrobras, aqui e no exterior, gostaria de saber notícias da empresa unicamente por uma única fonte, ou seja, a própria Petrobras? Certamente não. A imprensa – num conceito elástico que incluiria qualquer tipo de publicação – tem um papel importante na fiscalização e acompanhamento do poder público. Isso inclui empresas de comunicação, jornalistas autônomos, blogueiros e comentaristas de todos os matizes, que fazem parte dessa teia. É extremamente salutar para a sociedade que as instituições e governos sejam acompanhados por opiniões diversificadas, não importando se a grande mídia ou as redes sociais.
A Petrobras não pode pretender ser a única fonte das próprias notícias. Até pelos múltiplos interesses em que está envolvida. Tem todo o direito de editar e responder como bem entende, mas os consumidores e acionistas precisam também ter o contraponto, que só pode vir de outras fontes. O problema está em que os jornalistas das redações transformaram a notícia em debate, criando um antagonismo entre a versão e a pauta, uma brigando com a outra. De tanto distorcer, acabaram com a boca torta. Agora reclamam. Essa reação, por mais polêmica que seja, resulta de anos de arrogância e edição de reportagens com o objetivo mais de emplacar a primeira página do que informar. Afrouxaram os controles, permitiu-se um tipo de jornalismo investigativo que beira, em muitos casos, a apuração policial, dando pouca margem ao contraditório.
Mas um blog não vai resolver esse impasse. Ao se admitir que um blog resolveria por si só o dilema da transparência das organizações, alguém acreditaria que o Congresso Nacional divulgaria no seu blog todos os contratos de "fantasmas" que assinou nos últimos anos, incluindo os secretos, que contratam neto de Senador ou esposas de parlamentares? Será que esse blog publicaria todos os gastos com passagens, incluindo roteiros, de suas excelências, tudo pago com o dinheiro público, ainda que pautado por jornalistas? Claro que não. Esse é um papel que cabe a outras forças da sociedade, como a imprensa, as redes sociais, as universidades, agências independentes, ONGs e tantas outras surgidas nos últimos anos.
Embora a idéia do blog seja um avanço nas relações entre fonte e imprensa, para ser transparente, existem também outros mecanismos. Por que não utilizar o site da instituição? É o endereço natural para quem deseja saber o que acontece na organização. O problema é que os sites estão mais voltados hoje para fazer pirotecnia mercadológica do que em esclarecer e informar. Basta dar uma olhada nos sites das telefônicas. Em resumo, mesmo com o compromisso da transparência, não há nenhuma garantia para a sociedade de que a simples criação de um blog vai torná-la mais transparente.
Por que a grande mídia esperneou?
A grande mídia está numa encruzilhada. Nos países desenvolvidos, jornais e revistas perdem receita e leitores. Os jornais lutam com dificuldades para manter o padrão do jornalismo de 30 anos atrás, pelo menos. Reduziram os quadros e caiu a qualidade. Ao mesmo tempo, a "revolução das fontes", faz cada vez mais o jornalismo se auto-referenciar. A mídia, mesmo nos portais da internet, se repete e as coberturas são pasteurizadas e comoditizadas. As diferenças são muito pequenas. Com isso, a concorrência da internet, principalmente de sites e blogs independentes, conduzidos por jornalistas experientes e consagrados, é uma ameaça real ao futuro da mídia tradicional.
Além disso, no Brasil, principalmente após o impeachment do ex-presidente Fernando Collor, a imprensa arvorou-se em promotor, juiz e algoz. Valendo-se do denuncismo fácil, até os órgãos fiscalizadores embarcaram nesse jornalismo de vazamentos. Deu no que deu. Os grandes jornais e revistas passaram a pautar o Congresso, CPIs, Polícia Federal, TCU e outros órgãos de fiscalização. Ou seja, pautam o país. Documentos incompletos ou ainda em apuração vazam com a mesma velocidade com que somem da mídia, diante das evasivas, inconsistências ou explicações dos envolvidos.
Quando a imprensa reclama de "quebra de confidencialidade", certamente isso só vale quando ela prova do próprio veneno. Apenas um exemplo. A quebra de sigilo bancário, fiscal e telefônico nas CPIs, significa transferir essas informações sigilosas às Comissões. Elas não podem, portanto, ser vazadas. O sigilo é transferido, não aberto. O que fazem os jornalistas, auxiliados por fontes inescrupulosas e que gostam de fazer média com a mídia? Expõem todos os dados confidenciais de qualquer pessoa, sem qualquer escrúpulo, assim como gravações, muitas vezes integrantes de processos que correm em sigilo. Criou-se o jornalismo do menor esforço, a indústria do dossiê.
Durante a CPI dos Correios, em 2005 e 2006, foram produzidas manchetes infladas por fontes interessadas, que acabavam murchando no dia seguinte, porque as reportagens não tinham qualquer sustentação técnica ou comprovação em documentos ou fatos. Eram rapidamente desmontadas pelas fontes. Elas simplesmente saíam da cabeça do jornalista, pautado por políticos, empresários, desafetos, concorrentes, candidatos a cargos no governo, com factóides que não duravam 24 horas. Revistas semanais disputavam uma verdadeira gincana para ver quem dava o furo da semana. Resultado, apareciam matérias surrealistas, com erros de apuração e sem qualquer fundamentação. Mas, e daí? A sociedade seria melhor sem essa imprensa, ainda que com imperfeições e interesses? Ninguém acredita.
Malgrado todos esses defeitos, a grande imprensa continua sendo o principal meio de informação da sociedade. É óbvio que o leitor, telespectador, ouvinte quer saber o que acontece no país pela imprensa. É onde se digladiam as diversas forças que compõem a sociedade. E não pelos blogs ou jornais internos. É só fazer uma pesquisa. Em que você acredita mais? Nas informações publicadas pela Petrobras ou nas notícias divulgadas sobre ela na imprensa? A resposta é óbvia. Nenhuma empresa, mesmo na iniciativa privada, por mais transparente que seja, vai esquentar informações para se questionar, levantando mazelas, suspeitas, questionando atos de gestão ou denunciando funcionários. São assuntos internos conduzidos pelas auditorias, sempre em segredo.
Posto isto, o papel da imprensa como ombudsman da sociedade continua intocável e inatacável. Os modos de fazer é que estão mudando. Os grandes furos de reportagem estão acabando, porque qualquer pessoa pode ser um editor de informação. Ninguém quer tirar o poder de edição da imprensa. Foi a força da internet e das redes sociais que tirou. Quem deu a notícia do atentado na Universidade Virgina Tech, nos EUA, em 2007, foram os alunos por meio de torpedos enviados aos pais, amigos e parentes. A mídia só chegou depois. Na Alemanha, em maio, um candidato ficou sabendo do resultado da eleição pelo twitter, antes de ser publicado o resultado oficial.
A imprensa continua ainda a ser o vetor natural de informações sobre o que acontece na sociedade. O problema de um blog em nome da empresa, feito sob o viés do pensamento único e da autoproteção, é que nem sempre ele conta tudo. No caso do Fatos e Dados, até mesmo as centenas de comentários recebidos podem ser uma ameaça à credibilidade. Internautas que enviaram críticas ou sugestões de temas para apuração na CPI se queixam de que os comentários foram expurgados e não apareceram. Se é verdade, aí a coisa se complica. Blog no ar implica riscos, ou seja, receber comentários favoráveis ou desfavoráveis. Desde que não sejam ofensivos, desrespeitosos, devem todos ser postados. Se transparência é um propósito, vale em todos os sentidos. Como diz o professor Carlos Chaparro, "no blog, a empresa se expõe, inclusive em suas fragilidades. Uma delas, a de só dizer o que lhe convém, fazendo propaganda e não jornalismo".
extraído do site Observatório da Imprensa", no endereço http://www.observatoriodaimprensa.com.br/artigos.asp?cod=542JDB001, em 08/10/09
quinta-feira, 8 de outubro de 2009
segunda-feira, 5 de outubro de 2009
Entrevista com Fernando Morais, para o Blog do Zé Dirceu
"No Brasil, não faltam personagens"
A constatação é de Fernando Morais, autor de "A Ilha" e "Olga", entre outros, um dos maiores biógrafos brasileiros que nesta entrevista conta como se dá a produção de seus livros, a escolha dos temas e personagens e também sobre sua incursão no mundo da política.
No Brasil, não faltam personagens
A constatação é de um dos principais biográfos do país, o escritor e jornalista Fernando Morais. Autor de vasta obra iniciada em 1976, quando sob a ditadura militar publicou "A Ilha", um dos maiores sucessos editoriais do país, Fernando também trouxe ao grande público a trajetória de personagens como Olga Benário e Assis Chateubriand, entre outros. Seu último trabalho, "O Mago", sobre a vida do escritor Paulo Coelho ocupa atualmente a lista dos mais vendidos. Agora ele escreve um novo livro, desta vez sobre a saga de cinco patriotas cubanos presos e condenados nos EUANesta entrevista, além de falar sobre seu trabalho como escritor e jornalista - Fernando explica como se dá a escolha de seus personagens e adianta que o método muda segundo o biografado -, conta também sobre sua incursão no mundo da política a partir de 1978, quando elegeu-se para o primeiro de dois mandatos de deputado estadual pelo PMDB.Do semi-anônimato a 5º deputado estadual mais votado do país, Fernando passou por dois mandatos até que em 1986, candidato a Constituinte, foi derrotado - junto a outros parlamentares da esquerda - pelo atual governador [José] Serra. "Ele impediu que pelo menos dez candidatos de esquerda de São Paulo fossem para a Constituinte".Secretário de Cultura durante o governo Quércia em São Paulo e da Educação, na gestão Fleury, Fernando também conta como em 2002, candidato ao governo de São Paulo, pelo PMDB, largou tudo depois que foi avisado que ele (o candidato a governador) e o outro candidato ao Senado pelo partido seriam cortados no horário de propaganda na TV para que só o ex-governador Orestes Quércia aparecesse.
[Zé Dirceu] O que é necessário para ser um biógrafo? Você se considera mais um escritor ou um jornalista?
[Fernando Morais] O meu trabalho de biógrafo não tem absolutamente nenhuma diferença do que eu fazia quando era jornalista no cotidiano. Nenhuma. Quais as vantagens em relação ao trabalho no jornal ou aos tempos da Veja? Primeiro, eu sou o pauteiro, escolho o meu tema; segundo, sou o editor, portanto sai o que quero e não o que o dono quer; terceiro, tenho absoluta liberdade de espaço – posso ir de 100 a 800 páginas - e de tempo, posso entregar um livro para o editor em quatro meses ou em quatro anos. No caso da biografia do Paulo Coelho, por exemplo, foram quatro anos e mais de 400 horas de gravação; 110 entrevistas, além da que fiz com ele. O meu trabalho é um trabalho jornalístico. Considero a qualidade dos meus livros superior ao trabalho que fazia na imprensa porque tenho tempo, reescrevo dez a vinte vezes cada parágrafo. Cada vez que releio um texto na tela do computador, eu melhoro. Agora, todos os meus livros poderiam ser publicados num jornal ou numa revista.“O Brasil é ótimo, falta gente para contar isso”
[Zé Dirceu] E os personagens, Fernando. Como se dá esse processo de escolha e de pesquisa?
[Fernando Morais] Num país com uma histórica riquíssima como a do Brasil, não falta personagem. O Darcy Ribeiro (antropólogo, ex-senador do PDT-RJ) tem uma frase ótima que todos os escritores deveriam colocar na tela dos seus computadores: “o Brasil é ótimo, o que falta é gente para contar isso”. Gosto muito do período que vai da Proclamação da República, passa pela Revolução de 30 e chega até a deposição de Getúlio Vargas em 1945. Você tem personagens fascinantes como Pinheiro Machado, e como o general Setembrino de Carvalho, conhecido como Mata Cachorro, escolhido para reprimir todos os movimentos sociais do Brasil. Gosto de Canudos à Coluna Prestes, passando pela Guerra do Contestado (Santa Catarina). Personagens e fatos não faltam. Se não fosse esse livro que estou escrevendo [a respeito dos cinco patriotas cubanos] faria um sobre a República de Princesa. Veja só, uma cidade no sertão da Paraíba, na fronteira com o Rio Grande do Norte, decretou sua independência em fevereiro de 1930. Fez Constituição, hino e dinheiro próprios. A República de Princesa durou oito meses porque veio a Revolução de 30 e passou por cima da cabeça deles. Imagine se não fosse a Revolução de 30! Eram dois mil jagunços armados liderados pelo Zé Pereira - que deu até a música de carnaval: “viva o Zé Pereira, viva o Zé Pereira que a ninguém faz mal...”. Depois ele foi homenageado pelo Luiz Gonzaga num xote. Na realidade, eu estava pesquisando esse tema quando surgiu a oportunidade de escrever sobre os cubanos. Portanto, a escolha de um personagem não é um negócio tão difícil no Brasil. Nos Estados Unidos talvez seja. Você entra numa livraria, na parte de biografias, só da Jacqueline Onassis tem 23 biografias diferentes. Imagine do marido, do Kennedy, que foi presidente, deve ter umas 200. Num país como os EUA deve ser difícil a escolha dos personagens, mas num país como o nosso, eles estão todos por aí.
[Zé Dirceu] E quanto a apuração das fontes, as entrevistas, o seu trabalho de pesquisa?
[Fernando Morais] A apuração varia muito, principalmente se o biografado está vivo ou não. O Paulo foi a primeira experiência de escrever sobre uma pessoa viva, o que não é bom desse ponto de vista. O livro está vendendo no mundo inteiro, 1º lugar na Hungria, na República Tcheca, nos EUA. Passei nas livrarias do aeroporto de Miami e “O Mago” estava lá. Mas é muito difícil você fazer a biografia de um sujeito vivo exatamente pelo fato de que ele está vivo. Como dizia o Prestes aos 90 anos, quando eu tentava biografá-lo: “ainda posso errar muito nessa vida”.O método, primeiro, é pegar as testemunhas mais velhas, porque cada dia que passa morre um. Para escrever “Olga”, eu fui para a Alemanha Oriental pegar o pessoal comunista que tinha sido companheiro dela e todos tinham mais de 90 anos. Então, você entrevista os personagens mais velhos, e vai atrás de fontes documentais onde tiver - museus, arquivos, cartórios etc. Aí, com todo esse material em mãos, começa a escrever. E vale a máxima: Washington Luis dizia que governar é abrir estrada; já Machado de Assis dizia que escrever é cortar palavra. Eu estou mais para o Machado de Assis.O curioso é que dessa vez, com o livro sobre os cubanos, depois de 30 anos como autor, estou fazendo uma nova experiência: pesquisando e escrevendo ao mesmo tempo. Passei três semanas em Havana, e três em Miami, nesta, no meio da extrema direita. Voltei e já estou escrevendo. Tenho mais duas viagens para fazer, uma para Miami, outra para Havana e vou visitar duas prisões de segurança máxima nos EUA (onde estão presos os cubanos).
Muda a personagem, muda a metodologia
[Zé Dirceu] Você tem contato com todos os cubanos presos?
[Fernando Morais] Já conversei com três (dos cinco) deles por telefone e estou entrevistando um pela internet. Tenho falado muito com eles. O Gerardo Hernández, inclusive, condenado a duas prisões perpétuas, na primeira vez que conversei por telefone, falei: “E aí doutor? Estou te esperando com um mojito no Malecon (Havana)”. E ele respondeu: “me espera no Rio de Janeiro com uma caipirinha”. O cara com duas perpétuas... Então estou agora, pela primeira vez, tendo essa experiência de escrever e pesquisar ao mesmo tempo. Isso significa que terei que mexer mais ainda nas coisas já escritas, porque sempre entra informação nova, fulana diz “aquela tarde, não foi aquele dia, mas três meses depois”. Isso desmonta tudo o que você fez. Na realidade, não tenho uma metodologia de trabalho, nem poderia dar uma aula aqui de como fazer, mesmo porque o processo muda de personagem para personagem. Vou fazer uma biografia sua, por exemplo... É completamente diferente de fazer a biografia do Paulo Coelho ou do marechal Montenegro [Casimiro Montenegro Filho]. Muda a personagem, muda a metodologia.
[Zé Dirceu] Qual a diferença no trabalho entre retratar um país, como você faz em seu livro “A Ilha” (Cuba), ou uma pessoa...
[Fernando Morais] O livro "A Ilha" [publicado em 1976] mudou a minha vida. Não era para ser um livro, mas uma série de reportagens publicadas na (extinta) revista Visão. O dono (Henry Macksoud) não concordou e em seguida mandou o diretor que era o Roberto Muylaert me demitir. Um cara com enorme capacidade. Eu saí, levei a reportagem comigo e aí, matam o Vlado [Vladimir Herzog], com quem eu trabalhava na Visão. Eu havia trabalhado com ele na TV Cultura, em 1970, ele era chefe de reportagem à tarde e eu de manhã. Quando fui para a Visão, ele era o editor de cultura e fui ser repórter primeiro de política, depois de cultura.O Vlado quando voltou para a TV Cultura (quando foi assassinado no DOI-CODI) indicou-me para o lugar dele, para ser editor de cultura da Visão. Com sua morte, percebi que não poderia publicar minha reportagem (sobre a Ilha), mas aí, havia outro problema. Os órgãos de segurança sabiam que eu tinha ido à Cuba, mas não sabiam o que eu tinha feito por lá. Imaginavam que minha viagem era para ter contato com vocês (que estavam exilados em Havana) – para levar e trazer coisas. Então, em minha própria defesa, precisei publicar o livro, mesmo sob a ditadura. E o Vlado tinha sido morto. Enchemos três kombis, levamos o livro ao sindicato e os 3 mil exemplares venderam na noite do lançamento. A Ilha ficou 150 semanas em 1º lugar na lista dos mais vendidos e, principalmente, me mostrou um caminho novo. Eu poderia continuar sendo jornalista, mas sem ter que dar satisfação para patrão, nem gramando em redação. E também ganhando melhor.“Em 78, fui o 5º mais votado”Foi quando comecei a pensar em Olga. O meu nome que antes era pouco conhecido, mais só entre os jornalistas, passou a ser conhecido pela sociedade, sobretudo pelo pessoal da esquerda. Isso levou o MDB a me chamar para sair candidato do partido a deputado estadual em 1978. Eu, que não era ninguém, fui o 5º mais votado, atrás do [Eduardo] Suplicy, do [Antônio] Rezk, de uma mulher que cantava música sertaneja, a deputada Nodeci Nogueira e do deputado Manoel Sala. Quatro anos depois, fui reeleito numa votação maior ainda; e depois em 1986, candidato a deputado federal, fui derrotado pelo [José] Serra. Aliás, eu sou da turma que o Serra passou o caminhão em cima. Ele foi nas cidades onde tinha deputado eleito por voto de esquerda e arrebentou conosco: comigo, com João Hermann Neto, Audálio Dantas, Darcy Passos Flávio Bierrenbach - o Flávio que denunciou isso na televisão. O Serra impediu que pelo menos dez candidatos de esquerda de São Paulo fossem para a Constituinte e dessem a sua contribuição. Eu (em 1986) não tive nem 20 mil votos, quando na eleição anterior cheguei quase nos 60 mil.
[Zé Dirceu] E você escreveu Olga durante esse período?
[Fernando Morais] Sim, foi aí que terminei Olga e comecei a trabalhar no “Chatô, o rei do Brasil”. Então, o Quércia me chamou para ser Secretário de Cultura e depois Secretário de Educação de São Paulo.
[Zé Dirceu] Como foi sua experiência na gestão dessas duas pastas?
[Fernando Morais] Na Secretaria de Cultura foi ótimo, deu para fazer muita coisa. O Quércia, com quem não tenho mais relações, é um governante que não tem meio termo. Para ele é sim ou não, o que é muito bom. Geralmente você pede recursos e o cara responde “não tem dinheiro nem pra bala da polícia militar”. Com ele não tinha disso. Por exemplo, em 1989 o presidente [Fernando] Collor tinha arrebentado com o cinema nacional, acabou com a EMBRAFILME, com tudo. São Paulo foi o único Estado capaz de levantar o cinema de nacional financiando dez longas. Na época, ele me deu R$ 20 milhões para lançar dez filmes e dar esse respiro no cinema nacional. No Memorial da América Latina (construído por Fernando no governo Quércia) fiz quase vinte oficinas culturais para ensinar música, teatro, cinema para a criançada de baixa renda. E quem ensinava eram os maiores artistas brasileiros. Eu levava Gianfrancesco Guarnieri para dar aula de interpretação para os moleques de periferia de Ribeirão Preto; Mário Prata para dar aula de roteiro. Era uma forma, ao mesmo tempo, de dar trabalho para os artistas. Você pagava a eles, mas era de graça para as crianças.Nesse período, eu consegui trazer até o Tom Jobim de Nova York para criar a Universidade Livre de Música. Hoje, chama-se Instituto Tom Jobim. O Tom passou um ano aqui ensinando para nós como se montava um conservatório musical gigantesco. Outro dia, ouvi um moleque tocando oboé na Sinfônica de Israel. Ele era morador de favela aqui e começou numa dessas oficinas culturais. Então, na área de cultura, minha avaliação é que foi muito bom. [Zé Dirceu] E na secretaria de Educação?[Fernando Morais] Na educação foi um desastre. No meio do caminho eu descobri que o governador [Luiz Antônio] Fleury Filho não queria fazer nenhuma revolução nesse setor, e eu não estava ali para ser chamado de excelência e andar em carro oficial. Pedi demissão e desisti. 2002: o apoio de Quércia a Lula
[Zé Dirceu] Você voltou a se candidatar pelo PMDB em 2002, a governador.
[Fernando Morais] Caí em tentação novamente em 2002. O Quércia me chamou para ser candidato a governador de São Paulo. Respondi que só saia se o partido apoiasse o Lula, naquele ano, candidato à presidência. Na época, o deputado Michel Temer (presidente nacional do PMDB) era da outra direção do partido, e estava comprometido com o (candidato à presidência) Serra, tanto que indicaram a deputada Rita Camata (PMDB-ES) como vice de sua candidatura. Consegui com o Quércia, o PMDB de São Paulo, apoiar o Lula. Tanto que no dia do lançamento do meu comitê de governador estão lá você e o Lula quebrando a garrafa de champanhe no palanque.Durante essa campanha para governador, a minha expectativa era o tempo de televisão. Eu tinha 5 minutos na hora do almoço e do jantar, uma eternidade. Como minha vida é transparente e não tenho dificuldade em falar em público, a televisão era o caminho. Eu estava com 3% a 4%, lá embaixo. Quem eram os meus adversários? Geraldo Alckmin (PSDB) e o José Genoíno (PT). Pensei: “aí, eu pego os dois”. Participei de um único debate, dei uma cacetada no Alckmin - isso me valeu um processo por injúria, calúnia e difamação, que ele perdeu em todas as instâncias - e ali meu nome começou a amadurecer por causa do bate-boca que tivemos.Então, quando faltavam cinco dias para o programa eleitoral começar (e finalmente o meu tempo de televisão), o Quércia mandou me avisar através do marqueteiro dele, o Toni Cotrim, que o horário seria dele. Ele era candidato a senador, tinha vaga para dois senadores, mas já usava o tempo do outro candidato, um laranja do ABC, deputado estadual, que topou se candidatar para dar o tempo do Quércia. Eu falei, “de maneira nenhuma, isso nem passa pela minha cabeça”. Primeiro, pela ilegalidade, segundo pela imoralidade comigo. Como vou dizer para a minha filha e para a minha mulher que sou candidato se não apareço? “Não, mas isso e aquilo...” Então, respondi: “não, estou fora”.No dia seguinte, puseram um pastor evangélico no meu lugar para dar o tempo ao Quércia - e mesmo assim, ele perdeu a eleição, apesar de ter na TV o tempo de dois senadores e de um governador. Eu retirei a candidatura num dia e no seguinte estava na campanha do Lula, no Rio de Janeiro, quando sugeri uma frase que acabou virando mote na campanha. A Regina Duarte tinha ido à TV (na propaganda tucana) falar que estava com medo. Nas vésperas de ir ao Rio, descobri um poema do Gilberto Freyre escrito em 1929 - nem sabia que ele escrevia poemas - muito bonito chamado “Um novo Brasil” que me parece uma premonição da Revolução de 30. Esse texto caiu como uma luva na candidatura do Lula e foi uma resposta indireta à Regina Duarte. Ao invés de discursar, eu disse no encontro do Rio que daria a palavra ao Gilberto Freyre e li o poema. Terminei dizendo o seguinte: “60 anos atrás o Gilberto Freyre já estava ensinando para nós que a esperança era maior do que o medo”. Fui para a campanha do PT e fiquei por lá. Nunca mais me meti pessoalmente em política. De lá pra cá, fiz todas as campanhas do PT. Em São Paulo, a campanha do Genoino; depois a da Marta (Suplicy) para a prefeitura; vou campanha da Dilma ano que vem, mas, pessoalmente, eu não quero mais.ABC: “é melhor você ficar porque parece que a barra vai pesar”.
[Zé Dirceu] E como foi sua experiência de oito anos como deputado estadual, você cumpriu mandato em duas legislaturas.
[Fernando Morais] O primeiro mandato foi de luta contra a ditadura. Do meu tempo como deputado, devo ter passado 80% nas portas do DOPS, nas greves do ABC. Inclusive, eu estava com o Lula e o (ex-deputado) Geraldinho Siqueira, na noite em que o Exército invadiu o sindicato dos metalúrgicos. Naquele dia, o Fernando Henrique Cardoso tinha estado lá, nós conversamos e saímos para comer um frango em São Bernardo. Na hora de ir embora, o Fernando falou: “eu vou para São Paulo.” Nós respondemos: “é melhor você ficar porque parece que a barra vai pesar”. Na época, o Fernando era suplente de senador (de Franco Montoro), portanto, uma personalidade e tal. Ele fez uma análise da conjuntura ali, provando por A+B que não corríamos riscos de o sindicato ser invadido, e foi embora para São Paulo. Isso quem conta é o Lula naquele livro O Sapo e o Príncipe [do Paulo Markun]. Então, o Fernando Henrique veio embora para São Paulo e nós ficamos. Quando deu 23h, meia noite por aí, nós ouvíamos o barulho dos helicópteros. Olhamos pela janela, estava tudo cercado (pela repressão) em volta do sindicato.Então, esse primeiro mandato foi muito rico, muito vivo. Eu levava comida no DOPS para eles, quando foram presos - Djalma Bom, Lula, José Cicotti. Levávamos fruta, eu e Luis Eduardo Greenhalgh que não era deputado ainda. Na verdade, eu tinha uma relação respeitosa com o (delegado Romeu) Tuma, embora ele tivesse me prendido – eu e minha mulher – quando voltamos de Cuba pela primeira vez. Nós fomos presos na escada do avião, mas não bateram na gente, nem fomos colocados na cela. Ficamos numa cela ao lado da sala do Tuma no prédio do DOPS. Então, eu conseguia levar comida para o pessoal desde que não fosse de dia para não chamar atenção da imprensa e desde que não fosse com carro oficial (de deputado). Já no segundo mandato, com o Montoro governador, o deputado virou uma espécie de despachante de luxo. O prefeito tem 4 mil votos, precisa ter uma audiência com o secretário de Educação, você não vai acompanhar? Agora, como eu tinha voto em todas as cidades, sem exceção, era deputado estadual, havia uma lista de prefeitos... Então, leva o prefeito e vai no secretário tal, depois em outro. Não que isso diminua alguém, mas não era o meu projeto de vida, nem com cem mil votos. Então, foi uma experiência muito frustrante o meu segundo mandato.
[Zé Dirceu] Fernando, dos teus biografados, é possível comparar e escolher qual foi o mais fascinante?
[Fernando Morais] Impossível. Como comparar Olga com Chateaubriand? Como comparar o Paulo Coelho com o marechal Montenegro? Quer história mais dramática do que a do Paulo? Drogas, vício, homossexualismo, missa negra, suicídio, tudo. Hospício! Moleque, o pai o internou - ele tinha 14, 15 anos - três vezes no hospício para ser tratado com eletrochoque na cabeça. Agora, você pega uma Olga, uma mulher que deu a vida por uma idéia! Ela não estava atrás de bem material, nada. Deu a vida por um ideal. Então, é muito difícil estabelecer esse tipo de comparação.
[Zé Dirceu] E há algum personagem interessante, mas sobre o qual você jamais escreveria? Você precisa se identificar com os biografados que escolhe?[Fernando Morais] Não, diferentemente de outros biógrafos. O Ruy Castro, por exemplo, disse que só escreve sobre pessoas pelas quais ele tem algum tipo de simpatia, alguma afinidade. Eu já pensei, inclusive, em escrever sobre o delegado (Sérgio Paranhos) Fleury. Vou escrever sobre o Antônio Carlos Magalhães. Passei nove anos gravando com ele. Devo ter quase mil horas gravadas e ele me deu uma cópia do seu arquivo pessoal. Seguramente, Zé, tem o seu nome lá, porque ele gravava todos os telefonemas. Ligava para o presidente da República com o gravador ligado e não informava o interlocutor que estava gravando. Particularmente, eu não tenho afinidade com o ACM, estamos em pólos opostos política e filosoficamente. Então, honestamente não há personagem sobre o qual eu não escreveria.
[Zé Dirceu] E sobre o restaurante Piantella, de Brasília?
[Fernando Morais] Há algum tempo, estou pensando em fazer a história do Piantella porque é possível fazer esse trabalho de biografia num livro que não seja biográfico, mas sobre um episódio. Escrevi Corações Sujos [2000] que não é uma biografia. Cem quilos de Ouro [2003] e a própria A Ilha [1976] também não são. Se dependesse de mim, já teria feito o Piantella, mas o Marco Aurélio (dono do restaurante) me enrolou um pouco. Na verdade, através da história do Piantella você conta um pouco da história do país, sobretudo, a do fim da ditadura militar. Ali era o lugar onde se conspirava. Eu pretendo fazer o livro sobre o Piantella, tenho até o modelo. O (jornalista) Ricardo Boechat fez um livro muito bonito sobre o Copacabana Palace, é um livro com fotos que ao mesmo tempo você lê, tem história sobre as pessoas que se hospedaram lá, o que aconteceu, brigas e paixões. O Piantella dava um livro, guardadas as diferenças, como este.Cinco cubanos e a luta contra o terrorismo de Miami
[Zé Dirceu] Conte um pouco para os leitores do blog, sobre seu livro atual, a respeito dos cubanos.
[Fernando Morais] O livro está indo bem. É uma história incrível porque são 15 caras que Cuba infiltra em organizações de extrema direita na Flórida, para combater o terrorismo partido dali contra a Ilha. Eles se apresentam nos EUA como desertores, traidores da revolução cubana e cada um foi de uma maneira.René González, por exemplo, roubou um avião em Cuba e pousou dentro da base aérea naval mais bem armada dos EUA. E, pior, com o tanque seco. Foi um negócio heróico. Ele teve que voar baixo para os radares de Cuba não o pegarem e ainda em zigue-zague porque a gasolina acabou. No momento em que viu as luzinhas de Key West, nos EUA, o tanque já estava seco, seco, seco. Ele entrou no rádio 14 da Marinha, da base aéreo naval e disse “sou desertor cubano, chamo-me René González e preciso pousar”. O cara respondeu, “na pista tal”. Ele desceu, foi recebido como herói e começou a trabalhar. Lá foi cooptado por uma organização de extrema direita [contra os cubanos] e logo depois, cooptado pelo FBI para passar informações desta organização de extrema direita para eles. Então, ele começa a fazer o jogo de dupla infiltração. Como ele, foram mais 14 cubanos e um não sabia do outro, apenas um que controlava todos sabia dos demais. Cada um foi de uma forma, quase todos como traidores da revolução, e houve os que saíram dentro da cota dos 20 mil vistos concedidos por ano. Os cubanos chegaram nos EUA no começo dos anos 90, quando acabou a URSS, e Cuba entrou no chamado período especial de dificuldades muitos grandes.Nessa fase, o país salvou sua economia através do turismo. Vendo isso, os americanos começaram a fazer atentados em Cuba, exatamente na área turística. Colocaram bomba em avião, em hotel de luxo para espantar os turistas. Você vai para o Iêmen passar férias? Não vai, tem medo. O Egito durante muito tempo passou por isso. Então, os americanos queriam quebrar a indústria do turismo de Cuba com o terrorismo, e Cuba não tinha como combater esses caras, porque eles moravam nos EUA, na Flórida e a polícia e o governo ou os apoiava ou fechava os olhos. Por isso, mandaram 15 caras para lá. O primeiro foi em 1990 e até 1998, foram oito anos de trabalho, [infiltrados em organizações de extrema direita]. Eles mandavam informações para Cuba. Por exemplo, “fulano de tal vai entrar dia tal vindo de El Salvador com uma televisão portátil debaixo do braço dizendo que está levando de presente para uma tia”. Os cubanos abriam a televisão e achavam 4 kg de explosivo lá dentro, de centex, de explosivo líquido e plástico. Até que na madrugada de setembro de 1998, o FBI e a Swat invadiram 15 casas na mesma hora, numa operação na Flórida. Cinco fugiram antes deles chegarem, um na véspera da cana... ficaram dez. Desses, 5 fizeram acordo de delação premiada com o governo americano. Neste período já tinham informações e dedaram os outros cinco em troca de serem libertados com identidade falsa e com bolsa do governo. Até hoje, eles estão nos Estados Unidos em lugares diferentes, com nomes diferentes. Os cinco presos [Gerardo Hernández, Ramon Labañino, Antonio Guerrero, Fernando e René González] foram condenados a penas de 20 anos e a duas perpétuas. Essa é a história.
[Zé Dirceu] Então, o FBI estava vigiando a atividade deles antes?
[Fernando Morais] Eles estavam vigiando os caras há dois anos. Já tinha escutas dentro das casas. Um morava num apartamento e o FBI alugou outro apartamento exatamente na frente para fotografar e ver a hora em que saia. Eles iam lá, abriam, tiravam o disco rígido do computador, copiavam e o recolocavam. Pegaram mais de 20 mil mensagens enviadas pelos cubanos, e o julgamento foi um negócio absurdo. Não há nenhuma prova, no meio dessa documentação toda, de que eles tenham espionado os EUA [o objetivo era obter informações das organizações de extrema direita que faziam terrorismo em Cuba]. Nunca pegaram nenhum documento norte-americano, nunca tiveram acesso a nenhuma informação sigilosa ou secreta, e quem diz isso foram três almirantes e um general americano ligados à Agência Nacional de Segurança. Depoimento do júri, homologado pelos advogados com testemunha de defesa dos cinco, e tudo. Um camarada, inclusive, tinha o emprego de encanador numa base aérea americana, e o general que comandava essa base disse que ele nunca chegou por perto dos prédios que tinham informações que pudessem ser consideradas de segurança nacional. Outro cara tinha sido comandante de uma coluna de tanques em Angola e entrou nos EUA para ser professor de salsa.
Educação: o nó está no ensino de primeiro e segundo graus
[Zé Dirceu] Fernando, mudando de assunto, como você avalia a educação e a cultura nesses quase sete anos de governo Lula?
[Fernando Morais] Cultura deu um salto significativo. Educação, a minha esperança é que o Lula realmente use o dinheiro do pré-sal para fazer uma revolução nessa área. Não só como autor de livros, mas sobretudo tendo sido secretário do Estado com maior número de estudantes no Brasil – em São Paulo são seis milhões de estudantes e hoje deve ser um pouco menos, é a população da Dinamarca, e na época, o orçamento da Educação no Estado era de US$ 4bi - aprendi um pouco e descobrir onde está o nó.Em primeiro lugar, não é ensino superior, mas o de primeiro e segundo graus. E, principalmente, só conserta na hora em que você tiver educação em tempo integral. O projeto do (ex-governador do Rio, Leonel) Brizola era verdade – e não era do Brizola, mas do Anísio Teixeira (educador dos anos 50). Não tem nenhum segredo. Se você pegar todos os países que deram certo no mundo...O caso do Japão, destruído no final da II Guerra e agora, segunda maior potência do mundo... Eles não tem nada de especial em relação a nós, mas num dado período gastaram 70% do orçamento em educação. Não tinham dinheiro para gasolina de viatura policial, mas tinham para educação de melhor qualidade. A minha esperança é essa. O Lula vai pro céu se fizer isso. Pode cometer todos os pecados, mas se de fato fizer o que está prometendo, de usar os recursos do pré-sal para fazer uma revolução na Educação, daqui a 500 anos quando os nossos tataranetos olharem para o Brasil e tiverem que citar um estadista, dirão que é o Lula. Mais do que o Getúlio Vargas, porque Vargas tem uma mancha na história dele: (a ditadura e) a própria Olga é um exemplo disso.E Getúlio foi três: o revolucionário de 30, que deu ao Brasil a condição de nação - antes o país era uma república de coronéis e barões do café; o Getúlio ditador que reprimiu tanto a esquerda - Olga é um exemplo disso - quanto a direita, como fez com os integralistas, arrancaram por exemplo unha do tenente Fournier; e o terceiro Getúlio, o nacionalista, o antiimperialista, o da Petrobras.Foi o da Petrobras que o DEM da época (1950-1954), a UDN, tentou derrubar e que termina com o gesto heróico de dar um tiro no coração. Então, com absoluta certeza, se o Lula encerrar o seu mandato consertando a educação brasileira, vai precisar muito milênio para termos um outro estadista como ele.Hoje, todo mundo pode ser o seu próprio Roberto Marinho.
[Zé Dirceu] Fernando para fechar, como você vê o jornalismo hoje no país e a mídia como um todo?
[Fernando Morais] Um horror, uma verdadeira tragédia. Toda generalização é injusta - se você me pedir para apontar um ou outro que não esteja nesse meio, eu consigo. Agora, no geral, a imprensa e os veículos se transformaram em partidos políticos de direita, sem assumir isso. Porque se assumisse não tinha problema. Você cria uma referência. Essa é uma revista de esquerda, esse é o é o blog do Paulo Henrique Amorim que não gosta do Fernando Henrique Cardoso. Pronto, você já avisa ao leitor o que ele está lendo. Se você pega uma revista como a Veja, por exemplo, ela tem todo o direito de fazer o que bem entender. Numa sociedade como a nossa, quem tem dinheiro para montar uma revista, pode fazer o que quiser, inclusive, não tem que ter nenhuma preocupação com a ética. Agora, esclareça o leitor que aquilo ali é um partido político, que você está defendendo interesses. Isso realmente não acontece.Veja que isso não é de hoje. Se você pegar o Estadão de quando o Juscelino (Kubitschek) deixou a presidência da República, vai ver que o jornal dizia que o presidente era a quinta maior fortuna do mundo. Juscelino morreu e dona. Sara teve que vender casa para pagar despesas familiares. “A quinta maior fortuna do mundo” segundo o Estadão. Isso piorou de lá prá cá, mas para a nossa sorte, acabou. Eu sempre acreditei que até a democratização dos meios de comunicação seria uma luta política. Acabei descobrindo que se tornou uma conquista tecnológica. Hoje, todo mundo pode ser o seu próprio Roberto Marinho. Se você botar um notebook aqui na frente e ligar uma câmera de vídeo - custa baratinho - e falar o dia inteiro, se disser o que as pessoas querem ouvir, terá audiência, ganhará anúncio e terá recursos para sustentar e ampliar a sua estrutura.Felizmente, essas publicações (tradicionais) estão com os dias contados.
extraído do Blog do Zé Dirceu, endereço http://www.zedirceu.com.br/ (com autorização prévia) em 05/10/09
A constatação é de Fernando Morais, autor de "A Ilha" e "Olga", entre outros, um dos maiores biógrafos brasileiros que nesta entrevista conta como se dá a produção de seus livros, a escolha dos temas e personagens e também sobre sua incursão no mundo da política.
No Brasil, não faltam personagens
A constatação é de um dos principais biográfos do país, o escritor e jornalista Fernando Morais. Autor de vasta obra iniciada em 1976, quando sob a ditadura militar publicou "A Ilha", um dos maiores sucessos editoriais do país, Fernando também trouxe ao grande público a trajetória de personagens como Olga Benário e Assis Chateubriand, entre outros. Seu último trabalho, "O Mago", sobre a vida do escritor Paulo Coelho ocupa atualmente a lista dos mais vendidos. Agora ele escreve um novo livro, desta vez sobre a saga de cinco patriotas cubanos presos e condenados nos EUANesta entrevista, além de falar sobre seu trabalho como escritor e jornalista - Fernando explica como se dá a escolha de seus personagens e adianta que o método muda segundo o biografado -, conta também sobre sua incursão no mundo da política a partir de 1978, quando elegeu-se para o primeiro de dois mandatos de deputado estadual pelo PMDB.Do semi-anônimato a 5º deputado estadual mais votado do país, Fernando passou por dois mandatos até que em 1986, candidato a Constituinte, foi derrotado - junto a outros parlamentares da esquerda - pelo atual governador [José] Serra. "Ele impediu que pelo menos dez candidatos de esquerda de São Paulo fossem para a Constituinte".Secretário de Cultura durante o governo Quércia em São Paulo e da Educação, na gestão Fleury, Fernando também conta como em 2002, candidato ao governo de São Paulo, pelo PMDB, largou tudo depois que foi avisado que ele (o candidato a governador) e o outro candidato ao Senado pelo partido seriam cortados no horário de propaganda na TV para que só o ex-governador Orestes Quércia aparecesse.
[Zé Dirceu] O que é necessário para ser um biógrafo? Você se considera mais um escritor ou um jornalista?
[Fernando Morais] O meu trabalho de biógrafo não tem absolutamente nenhuma diferença do que eu fazia quando era jornalista no cotidiano. Nenhuma. Quais as vantagens em relação ao trabalho no jornal ou aos tempos da Veja? Primeiro, eu sou o pauteiro, escolho o meu tema; segundo, sou o editor, portanto sai o que quero e não o que o dono quer; terceiro, tenho absoluta liberdade de espaço – posso ir de 100 a 800 páginas - e de tempo, posso entregar um livro para o editor em quatro meses ou em quatro anos. No caso da biografia do Paulo Coelho, por exemplo, foram quatro anos e mais de 400 horas de gravação; 110 entrevistas, além da que fiz com ele. O meu trabalho é um trabalho jornalístico. Considero a qualidade dos meus livros superior ao trabalho que fazia na imprensa porque tenho tempo, reescrevo dez a vinte vezes cada parágrafo. Cada vez que releio um texto na tela do computador, eu melhoro. Agora, todos os meus livros poderiam ser publicados num jornal ou numa revista.“O Brasil é ótimo, falta gente para contar isso”
[Zé Dirceu] E os personagens, Fernando. Como se dá esse processo de escolha e de pesquisa?
[Fernando Morais] Num país com uma histórica riquíssima como a do Brasil, não falta personagem. O Darcy Ribeiro (antropólogo, ex-senador do PDT-RJ) tem uma frase ótima que todos os escritores deveriam colocar na tela dos seus computadores: “o Brasil é ótimo, o que falta é gente para contar isso”. Gosto muito do período que vai da Proclamação da República, passa pela Revolução de 30 e chega até a deposição de Getúlio Vargas em 1945. Você tem personagens fascinantes como Pinheiro Machado, e como o general Setembrino de Carvalho, conhecido como Mata Cachorro, escolhido para reprimir todos os movimentos sociais do Brasil. Gosto de Canudos à Coluna Prestes, passando pela Guerra do Contestado (Santa Catarina). Personagens e fatos não faltam. Se não fosse esse livro que estou escrevendo [a respeito dos cinco patriotas cubanos] faria um sobre a República de Princesa. Veja só, uma cidade no sertão da Paraíba, na fronteira com o Rio Grande do Norte, decretou sua independência em fevereiro de 1930. Fez Constituição, hino e dinheiro próprios. A República de Princesa durou oito meses porque veio a Revolução de 30 e passou por cima da cabeça deles. Imagine se não fosse a Revolução de 30! Eram dois mil jagunços armados liderados pelo Zé Pereira - que deu até a música de carnaval: “viva o Zé Pereira, viva o Zé Pereira que a ninguém faz mal...”. Depois ele foi homenageado pelo Luiz Gonzaga num xote. Na realidade, eu estava pesquisando esse tema quando surgiu a oportunidade de escrever sobre os cubanos. Portanto, a escolha de um personagem não é um negócio tão difícil no Brasil. Nos Estados Unidos talvez seja. Você entra numa livraria, na parte de biografias, só da Jacqueline Onassis tem 23 biografias diferentes. Imagine do marido, do Kennedy, que foi presidente, deve ter umas 200. Num país como os EUA deve ser difícil a escolha dos personagens, mas num país como o nosso, eles estão todos por aí.
[Zé Dirceu] E quanto a apuração das fontes, as entrevistas, o seu trabalho de pesquisa?
[Fernando Morais] A apuração varia muito, principalmente se o biografado está vivo ou não. O Paulo foi a primeira experiência de escrever sobre uma pessoa viva, o que não é bom desse ponto de vista. O livro está vendendo no mundo inteiro, 1º lugar na Hungria, na República Tcheca, nos EUA. Passei nas livrarias do aeroporto de Miami e “O Mago” estava lá. Mas é muito difícil você fazer a biografia de um sujeito vivo exatamente pelo fato de que ele está vivo. Como dizia o Prestes aos 90 anos, quando eu tentava biografá-lo: “ainda posso errar muito nessa vida”.O método, primeiro, é pegar as testemunhas mais velhas, porque cada dia que passa morre um. Para escrever “Olga”, eu fui para a Alemanha Oriental pegar o pessoal comunista que tinha sido companheiro dela e todos tinham mais de 90 anos. Então, você entrevista os personagens mais velhos, e vai atrás de fontes documentais onde tiver - museus, arquivos, cartórios etc. Aí, com todo esse material em mãos, começa a escrever. E vale a máxima: Washington Luis dizia que governar é abrir estrada; já Machado de Assis dizia que escrever é cortar palavra. Eu estou mais para o Machado de Assis.O curioso é que dessa vez, com o livro sobre os cubanos, depois de 30 anos como autor, estou fazendo uma nova experiência: pesquisando e escrevendo ao mesmo tempo. Passei três semanas em Havana, e três em Miami, nesta, no meio da extrema direita. Voltei e já estou escrevendo. Tenho mais duas viagens para fazer, uma para Miami, outra para Havana e vou visitar duas prisões de segurança máxima nos EUA (onde estão presos os cubanos).
Muda a personagem, muda a metodologia
[Zé Dirceu] Você tem contato com todos os cubanos presos?
[Fernando Morais] Já conversei com três (dos cinco) deles por telefone e estou entrevistando um pela internet. Tenho falado muito com eles. O Gerardo Hernández, inclusive, condenado a duas prisões perpétuas, na primeira vez que conversei por telefone, falei: “E aí doutor? Estou te esperando com um mojito no Malecon (Havana)”. E ele respondeu: “me espera no Rio de Janeiro com uma caipirinha”. O cara com duas perpétuas... Então estou agora, pela primeira vez, tendo essa experiência de escrever e pesquisar ao mesmo tempo. Isso significa que terei que mexer mais ainda nas coisas já escritas, porque sempre entra informação nova, fulana diz “aquela tarde, não foi aquele dia, mas três meses depois”. Isso desmonta tudo o que você fez. Na realidade, não tenho uma metodologia de trabalho, nem poderia dar uma aula aqui de como fazer, mesmo porque o processo muda de personagem para personagem. Vou fazer uma biografia sua, por exemplo... É completamente diferente de fazer a biografia do Paulo Coelho ou do marechal Montenegro [Casimiro Montenegro Filho]. Muda a personagem, muda a metodologia.
[Zé Dirceu] Qual a diferença no trabalho entre retratar um país, como você faz em seu livro “A Ilha” (Cuba), ou uma pessoa...
[Fernando Morais] O livro "A Ilha" [publicado em 1976] mudou a minha vida. Não era para ser um livro, mas uma série de reportagens publicadas na (extinta) revista Visão. O dono (Henry Macksoud) não concordou e em seguida mandou o diretor que era o Roberto Muylaert me demitir. Um cara com enorme capacidade. Eu saí, levei a reportagem comigo e aí, matam o Vlado [Vladimir Herzog], com quem eu trabalhava na Visão. Eu havia trabalhado com ele na TV Cultura, em 1970, ele era chefe de reportagem à tarde e eu de manhã. Quando fui para a Visão, ele era o editor de cultura e fui ser repórter primeiro de política, depois de cultura.O Vlado quando voltou para a TV Cultura (quando foi assassinado no DOI-CODI) indicou-me para o lugar dele, para ser editor de cultura da Visão. Com sua morte, percebi que não poderia publicar minha reportagem (sobre a Ilha), mas aí, havia outro problema. Os órgãos de segurança sabiam que eu tinha ido à Cuba, mas não sabiam o que eu tinha feito por lá. Imaginavam que minha viagem era para ter contato com vocês (que estavam exilados em Havana) – para levar e trazer coisas. Então, em minha própria defesa, precisei publicar o livro, mesmo sob a ditadura. E o Vlado tinha sido morto. Enchemos três kombis, levamos o livro ao sindicato e os 3 mil exemplares venderam na noite do lançamento. A Ilha ficou 150 semanas em 1º lugar na lista dos mais vendidos e, principalmente, me mostrou um caminho novo. Eu poderia continuar sendo jornalista, mas sem ter que dar satisfação para patrão, nem gramando em redação. E também ganhando melhor.“Em 78, fui o 5º mais votado”Foi quando comecei a pensar em Olga. O meu nome que antes era pouco conhecido, mais só entre os jornalistas, passou a ser conhecido pela sociedade, sobretudo pelo pessoal da esquerda. Isso levou o MDB a me chamar para sair candidato do partido a deputado estadual em 1978. Eu, que não era ninguém, fui o 5º mais votado, atrás do [Eduardo] Suplicy, do [Antônio] Rezk, de uma mulher que cantava música sertaneja, a deputada Nodeci Nogueira e do deputado Manoel Sala. Quatro anos depois, fui reeleito numa votação maior ainda; e depois em 1986, candidato a deputado federal, fui derrotado pelo [José] Serra. Aliás, eu sou da turma que o Serra passou o caminhão em cima. Ele foi nas cidades onde tinha deputado eleito por voto de esquerda e arrebentou conosco: comigo, com João Hermann Neto, Audálio Dantas, Darcy Passos Flávio Bierrenbach - o Flávio que denunciou isso na televisão. O Serra impediu que pelo menos dez candidatos de esquerda de São Paulo fossem para a Constituinte e dessem a sua contribuição. Eu (em 1986) não tive nem 20 mil votos, quando na eleição anterior cheguei quase nos 60 mil.
[Zé Dirceu] E você escreveu Olga durante esse período?
[Fernando Morais] Sim, foi aí que terminei Olga e comecei a trabalhar no “Chatô, o rei do Brasil”. Então, o Quércia me chamou para ser Secretário de Cultura e depois Secretário de Educação de São Paulo.
[Zé Dirceu] Como foi sua experiência na gestão dessas duas pastas?
[Fernando Morais] Na Secretaria de Cultura foi ótimo, deu para fazer muita coisa. O Quércia, com quem não tenho mais relações, é um governante que não tem meio termo. Para ele é sim ou não, o que é muito bom. Geralmente você pede recursos e o cara responde “não tem dinheiro nem pra bala da polícia militar”. Com ele não tinha disso. Por exemplo, em 1989 o presidente [Fernando] Collor tinha arrebentado com o cinema nacional, acabou com a EMBRAFILME, com tudo. São Paulo foi o único Estado capaz de levantar o cinema de nacional financiando dez longas. Na época, ele me deu R$ 20 milhões para lançar dez filmes e dar esse respiro no cinema nacional. No Memorial da América Latina (construído por Fernando no governo Quércia) fiz quase vinte oficinas culturais para ensinar música, teatro, cinema para a criançada de baixa renda. E quem ensinava eram os maiores artistas brasileiros. Eu levava Gianfrancesco Guarnieri para dar aula de interpretação para os moleques de periferia de Ribeirão Preto; Mário Prata para dar aula de roteiro. Era uma forma, ao mesmo tempo, de dar trabalho para os artistas. Você pagava a eles, mas era de graça para as crianças.Nesse período, eu consegui trazer até o Tom Jobim de Nova York para criar a Universidade Livre de Música. Hoje, chama-se Instituto Tom Jobim. O Tom passou um ano aqui ensinando para nós como se montava um conservatório musical gigantesco. Outro dia, ouvi um moleque tocando oboé na Sinfônica de Israel. Ele era morador de favela aqui e começou numa dessas oficinas culturais. Então, na área de cultura, minha avaliação é que foi muito bom. [Zé Dirceu] E na secretaria de Educação?[Fernando Morais] Na educação foi um desastre. No meio do caminho eu descobri que o governador [Luiz Antônio] Fleury Filho não queria fazer nenhuma revolução nesse setor, e eu não estava ali para ser chamado de excelência e andar em carro oficial. Pedi demissão e desisti. 2002: o apoio de Quércia a Lula
[Zé Dirceu] Você voltou a se candidatar pelo PMDB em 2002, a governador.
[Fernando Morais] Caí em tentação novamente em 2002. O Quércia me chamou para ser candidato a governador de São Paulo. Respondi que só saia se o partido apoiasse o Lula, naquele ano, candidato à presidência. Na época, o deputado Michel Temer (presidente nacional do PMDB) era da outra direção do partido, e estava comprometido com o (candidato à presidência) Serra, tanto que indicaram a deputada Rita Camata (PMDB-ES) como vice de sua candidatura. Consegui com o Quércia, o PMDB de São Paulo, apoiar o Lula. Tanto que no dia do lançamento do meu comitê de governador estão lá você e o Lula quebrando a garrafa de champanhe no palanque.Durante essa campanha para governador, a minha expectativa era o tempo de televisão. Eu tinha 5 minutos na hora do almoço e do jantar, uma eternidade. Como minha vida é transparente e não tenho dificuldade em falar em público, a televisão era o caminho. Eu estava com 3% a 4%, lá embaixo. Quem eram os meus adversários? Geraldo Alckmin (PSDB) e o José Genoíno (PT). Pensei: “aí, eu pego os dois”. Participei de um único debate, dei uma cacetada no Alckmin - isso me valeu um processo por injúria, calúnia e difamação, que ele perdeu em todas as instâncias - e ali meu nome começou a amadurecer por causa do bate-boca que tivemos.Então, quando faltavam cinco dias para o programa eleitoral começar (e finalmente o meu tempo de televisão), o Quércia mandou me avisar através do marqueteiro dele, o Toni Cotrim, que o horário seria dele. Ele era candidato a senador, tinha vaga para dois senadores, mas já usava o tempo do outro candidato, um laranja do ABC, deputado estadual, que topou se candidatar para dar o tempo do Quércia. Eu falei, “de maneira nenhuma, isso nem passa pela minha cabeça”. Primeiro, pela ilegalidade, segundo pela imoralidade comigo. Como vou dizer para a minha filha e para a minha mulher que sou candidato se não apareço? “Não, mas isso e aquilo...” Então, respondi: “não, estou fora”.No dia seguinte, puseram um pastor evangélico no meu lugar para dar o tempo ao Quércia - e mesmo assim, ele perdeu a eleição, apesar de ter na TV o tempo de dois senadores e de um governador. Eu retirei a candidatura num dia e no seguinte estava na campanha do Lula, no Rio de Janeiro, quando sugeri uma frase que acabou virando mote na campanha. A Regina Duarte tinha ido à TV (na propaganda tucana) falar que estava com medo. Nas vésperas de ir ao Rio, descobri um poema do Gilberto Freyre escrito em 1929 - nem sabia que ele escrevia poemas - muito bonito chamado “Um novo Brasil” que me parece uma premonição da Revolução de 30. Esse texto caiu como uma luva na candidatura do Lula e foi uma resposta indireta à Regina Duarte. Ao invés de discursar, eu disse no encontro do Rio que daria a palavra ao Gilberto Freyre e li o poema. Terminei dizendo o seguinte: “60 anos atrás o Gilberto Freyre já estava ensinando para nós que a esperança era maior do que o medo”. Fui para a campanha do PT e fiquei por lá. Nunca mais me meti pessoalmente em política. De lá pra cá, fiz todas as campanhas do PT. Em São Paulo, a campanha do Genoino; depois a da Marta (Suplicy) para a prefeitura; vou campanha da Dilma ano que vem, mas, pessoalmente, eu não quero mais.ABC: “é melhor você ficar porque parece que a barra vai pesar”.
[Zé Dirceu] E como foi sua experiência de oito anos como deputado estadual, você cumpriu mandato em duas legislaturas.
[Fernando Morais] O primeiro mandato foi de luta contra a ditadura. Do meu tempo como deputado, devo ter passado 80% nas portas do DOPS, nas greves do ABC. Inclusive, eu estava com o Lula e o (ex-deputado) Geraldinho Siqueira, na noite em que o Exército invadiu o sindicato dos metalúrgicos. Naquele dia, o Fernando Henrique Cardoso tinha estado lá, nós conversamos e saímos para comer um frango em São Bernardo. Na hora de ir embora, o Fernando falou: “eu vou para São Paulo.” Nós respondemos: “é melhor você ficar porque parece que a barra vai pesar”. Na época, o Fernando era suplente de senador (de Franco Montoro), portanto, uma personalidade e tal. Ele fez uma análise da conjuntura ali, provando por A+B que não corríamos riscos de o sindicato ser invadido, e foi embora para São Paulo. Isso quem conta é o Lula naquele livro O Sapo e o Príncipe [do Paulo Markun]. Então, o Fernando Henrique veio embora para São Paulo e nós ficamos. Quando deu 23h, meia noite por aí, nós ouvíamos o barulho dos helicópteros. Olhamos pela janela, estava tudo cercado (pela repressão) em volta do sindicato.Então, esse primeiro mandato foi muito rico, muito vivo. Eu levava comida no DOPS para eles, quando foram presos - Djalma Bom, Lula, José Cicotti. Levávamos fruta, eu e Luis Eduardo Greenhalgh que não era deputado ainda. Na verdade, eu tinha uma relação respeitosa com o (delegado Romeu) Tuma, embora ele tivesse me prendido – eu e minha mulher – quando voltamos de Cuba pela primeira vez. Nós fomos presos na escada do avião, mas não bateram na gente, nem fomos colocados na cela. Ficamos numa cela ao lado da sala do Tuma no prédio do DOPS. Então, eu conseguia levar comida para o pessoal desde que não fosse de dia para não chamar atenção da imprensa e desde que não fosse com carro oficial (de deputado). Já no segundo mandato, com o Montoro governador, o deputado virou uma espécie de despachante de luxo. O prefeito tem 4 mil votos, precisa ter uma audiência com o secretário de Educação, você não vai acompanhar? Agora, como eu tinha voto em todas as cidades, sem exceção, era deputado estadual, havia uma lista de prefeitos... Então, leva o prefeito e vai no secretário tal, depois em outro. Não que isso diminua alguém, mas não era o meu projeto de vida, nem com cem mil votos. Então, foi uma experiência muito frustrante o meu segundo mandato.
[Zé Dirceu] Fernando, dos teus biografados, é possível comparar e escolher qual foi o mais fascinante?
[Fernando Morais] Impossível. Como comparar Olga com Chateaubriand? Como comparar o Paulo Coelho com o marechal Montenegro? Quer história mais dramática do que a do Paulo? Drogas, vício, homossexualismo, missa negra, suicídio, tudo. Hospício! Moleque, o pai o internou - ele tinha 14, 15 anos - três vezes no hospício para ser tratado com eletrochoque na cabeça. Agora, você pega uma Olga, uma mulher que deu a vida por uma idéia! Ela não estava atrás de bem material, nada. Deu a vida por um ideal. Então, é muito difícil estabelecer esse tipo de comparação.
[Zé Dirceu] E há algum personagem interessante, mas sobre o qual você jamais escreveria? Você precisa se identificar com os biografados que escolhe?[Fernando Morais] Não, diferentemente de outros biógrafos. O Ruy Castro, por exemplo, disse que só escreve sobre pessoas pelas quais ele tem algum tipo de simpatia, alguma afinidade. Eu já pensei, inclusive, em escrever sobre o delegado (Sérgio Paranhos) Fleury. Vou escrever sobre o Antônio Carlos Magalhães. Passei nove anos gravando com ele. Devo ter quase mil horas gravadas e ele me deu uma cópia do seu arquivo pessoal. Seguramente, Zé, tem o seu nome lá, porque ele gravava todos os telefonemas. Ligava para o presidente da República com o gravador ligado e não informava o interlocutor que estava gravando. Particularmente, eu não tenho afinidade com o ACM, estamos em pólos opostos política e filosoficamente. Então, honestamente não há personagem sobre o qual eu não escreveria.
[Zé Dirceu] E sobre o restaurante Piantella, de Brasília?
[Fernando Morais] Há algum tempo, estou pensando em fazer a história do Piantella porque é possível fazer esse trabalho de biografia num livro que não seja biográfico, mas sobre um episódio. Escrevi Corações Sujos [2000] que não é uma biografia. Cem quilos de Ouro [2003] e a própria A Ilha [1976] também não são. Se dependesse de mim, já teria feito o Piantella, mas o Marco Aurélio (dono do restaurante) me enrolou um pouco. Na verdade, através da história do Piantella você conta um pouco da história do país, sobretudo, a do fim da ditadura militar. Ali era o lugar onde se conspirava. Eu pretendo fazer o livro sobre o Piantella, tenho até o modelo. O (jornalista) Ricardo Boechat fez um livro muito bonito sobre o Copacabana Palace, é um livro com fotos que ao mesmo tempo você lê, tem história sobre as pessoas que se hospedaram lá, o que aconteceu, brigas e paixões. O Piantella dava um livro, guardadas as diferenças, como este.Cinco cubanos e a luta contra o terrorismo de Miami
[Zé Dirceu] Conte um pouco para os leitores do blog, sobre seu livro atual, a respeito dos cubanos.
[Fernando Morais] O livro está indo bem. É uma história incrível porque são 15 caras que Cuba infiltra em organizações de extrema direita na Flórida, para combater o terrorismo partido dali contra a Ilha. Eles se apresentam nos EUA como desertores, traidores da revolução cubana e cada um foi de uma maneira.René González, por exemplo, roubou um avião em Cuba e pousou dentro da base aérea naval mais bem armada dos EUA. E, pior, com o tanque seco. Foi um negócio heróico. Ele teve que voar baixo para os radares de Cuba não o pegarem e ainda em zigue-zague porque a gasolina acabou. No momento em que viu as luzinhas de Key West, nos EUA, o tanque já estava seco, seco, seco. Ele entrou no rádio 14 da Marinha, da base aéreo naval e disse “sou desertor cubano, chamo-me René González e preciso pousar”. O cara respondeu, “na pista tal”. Ele desceu, foi recebido como herói e começou a trabalhar. Lá foi cooptado por uma organização de extrema direita [contra os cubanos] e logo depois, cooptado pelo FBI para passar informações desta organização de extrema direita para eles. Então, ele começa a fazer o jogo de dupla infiltração. Como ele, foram mais 14 cubanos e um não sabia do outro, apenas um que controlava todos sabia dos demais. Cada um foi de uma forma, quase todos como traidores da revolução, e houve os que saíram dentro da cota dos 20 mil vistos concedidos por ano. Os cubanos chegaram nos EUA no começo dos anos 90, quando acabou a URSS, e Cuba entrou no chamado período especial de dificuldades muitos grandes.Nessa fase, o país salvou sua economia através do turismo. Vendo isso, os americanos começaram a fazer atentados em Cuba, exatamente na área turística. Colocaram bomba em avião, em hotel de luxo para espantar os turistas. Você vai para o Iêmen passar férias? Não vai, tem medo. O Egito durante muito tempo passou por isso. Então, os americanos queriam quebrar a indústria do turismo de Cuba com o terrorismo, e Cuba não tinha como combater esses caras, porque eles moravam nos EUA, na Flórida e a polícia e o governo ou os apoiava ou fechava os olhos. Por isso, mandaram 15 caras para lá. O primeiro foi em 1990 e até 1998, foram oito anos de trabalho, [infiltrados em organizações de extrema direita]. Eles mandavam informações para Cuba. Por exemplo, “fulano de tal vai entrar dia tal vindo de El Salvador com uma televisão portátil debaixo do braço dizendo que está levando de presente para uma tia”. Os cubanos abriam a televisão e achavam 4 kg de explosivo lá dentro, de centex, de explosivo líquido e plástico. Até que na madrugada de setembro de 1998, o FBI e a Swat invadiram 15 casas na mesma hora, numa operação na Flórida. Cinco fugiram antes deles chegarem, um na véspera da cana... ficaram dez. Desses, 5 fizeram acordo de delação premiada com o governo americano. Neste período já tinham informações e dedaram os outros cinco em troca de serem libertados com identidade falsa e com bolsa do governo. Até hoje, eles estão nos Estados Unidos em lugares diferentes, com nomes diferentes. Os cinco presos [Gerardo Hernández, Ramon Labañino, Antonio Guerrero, Fernando e René González] foram condenados a penas de 20 anos e a duas perpétuas. Essa é a história.
[Zé Dirceu] Então, o FBI estava vigiando a atividade deles antes?
[Fernando Morais] Eles estavam vigiando os caras há dois anos. Já tinha escutas dentro das casas. Um morava num apartamento e o FBI alugou outro apartamento exatamente na frente para fotografar e ver a hora em que saia. Eles iam lá, abriam, tiravam o disco rígido do computador, copiavam e o recolocavam. Pegaram mais de 20 mil mensagens enviadas pelos cubanos, e o julgamento foi um negócio absurdo. Não há nenhuma prova, no meio dessa documentação toda, de que eles tenham espionado os EUA [o objetivo era obter informações das organizações de extrema direita que faziam terrorismo em Cuba]. Nunca pegaram nenhum documento norte-americano, nunca tiveram acesso a nenhuma informação sigilosa ou secreta, e quem diz isso foram três almirantes e um general americano ligados à Agência Nacional de Segurança. Depoimento do júri, homologado pelos advogados com testemunha de defesa dos cinco, e tudo. Um camarada, inclusive, tinha o emprego de encanador numa base aérea americana, e o general que comandava essa base disse que ele nunca chegou por perto dos prédios que tinham informações que pudessem ser consideradas de segurança nacional. Outro cara tinha sido comandante de uma coluna de tanques em Angola e entrou nos EUA para ser professor de salsa.
Educação: o nó está no ensino de primeiro e segundo graus
[Zé Dirceu] Fernando, mudando de assunto, como você avalia a educação e a cultura nesses quase sete anos de governo Lula?
[Fernando Morais] Cultura deu um salto significativo. Educação, a minha esperança é que o Lula realmente use o dinheiro do pré-sal para fazer uma revolução nessa área. Não só como autor de livros, mas sobretudo tendo sido secretário do Estado com maior número de estudantes no Brasil – em São Paulo são seis milhões de estudantes e hoje deve ser um pouco menos, é a população da Dinamarca, e na época, o orçamento da Educação no Estado era de US$ 4bi - aprendi um pouco e descobrir onde está o nó.Em primeiro lugar, não é ensino superior, mas o de primeiro e segundo graus. E, principalmente, só conserta na hora em que você tiver educação em tempo integral. O projeto do (ex-governador do Rio, Leonel) Brizola era verdade – e não era do Brizola, mas do Anísio Teixeira (educador dos anos 50). Não tem nenhum segredo. Se você pegar todos os países que deram certo no mundo...O caso do Japão, destruído no final da II Guerra e agora, segunda maior potência do mundo... Eles não tem nada de especial em relação a nós, mas num dado período gastaram 70% do orçamento em educação. Não tinham dinheiro para gasolina de viatura policial, mas tinham para educação de melhor qualidade. A minha esperança é essa. O Lula vai pro céu se fizer isso. Pode cometer todos os pecados, mas se de fato fizer o que está prometendo, de usar os recursos do pré-sal para fazer uma revolução na Educação, daqui a 500 anos quando os nossos tataranetos olharem para o Brasil e tiverem que citar um estadista, dirão que é o Lula. Mais do que o Getúlio Vargas, porque Vargas tem uma mancha na história dele: (a ditadura e) a própria Olga é um exemplo disso.E Getúlio foi três: o revolucionário de 30, que deu ao Brasil a condição de nação - antes o país era uma república de coronéis e barões do café; o Getúlio ditador que reprimiu tanto a esquerda - Olga é um exemplo disso - quanto a direita, como fez com os integralistas, arrancaram por exemplo unha do tenente Fournier; e o terceiro Getúlio, o nacionalista, o antiimperialista, o da Petrobras.Foi o da Petrobras que o DEM da época (1950-1954), a UDN, tentou derrubar e que termina com o gesto heróico de dar um tiro no coração. Então, com absoluta certeza, se o Lula encerrar o seu mandato consertando a educação brasileira, vai precisar muito milênio para termos um outro estadista como ele.Hoje, todo mundo pode ser o seu próprio Roberto Marinho.
[Zé Dirceu] Fernando para fechar, como você vê o jornalismo hoje no país e a mídia como um todo?
[Fernando Morais] Um horror, uma verdadeira tragédia. Toda generalização é injusta - se você me pedir para apontar um ou outro que não esteja nesse meio, eu consigo. Agora, no geral, a imprensa e os veículos se transformaram em partidos políticos de direita, sem assumir isso. Porque se assumisse não tinha problema. Você cria uma referência. Essa é uma revista de esquerda, esse é o é o blog do Paulo Henrique Amorim que não gosta do Fernando Henrique Cardoso. Pronto, você já avisa ao leitor o que ele está lendo. Se você pega uma revista como a Veja, por exemplo, ela tem todo o direito de fazer o que bem entender. Numa sociedade como a nossa, quem tem dinheiro para montar uma revista, pode fazer o que quiser, inclusive, não tem que ter nenhuma preocupação com a ética. Agora, esclareça o leitor que aquilo ali é um partido político, que você está defendendo interesses. Isso realmente não acontece.Veja que isso não é de hoje. Se você pegar o Estadão de quando o Juscelino (Kubitschek) deixou a presidência da República, vai ver que o jornal dizia que o presidente era a quinta maior fortuna do mundo. Juscelino morreu e dona. Sara teve que vender casa para pagar despesas familiares. “A quinta maior fortuna do mundo” segundo o Estadão. Isso piorou de lá prá cá, mas para a nossa sorte, acabou. Eu sempre acreditei que até a democratização dos meios de comunicação seria uma luta política. Acabei descobrindo que se tornou uma conquista tecnológica. Hoje, todo mundo pode ser o seu próprio Roberto Marinho. Se você botar um notebook aqui na frente e ligar uma câmera de vídeo - custa baratinho - e falar o dia inteiro, se disser o que as pessoas querem ouvir, terá audiência, ganhará anúncio e terá recursos para sustentar e ampliar a sua estrutura.Felizmente, essas publicações (tradicionais) estão com os dias contados.
extraído do Blog do Zé Dirceu, endereço http://www.zedirceu.com.br/ (com autorização prévia) em 05/10/09
quinta-feira, 1 de outubro de 2009
Por que e a quem interessa paralisar obras estratégicas? , por José Augusto Valente
30/09/2009 17:41
Por que e a quem interessa paralisar obras estratégicas?
Por que e a quem interessa paralisar obras estratégicas para o país?
Fundamentarei neste artigo as seguintes afirmações e juízos:
a) Não é necessário e, ao contrário, é ineficaz, a paralisação de obras públicas estratégicas para o país. Se o que se pretende é fazer com que a obra tenha um custo adequado, dentro dos princípios constitucionais, há outras penalidades que conseguem punir quem deve ser punido e, ainda recolocar o contrato nos eixos. Neste caso, além de se retomar padrões razoáveis na administração pública, não se penaliza os usuários, a região e o país, com o adiamento de obras vitais para eles.b) Quanto à outra parte – a quem interessa a paralisação? – só pode ter duas respostas. A mais óbvia é “a ninguém”, pelos motivos expostos acima. A mais maquiavélica é “interessa a quem deseja que o governo não possa capitalizar politicamente os benefícios gerados pelas mesmas”.c) Interessa ainda menos aos trabalhadores (e suas famílias) que serão demitidos em massa, com a paralisação de obras de grande porte, como as mencionadas nos recentes relatórios do TCU, num momento muito especial de retomada vigorosa do crescimento econômico e social do Brasil.Vamos às fundamentações:O Tribunal de Contas da União – TCU é um órgão de assessoramento ao Congresso Nacional, em uma de suas principais atribuições que é a fiscalização do Poder Executivo. Os funcionários do quadro efetivo do TCU são do mais alto nível, aprovados em concursos considerados dos mais difíceis do país. O TCU, portanto, tem um quadro efetivo sobre o qual poucos questionamentos fariam sentido.Entretanto, os Ministros do TCU, que são os relatores dos inúmeros processos que por lá tramitam, são indicados por critérios políticos. Por mais que eles procurem ser isentos – como se isso fosse possível – não há como fugir de interpretações eivadas de ideologia, valores e posicionamentos político-partidário das suas origens. Tudo isso faz parte do jogo e penso que é assim que tem que ser entendido o papel do TCU.Na tramitação de um processo de fiscalização ou de auditoria de contas, há duas fases distintas que precisam ser bem compreendidas. A primeira, diz respeito ao trabalho exaustivo de apuração de informações, definição de juízo de valor, notificação aos dirigentes e elaboração de propostas de encaminhamento. Esse trabalho é fundamentalmente executado pelo quadro de funcionários efetivos do TCU. A segunda, diz respeito ao juizo de valor do ministro-relator, que é feito em cima desse material produzido por funcionários qualificados. Relatórios do TCU, encaminhados ao Congresso Nacional para deliberação, muitas vezes, são instrumentos de utilização pela mídia, para fins de crítica contundente ao Governo em exercício, neste caso, ao Presidente Lula. Até aí, como não somos ingênuos de pensar que a mídia é imparcial, também faz parte do jogo.A pergunta que precisa ser respondida e que somente a blogosfera independente tem autoridade para fazer é: porque e a quem interessa a paralisação de obras estratégicas para o país?Não quero discutir se o TCU tem ou não razão em emitir juizo de valor de que ocorreram irregularidades ou mesmo de que há fortes indícios de irregularidades. Estou supondo que os juizos são bem fundamentados e fazem sentido. O que questiono é se faz sentido, ou melhor, se é melhor para o país paralisar uma obra estratégica em andamento, ou se haveria outras formas de encaminhar penalidades aos dirigentes e às empresas executoras que não impliquem em alto custo para o país.A Ministra Dilma Roussef está certíssima em questionar esse ponto. Uma grande obra, ao ser paralisada (e temos inúmeros exemplos disso, no Governo Fernando Henrique Cardoso) tem como primeiro impacto impedir que os benefícios que essas obras trariam – para os usuários e para o desenvolvimento regional e nacional – sejam adiados sabe-se lá para quando. Há caso de obras paralisadas, como duplicações de rodovias, que prorrogaram os infortúnios e elevaram os custos de transportes de milhares de usuários por mais de cinco anos.O segundo impacto refere-se à elevação substantiva do custo final da obra. Esse é o paradoxo que o TCU precisa resolver: no correto intuito de impedir o mal decorrente dos superfaturamentos e dos sobre-preços, que elevariam o custo final da obra, termina por produzir o mesmo mal, só que num patamar muito mais elevado, que é a elevação do custo final da obra. Isso porque desmobilizar e er-mobilizar uma obra acresce a essa um custo muito alto. Sem contar que, nos casos de obras rodoviárias, perde-se uma grande parte do realizado porque, como não foram concluídas as obras que protegeriam a infra-estrutura dos efeitos climáticos (chuvas, em especial), como revestimento final e drenagem, ao retomar a obra, muitos desse serviços precisam ser refeitos, acrescendo-se, então mais custos de retrabalho.Reiterando: ao combater o mal, produz um mal ainda maior.Seja como for, espero ter fundamentado que não faz sentido algum a proposta de paralisação de obras, por supostas ou por constatadas irregularidades.Penso que o país espera que o Congresso Nacional seja sábio e encaminhe pela punição necessária e suficiente, para que as irregularidades ou indícios de irregularidades sejam corrigidos, sem prejudicar o povo brasileiro, especialmente os trabalhadores que serão demitidos.
Por que e a quem interessa paralisar obras estratégicas?
Por que e a quem interessa paralisar obras estratégicas para o país?
Fundamentarei neste artigo as seguintes afirmações e juízos:
a) Não é necessário e, ao contrário, é ineficaz, a paralisação de obras públicas estratégicas para o país. Se o que se pretende é fazer com que a obra tenha um custo adequado, dentro dos princípios constitucionais, há outras penalidades que conseguem punir quem deve ser punido e, ainda recolocar o contrato nos eixos. Neste caso, além de se retomar padrões razoáveis na administração pública, não se penaliza os usuários, a região e o país, com o adiamento de obras vitais para eles.b) Quanto à outra parte – a quem interessa a paralisação? – só pode ter duas respostas. A mais óbvia é “a ninguém”, pelos motivos expostos acima. A mais maquiavélica é “interessa a quem deseja que o governo não possa capitalizar politicamente os benefícios gerados pelas mesmas”.c) Interessa ainda menos aos trabalhadores (e suas famílias) que serão demitidos em massa, com a paralisação de obras de grande porte, como as mencionadas nos recentes relatórios do TCU, num momento muito especial de retomada vigorosa do crescimento econômico e social do Brasil.Vamos às fundamentações:O Tribunal de Contas da União – TCU é um órgão de assessoramento ao Congresso Nacional, em uma de suas principais atribuições que é a fiscalização do Poder Executivo. Os funcionários do quadro efetivo do TCU são do mais alto nível, aprovados em concursos considerados dos mais difíceis do país. O TCU, portanto, tem um quadro efetivo sobre o qual poucos questionamentos fariam sentido.Entretanto, os Ministros do TCU, que são os relatores dos inúmeros processos que por lá tramitam, são indicados por critérios políticos. Por mais que eles procurem ser isentos – como se isso fosse possível – não há como fugir de interpretações eivadas de ideologia, valores e posicionamentos político-partidário das suas origens. Tudo isso faz parte do jogo e penso que é assim que tem que ser entendido o papel do TCU.Na tramitação de um processo de fiscalização ou de auditoria de contas, há duas fases distintas que precisam ser bem compreendidas. A primeira, diz respeito ao trabalho exaustivo de apuração de informações, definição de juízo de valor, notificação aos dirigentes e elaboração de propostas de encaminhamento. Esse trabalho é fundamentalmente executado pelo quadro de funcionários efetivos do TCU. A segunda, diz respeito ao juizo de valor do ministro-relator, que é feito em cima desse material produzido por funcionários qualificados. Relatórios do TCU, encaminhados ao Congresso Nacional para deliberação, muitas vezes, são instrumentos de utilização pela mídia, para fins de crítica contundente ao Governo em exercício, neste caso, ao Presidente Lula. Até aí, como não somos ingênuos de pensar que a mídia é imparcial, também faz parte do jogo.A pergunta que precisa ser respondida e que somente a blogosfera independente tem autoridade para fazer é: porque e a quem interessa a paralisação de obras estratégicas para o país?Não quero discutir se o TCU tem ou não razão em emitir juizo de valor de que ocorreram irregularidades ou mesmo de que há fortes indícios de irregularidades. Estou supondo que os juizos são bem fundamentados e fazem sentido. O que questiono é se faz sentido, ou melhor, se é melhor para o país paralisar uma obra estratégica em andamento, ou se haveria outras formas de encaminhar penalidades aos dirigentes e às empresas executoras que não impliquem em alto custo para o país.A Ministra Dilma Roussef está certíssima em questionar esse ponto. Uma grande obra, ao ser paralisada (e temos inúmeros exemplos disso, no Governo Fernando Henrique Cardoso) tem como primeiro impacto impedir que os benefícios que essas obras trariam – para os usuários e para o desenvolvimento regional e nacional – sejam adiados sabe-se lá para quando. Há caso de obras paralisadas, como duplicações de rodovias, que prorrogaram os infortúnios e elevaram os custos de transportes de milhares de usuários por mais de cinco anos.O segundo impacto refere-se à elevação substantiva do custo final da obra. Esse é o paradoxo que o TCU precisa resolver: no correto intuito de impedir o mal decorrente dos superfaturamentos e dos sobre-preços, que elevariam o custo final da obra, termina por produzir o mesmo mal, só que num patamar muito mais elevado, que é a elevação do custo final da obra. Isso porque desmobilizar e er-mobilizar uma obra acresce a essa um custo muito alto. Sem contar que, nos casos de obras rodoviárias, perde-se uma grande parte do realizado porque, como não foram concluídas as obras que protegeriam a infra-estrutura dos efeitos climáticos (chuvas, em especial), como revestimento final e drenagem, ao retomar a obra, muitos desse serviços precisam ser refeitos, acrescendo-se, então mais custos de retrabalho.Reiterando: ao combater o mal, produz um mal ainda maior.Seja como for, espero ter fundamentado que não faz sentido algum a proposta de paralisação de obras, por supostas ou por constatadas irregularidades.Penso que o país espera que o Congresso Nacional seja sábio e encaminhe pela punição necessária e suficiente, para que as irregularidades ou indícios de irregularidades sejam corrigidos, sem prejudicar o povo brasileiro, especialmente os trabalhadores que serão demitidos.
quinta-feira, 24 de setembro de 2009
HERANÇAS MALDITAS, por Manoel Soriano Neto
HERANÇAS MALDITAS
Em sua tumultuada visita a Roraima, no dia 14 Set último, o presidente Lula assinou ato que determina a demarcação de uma nova e monumental reserva indígena (600 hectares para cada índio!) naquele estado. Tal Reserva, de nome Anaro, a 113 Km de Boa Vista, unirá a Reserva São Marcos às colossais reservas Raposa Serra do Sol e Ianomâmi, localizadas nas “orelhas” de Roraima – o mais novo e pobre ente federativo da União – que, assim, se “reterritorializa” mais ainda, podendo se transformar no primeiro estado indígena dentro do Brasil (ao depois, estará em condições de pleitear a sua separação do todo nacional). Diga-se que o aparato indigenista transnacional deseja mais, ou seja, quer a completa integração física das reservas ao norte dos rios Amazonas/Solimões, riquíssimas em biodiversidade e minérios de terceira geração, com a finalidade de ser criada uma imensa Nação Indígena em território único e contínuo, com base, fundamentalmente, na Convenção 169 da OIT (acolhida pela legislação brasileira – Decreto n° 5051/2004) e na Declaração Universal dos Direitos dos Povos Indígenas, aprovada pela ONU, com o entreguista voto brasileiro. Não estranhemos, pois, que já tendo obtido uma “soberania limitada” nos territórios de suas descomunais reservas, os índios, açulados pela FUNAI e ONGs nacionais e estrangeiras, reivindiquem a criação de “nações indígenas” que terão, com toda certeza, o reconhecimento à independência e à auto-determinação, em foros internacionais. A propósito, aduza-se que a “Coordenação das Organizações Indígenas da Bacia Amazônica” (COICA), integrada por entidades indigenistas do Brasil, Peru, Guiana, Bolívia, Equador, Venezuela, Departamento Ultramarino Francês - ex-Guiana Francesa -, Suriname e Colômbia, almeja a criação da “Abya Yala”, nome de uma vasta região da América, habitada por índios, antes da chegada dos europeus, em terras dos atuais Peru, Colômbia e Panamá. Nesta enorme área conviveriam etnias tribais diversas, formando-se “nações” plurinacionais e multiculturais (“Estados fantoches”) à custa da amputação de territórios de Estados Nacionais Soberanos. Outrossim, já se propala a criação da grande “Nação Guarani”, formada pela fragmentação de terras de vários países, inclusive do Brasil, e que seria a reconstituição mal acabada , do “Império Teocrático dos Jesuítas”, com as suas inúmeras reduções indígenas como as dos “Sete Povos das Missões”. No Brasil, tudo começou, em 1991, com a antipatriótica demarcação contínua de uma gigantesca reserva indígena, na fronteira com a Venezuela. Neste País já havia sido delimitada uma outra reserva para índios da mesma etnia, contígua à anteriormente referida, estabelecendo-se um imenso enclave amazônico em dois países, para uma minoria indígena, sem que fosse respeitada a “faixa de fronteira” (frise-se, por ilustração, que fato semelhante voltou a ocorrer quando da recente demarcação da Reserva Indígena Raposa Serra do Sol). Tal faixa, de 150 Km, consta da atual Carta Magna e foi criada, desde nossa Independência, pela antiga “Lei de Terras”. À época, como ocorreu antes do julgamento pelo STF da questão da Reserva Raposa Serra do Sol, vozes de altivos e nacionalistas brasileiros se levantaram contra aquele despautério, cumprindo destacar as graves advertências do emérito e saudoso jurista Clóvis Ramalhete (foi Ministro do STF, Membro da Corte Permanente de Arbitragem, de Haia, e Consultor-Geral da República), que escreveu na revista do Clube Militar, de Fev 2001, antológico artigo de título “O Exército e a Amazônia”, assim o finalizando: “É, pois, de entender-se que, até mesmo judicialmente, há de ser reconhecido o “relevante interesse” que terá a União, no desfazimento do malsinado ato que fez concessão de terras aos ianomâmis, na “Faixa de Fronteira”. Foi fruto da temeridade e da incompetência; e constitui, agora, a maldita herança de Collor”. Entretanto, o ato não foi desfeito e, pior ainda, outras demarcações se realizaram, sem a preservação da faixa fronteiriça - verdadeiro atentado à Soberania Nacional -, especialmente na cobiçada Amazônia. E, com o passar do tempo, surgiram novas heranças malditas que ora se multiplicam... E tudo, lastimavelmente, com a anuência da FUNAI e sua caótica política indigenista, no intuito de que os aborígines permaneçam segregados em seu estado tribal, incutindo-lhes a idéia de que os Estados Nacionais são ameaças a seus interesses. E mentem, deslavadamente, como o fizeram em relação ao ínclito Marechal Rondon, afirmando que ele era contrário à integração dos silvícolas à comunidade nacional. Tal falácia foi desmentida, cabalmente, pelo ex-Comandante Militar da Amazônia, Gen Ex Cláudio Barbosa de Figueiredo, por meio da imprensa escrita e televisiva. Em verdade, conforme declarações próprias, Rondon sempre pugnou pela “realização do sonho de José Bonifácio de Andrada e Silva” – “O Patriarca da Independência” e “Idealizador da Nação Brasileira”, no sentido de incorporar o índio, definitiva e espontaneamente, à civilização brasileira”. Que Deus afaste de nós essas Heranças Malditas e os contínuos atos atentatórios à Unidade Nacional! Cel Manoel Soriano Neto – Historiador Militar
recebido em 24/09/09.
Observação:
O blog Coletivobrasil3000 publica o texto acima, porque os fatos relativos às demarcações de terras indígenas no território brasileiro nele ventilados são notórios e, até o momento, não têm, nosso blog, conhecimento de respostas das autoridades brasileiras às questões levantadas no texto, as quais, nitidamente, envolvem o interesse do Brasil enquanto nação. Sendo, pois, nosso propósito aberto o de defender tais interesses, cumpre-nos promover a discussão.
Em sua tumultuada visita a Roraima, no dia 14 Set último, o presidente Lula assinou ato que determina a demarcação de uma nova e monumental reserva indígena (600 hectares para cada índio!) naquele estado. Tal Reserva, de nome Anaro, a 113 Km de Boa Vista, unirá a Reserva São Marcos às colossais reservas Raposa Serra do Sol e Ianomâmi, localizadas nas “orelhas” de Roraima – o mais novo e pobre ente federativo da União – que, assim, se “reterritorializa” mais ainda, podendo se transformar no primeiro estado indígena dentro do Brasil (ao depois, estará em condições de pleitear a sua separação do todo nacional). Diga-se que o aparato indigenista transnacional deseja mais, ou seja, quer a completa integração física das reservas ao norte dos rios Amazonas/Solimões, riquíssimas em biodiversidade e minérios de terceira geração, com a finalidade de ser criada uma imensa Nação Indígena em território único e contínuo, com base, fundamentalmente, na Convenção 169 da OIT (acolhida pela legislação brasileira – Decreto n° 5051/2004) e na Declaração Universal dos Direitos dos Povos Indígenas, aprovada pela ONU, com o entreguista voto brasileiro. Não estranhemos, pois, que já tendo obtido uma “soberania limitada” nos territórios de suas descomunais reservas, os índios, açulados pela FUNAI e ONGs nacionais e estrangeiras, reivindiquem a criação de “nações indígenas” que terão, com toda certeza, o reconhecimento à independência e à auto-determinação, em foros internacionais. A propósito, aduza-se que a “Coordenação das Organizações Indígenas da Bacia Amazônica” (COICA), integrada por entidades indigenistas do Brasil, Peru, Guiana, Bolívia, Equador, Venezuela, Departamento Ultramarino Francês - ex-Guiana Francesa -, Suriname e Colômbia, almeja a criação da “Abya Yala”, nome de uma vasta região da América, habitada por índios, antes da chegada dos europeus, em terras dos atuais Peru, Colômbia e Panamá. Nesta enorme área conviveriam etnias tribais diversas, formando-se “nações” plurinacionais e multiculturais (“Estados fantoches”) à custa da amputação de territórios de Estados Nacionais Soberanos. Outrossim, já se propala a criação da grande “Nação Guarani”, formada pela fragmentação de terras de vários países, inclusive do Brasil, e que seria a reconstituição mal acabada , do “Império Teocrático dos Jesuítas”, com as suas inúmeras reduções indígenas como as dos “Sete Povos das Missões”. No Brasil, tudo começou, em 1991, com a antipatriótica demarcação contínua de uma gigantesca reserva indígena, na fronteira com a Venezuela. Neste País já havia sido delimitada uma outra reserva para índios da mesma etnia, contígua à anteriormente referida, estabelecendo-se um imenso enclave amazônico em dois países, para uma minoria indígena, sem que fosse respeitada a “faixa de fronteira” (frise-se, por ilustração, que fato semelhante voltou a ocorrer quando da recente demarcação da Reserva Indígena Raposa Serra do Sol). Tal faixa, de 150 Km, consta da atual Carta Magna e foi criada, desde nossa Independência, pela antiga “Lei de Terras”. À época, como ocorreu antes do julgamento pelo STF da questão da Reserva Raposa Serra do Sol, vozes de altivos e nacionalistas brasileiros se levantaram contra aquele despautério, cumprindo destacar as graves advertências do emérito e saudoso jurista Clóvis Ramalhete (foi Ministro do STF, Membro da Corte Permanente de Arbitragem, de Haia, e Consultor-Geral da República), que escreveu na revista do Clube Militar, de Fev 2001, antológico artigo de título “O Exército e a Amazônia”, assim o finalizando: “É, pois, de entender-se que, até mesmo judicialmente, há de ser reconhecido o “relevante interesse” que terá a União, no desfazimento do malsinado ato que fez concessão de terras aos ianomâmis, na “Faixa de Fronteira”. Foi fruto da temeridade e da incompetência; e constitui, agora, a maldita herança de Collor”. Entretanto, o ato não foi desfeito e, pior ainda, outras demarcações se realizaram, sem a preservação da faixa fronteiriça - verdadeiro atentado à Soberania Nacional -, especialmente na cobiçada Amazônia. E, com o passar do tempo, surgiram novas heranças malditas que ora se multiplicam... E tudo, lastimavelmente, com a anuência da FUNAI e sua caótica política indigenista, no intuito de que os aborígines permaneçam segregados em seu estado tribal, incutindo-lhes a idéia de que os Estados Nacionais são ameaças a seus interesses. E mentem, deslavadamente, como o fizeram em relação ao ínclito Marechal Rondon, afirmando que ele era contrário à integração dos silvícolas à comunidade nacional. Tal falácia foi desmentida, cabalmente, pelo ex-Comandante Militar da Amazônia, Gen Ex Cláudio Barbosa de Figueiredo, por meio da imprensa escrita e televisiva. Em verdade, conforme declarações próprias, Rondon sempre pugnou pela “realização do sonho de José Bonifácio de Andrada e Silva” – “O Patriarca da Independência” e “Idealizador da Nação Brasileira”, no sentido de incorporar o índio, definitiva e espontaneamente, à civilização brasileira”. Que Deus afaste de nós essas Heranças Malditas e os contínuos atos atentatórios à Unidade Nacional! Cel Manoel Soriano Neto – Historiador Militar
recebido em 24/09/09.
Observação:
O blog Coletivobrasil3000 publica o texto acima, porque os fatos relativos às demarcações de terras indígenas no território brasileiro nele ventilados são notórios e, até o momento, não têm, nosso blog, conhecimento de respostas das autoridades brasileiras às questões levantadas no texto, as quais, nitidamente, envolvem o interesse do Brasil enquanto nação. Sendo, pois, nosso propósito aberto o de defender tais interesses, cumpre-nos promover a discussão.
quarta-feira, 23 de setembro de 2009
Carta Aberta: "DIGNIDADE AOS APOSENTADOS E TRABALHADORES"
Depois de vários meses de negociações e de promessas de uma solução favorável para os aposentados e pensionistas do INSS que ganham acima de um salário mínimo, o Governo Lula não apresentou nenhuma proposta e apenas acatou sugestões de algumas centrais sindicais que NÃO promovem a recuperação do poder aquisitivo dos segurados, garantia constitucional (art. 194) que este Governo está descumprindo.
Pela falta de respeito e de atenção, a Confederação Brasileira de Aposentados e Pensionistas (Cobap), entidade que legitimamente representa o segmento há mais de 20 anos, bem como a Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB), a Nova Central Sindical de Trabalhadores (NCST) e o Fórum Social dos Trabalhadores (FST), movimento que congrega 288 Federações e 14 Confederações, se retiram das negociações e repudiam, na íntegra, esse “acordo” forjado.
O Governo Lula, de forma maquiavélica, divulga aos quatro cantos que celebrou um acordo favorável aos aposentados e que, portanto, todos os projetos de lei que tramitam no Congresso Nacional, de interesse dos aposentados do INSS, poderão ser substituídos por um só. O presidente do “Sindicato de Aposentados” da Força Sindical, João Batista Inocentine, teria declarado à imprensa que a intenção do Governo, com esta proposta, é eliminar mais de cem projetos em tramitação.
Isto é uma manobra do Governo Lula para tentar enganar a opinião pública e calar, ao mesmo tempo, o movimento nacional de aposentados e o Congresso Nacional. O anunciado projeto substitutivo, a ser apresentado pelo deputado Pepe Vargas (PT/RS), representa um golpe na democracia! O malfadado “acordo” não tem NENHUMA legitimidade e não pode ser apresentado como a vontade dos aposentados. Do mesmo modo, o Congresso, não pode ser desrespeitado, com a eliminação sumária de tantos projetos, como se um trator passasse por cima da vontade dos deputados e senadores. Principalmente porque os três principais projetos de interesse do segmento (PLs 01/07, 3.299/08 e 4.434/08) já foram APROVADOS pelo Senado. Eles não podem ser jogados na lata de lixo, como muitos já atiram nessa mesma lata sua ética e sua dignidade.
Reafirmamos em alto e bom som que a Seguridade Social no Brasil tem sim receita mais que suficiente para pagar benefícios dignos. Foi por isso que o Governo Lula fez questão de prorrogar a validade da “DRU”, um artifício contábil por meio do qual são RETIRADOS da Previdência cerca de R$ 60 BILHÕES por ano. Os aposentados e pensionistas brasileiros NÃO precisam ser condenados a receber apenas UM salário mínimo, como indicam as políticas de reajustes atual e aquela proposta pelas tais centrais. Da mesma forma, não há justificativa para manutenção ou transformação do Fator Previdenciário, uma fórmula burra e perversa que apenas prejudica os aposentados, sem NADA contribuir para a sustentabilidade financeira do sistema.
Por tais motivos, conclamamos toda a população para acompanhar seus deputados, telefonar (0800 619 619), escrever cartas e e-mails, solicitando a aprovação – nas redações originais, como aprovado pelo Senado – dos projetos de lei n°s 01/07 (reajuste igual ao do salário mínimo) 3.299/08 (fim do fator previdenciário) e 4.434/08 (recuperação das perdas).
Aos Senhores Deputados Federais pedimos de mantenham a independência, que votem com a consciência de servir ao país e à sua população, conferindo à Câmara a verdadeira grandeza do Parlamento, ao aprovar esses projetos, sem se subjugar às imposições do Planalto. Os 26,4 milhões de beneficiários da Seguridade, dentre eles os 16 milhões de aposentados e pensionistas do INSS, os trabalhadores na ativa e os familiares de todos eles saberão retribuir em 2010.
Setembro de 2009
- Federação dos Aposentados e Pensionistas de Minas Gerais – FAP/MG
- Confederação Brasileira de Aposentados e Pensionistas – COBAP
- Nova Central Sindical dos Trabalhadores – NCST
- Central dos Trabalhadores do Brasil – CTB
- Fórum Sindical dos Trabalhadores – FST
-recebida em 23/09/09
Pela falta de respeito e de atenção, a Confederação Brasileira de Aposentados e Pensionistas (Cobap), entidade que legitimamente representa o segmento há mais de 20 anos, bem como a Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB), a Nova Central Sindical de Trabalhadores (NCST) e o Fórum Social dos Trabalhadores (FST), movimento que congrega 288 Federações e 14 Confederações, se retiram das negociações e repudiam, na íntegra, esse “acordo” forjado.
O Governo Lula, de forma maquiavélica, divulga aos quatro cantos que celebrou um acordo favorável aos aposentados e que, portanto, todos os projetos de lei que tramitam no Congresso Nacional, de interesse dos aposentados do INSS, poderão ser substituídos por um só. O presidente do “Sindicato de Aposentados” da Força Sindical, João Batista Inocentine, teria declarado à imprensa que a intenção do Governo, com esta proposta, é eliminar mais de cem projetos em tramitação.
Isto é uma manobra do Governo Lula para tentar enganar a opinião pública e calar, ao mesmo tempo, o movimento nacional de aposentados e o Congresso Nacional. O anunciado projeto substitutivo, a ser apresentado pelo deputado Pepe Vargas (PT/RS), representa um golpe na democracia! O malfadado “acordo” não tem NENHUMA legitimidade e não pode ser apresentado como a vontade dos aposentados. Do mesmo modo, o Congresso, não pode ser desrespeitado, com a eliminação sumária de tantos projetos, como se um trator passasse por cima da vontade dos deputados e senadores. Principalmente porque os três principais projetos de interesse do segmento (PLs 01/07, 3.299/08 e 4.434/08) já foram APROVADOS pelo Senado. Eles não podem ser jogados na lata de lixo, como muitos já atiram nessa mesma lata sua ética e sua dignidade.
Reafirmamos em alto e bom som que a Seguridade Social no Brasil tem sim receita mais que suficiente para pagar benefícios dignos. Foi por isso que o Governo Lula fez questão de prorrogar a validade da “DRU”, um artifício contábil por meio do qual são RETIRADOS da Previdência cerca de R$ 60 BILHÕES por ano. Os aposentados e pensionistas brasileiros NÃO precisam ser condenados a receber apenas UM salário mínimo, como indicam as políticas de reajustes atual e aquela proposta pelas tais centrais. Da mesma forma, não há justificativa para manutenção ou transformação do Fator Previdenciário, uma fórmula burra e perversa que apenas prejudica os aposentados, sem NADA contribuir para a sustentabilidade financeira do sistema.
Por tais motivos, conclamamos toda a população para acompanhar seus deputados, telefonar (0800 619 619), escrever cartas e e-mails, solicitando a aprovação – nas redações originais, como aprovado pelo Senado – dos projetos de lei n°s 01/07 (reajuste igual ao do salário mínimo) 3.299/08 (fim do fator previdenciário) e 4.434/08 (recuperação das perdas).
Aos Senhores Deputados Federais pedimos de mantenham a independência, que votem com a consciência de servir ao país e à sua população, conferindo à Câmara a verdadeira grandeza do Parlamento, ao aprovar esses projetos, sem se subjugar às imposições do Planalto. Os 26,4 milhões de beneficiários da Seguridade, dentre eles os 16 milhões de aposentados e pensionistas do INSS, os trabalhadores na ativa e os familiares de todos eles saberão retribuir em 2010.
Setembro de 2009
- Federação dos Aposentados e Pensionistas de Minas Gerais – FAP/MG
- Confederação Brasileira de Aposentados e Pensionistas – COBAP
- Nova Central Sindical dos Trabalhadores – NCST
- Central dos Trabalhadores do Brasil – CTB
- Fórum Sindical dos Trabalhadores – FST
-recebida em 23/09/09
terça-feira, 22 de setembro de 2009
MOMENTO DECISIVO, por ADRIANO BENAYON
Adriano Benayon* - 25.08.2009
Há bastante tempo trato do colapso mundial e de suas seqüelas. Insisto nesse tema, porque se está diante de algo cuja dimensão implica um salto de qualidade, para baixo, na história do homem.
A tendência é instalar-se longo período de trevas, como na Europa no final da Idade Média, ou ainda pior: o império totalitário, que se quer implantar em definitivo, controlando os recursos tecnológicos e tudo mais. É, portanto, importante que se despertem consciências para evitar a supressão da humanidade, em andamento por conta desse desígnio da oligarquia concentradora.
Continuam em expansão imensas bolhas especulativas nos mercados financeiros mundiais, aumentadas por meio de mais emissões de moeda e de títulos que as dinastias oligárquicas forçam os governos a fazer.
Nada disso foi revertido. Bem ao contrário. Entretanto, políticos e grande parte da mídia, na Alemanha e na França comemoram o “próximo fim” da crise e a recuperação da economia, porque as estatísticas indicam ligeira elevação no PIB desses dois países, de abril a junho, além da alta das bolsas de valores.
A causa dessa alta, que infla mais as bolhas, é que parte dos trilhões de euros despejados nos bancos são aplicados nessas bolsas e nas de mercadorias, como mostrei em artigo deste mês, “Às vésperas do desenlace”.
Leia-se Ulrich Rippert, na Global Research, em 23.08.2009:
“Comparada com um ano atrás, a economia alemã apresenta declínio de 7%. Dentro de poucos meses, o esquema alemão de ‘dinheiro para sucatas’ vai expirar, acelerando a queda da indústria automobilística e de autopeças. As conseqüências para as indústrias siderúrgica, química e de máquinas ferramentas alemãs já se fizeram sentir.”
Mesmo na França e na Alemanha, onde - ao contrário do Reino Unido, da Espanha, da Itália e da maioria dos demais na Europa - o Estado ainda não se considera falido, as dívidas públicas crescem vertiginosamente. Há, pois, sérias dúvidas sobre a capacidade financeira e política dos governos de conceder novos pacotes trilionários para cobrir os rombos das antigas bolhas, não de todo rebentadas, e os das mais recentes.
É o que acontece em maior dimensão nos EUA, onde o Tesouro federal e os dos Estados têm dívidas incontroláveis.
Cito Bob Chapman (Global Research, 13.08.2009): “A bolha do FED em favor de Wall Street, vai precisar de, pelo menos, US$ 2 trilhões mais em 2010, apenas para que a economia não soçobre.”
Há liquidações em massa por fazer nos bancos e indenizações de seguros. O que o Tesouro dos EUA e o FED terão de meter nisso ultrapassa, em muito, os US$ 23,4 trilhões já despejados, usando dinheiro dos contribuintes e emitindo moeda e títulos públicos.
Aduz Chapman que o FED está em processo de monetizar US$ 2 trilhões em títulos do Tesouro e das agências públicas da área imobiliária, bem como obrigações em colateral, detidas por emprestadores. Diz mais: “É segredo o que o FED está pagando por esses papéis quase sem valor.”
Enquanto isso, órgãos da imprensa mundial transbordam de otimismo: O semanário Die Zeit, de Hamburgo: “Finalmente, a Recuperação!” O New York Times: “Banqueiros de Investimentos estabelecem tendência de alta.” E o Wall Street Journal: “Mais progresso no mundo dos negócios”
Rippert observa que essas manchetes lembram as de 1931, quando as bolsas haviam recuperado parte do perdido em 1929, embora, em 1931, a depressão estivesse em marcha. Como tenho afirmado, ela só terminou nos EUA em 1943, enquanto a maior parte do Mundo era devastada com a 2ª Guerra Mundial.
O emprego nos EUA galopa para o fundo, já se tendo acumulado mais de 9 milhões de novos desempregados nos últimos 30 meses. Na Europa a taxa de desemprego também cresceu e aumentará mais, com a dispensa dos que estão em horário reduzido.
BRASIL
Há poucos indicadores positivos e sempre, é claro, dentro dos absurdos estruturais que fazem vegetar na miséria ou em condições inadequadas a maioria da população, em afronta a seu belo potencial e aos maravilhosos recursos naturais.
Em dois anos, de 2007 a 2009, a taxa oficial de desemprego dobrou para quase 15%. O salário médio caiu mais de 20% desde 2005. De janeiro a julho de 2009, em comparação com 2008, as inadimplências de empresas cresceram 30%, e houve queda de 24% no valor das exportações e de 30% no das importações.
Como tenho dito, o Brasil não está imune à depressão mundial, que se aprofunda. Em 1º lugar, as empresas grandes e medias estão nas mãos de transnacionais sediadas no exterior, à exceção de poucas estatais, como a Petrobrás, e alguns conglomerados privados, ainda assim com participação estrangeira.
Em 2º lugar, nas exportações os bens intensivos de recursos naturais têm participação cada vez maior, já da ordem de 70%, no total. Isso denota a estrutura semicolonial do País, uma vez que no comércio mundial a participação desses bens é da ordem de 10%.
As commodities tiveram alta em 2009, em função da especulação com o dinheiro que sobra nos países importadores, cujos detentores não investem produtivamente, em face da depressão. Com o prosseguimento desta e a acumulação de estoques, especialmente na China, a demanda pelas commodities vai cair muito.
A China, que se tornou o principal importador do Brasil, também está às portas de crise, decorrente da especulação, tendo os lucros das empresas caído 30%, enquanto o índice da bolsa de Changai se elevou em 80%. Ademais, forma-se naquele país colapso imobiliário de grande intensidade.
Há, ainda, enormes perdas à vista com o iminente afundamento do dólar. Para China, Japão e outros, o montante dos títulos em dólar é catastrófico. No Brasil, eles formam a quase totalidade das reservas. Ora, sem contar o impacto proveniente da queda econômica naqueles países, isso é suficiente para tornar insustentável a posição das contas externas.
Mesmo antes de isso ocorrer, a economia brasileira vem sendo, há muito tempo, enfraquecida por se ter tornado a zona livre de saqueio que descrevi em numerosos artigos anteriores.
A estreiteza do campo de visão, por ideologia e pela mesquinhez da ótica partidária, faz que a maioria da opinião se divida em dois grupos: 1) os que imaginam estar tudo bem, acreditando que Lula faz o melhor possível, dadas as pressões do poder econômico (estrangeiro); 2) os que crêem que as coisas estão péssimas, em face de crise ética, fomentada pela mídia e por políticos “atucanados”, cujo próprio rabo fingem não enxergar. Pretendem fazer esquecer os profundos estragos estruturais infligidos ao País nos oito anos do deletério reinado de 1995 a 2002.
Uns e outros ignoram o baixo potencial de progresso e de criação de empregos sob a atual estrutura econômica, que o próprio BNDES torna ainda mais concentrada, financiando principalmente empresas transnacionais, além de poucas estatais e conglomerados privados, como mostrou M.A. Campanella, em artigo disponível em www.horadopovo.com.br.
Vai ser precisa perspectiva bem diferente para que o Brasil se salve do naufrágio global.
* Adriano Benayon é Doutor em Economia. Autor de “Globalização versus Desenvolvimento”, editora Escrituras. abenayon@brturbo.com.br
Publicado em A Nova Democracia, nº 57 – setembro de 2009 e recebido para publicação em 21/09/09
Há bastante tempo trato do colapso mundial e de suas seqüelas. Insisto nesse tema, porque se está diante de algo cuja dimensão implica um salto de qualidade, para baixo, na história do homem.
A tendência é instalar-se longo período de trevas, como na Europa no final da Idade Média, ou ainda pior: o império totalitário, que se quer implantar em definitivo, controlando os recursos tecnológicos e tudo mais. É, portanto, importante que se despertem consciências para evitar a supressão da humanidade, em andamento por conta desse desígnio da oligarquia concentradora.
Continuam em expansão imensas bolhas especulativas nos mercados financeiros mundiais, aumentadas por meio de mais emissões de moeda e de títulos que as dinastias oligárquicas forçam os governos a fazer.
Nada disso foi revertido. Bem ao contrário. Entretanto, políticos e grande parte da mídia, na Alemanha e na França comemoram o “próximo fim” da crise e a recuperação da economia, porque as estatísticas indicam ligeira elevação no PIB desses dois países, de abril a junho, além da alta das bolsas de valores.
A causa dessa alta, que infla mais as bolhas, é que parte dos trilhões de euros despejados nos bancos são aplicados nessas bolsas e nas de mercadorias, como mostrei em artigo deste mês, “Às vésperas do desenlace”.
Leia-se Ulrich Rippert, na Global Research, em 23.08.2009:
“Comparada com um ano atrás, a economia alemã apresenta declínio de 7%. Dentro de poucos meses, o esquema alemão de ‘dinheiro para sucatas’ vai expirar, acelerando a queda da indústria automobilística e de autopeças. As conseqüências para as indústrias siderúrgica, química e de máquinas ferramentas alemãs já se fizeram sentir.”
Mesmo na França e na Alemanha, onde - ao contrário do Reino Unido, da Espanha, da Itália e da maioria dos demais na Europa - o Estado ainda não se considera falido, as dívidas públicas crescem vertiginosamente. Há, pois, sérias dúvidas sobre a capacidade financeira e política dos governos de conceder novos pacotes trilionários para cobrir os rombos das antigas bolhas, não de todo rebentadas, e os das mais recentes.
É o que acontece em maior dimensão nos EUA, onde o Tesouro federal e os dos Estados têm dívidas incontroláveis.
Cito Bob Chapman (Global Research, 13.08.2009): “A bolha do FED em favor de Wall Street, vai precisar de, pelo menos, US$ 2 trilhões mais em 2010, apenas para que a economia não soçobre.”
Há liquidações em massa por fazer nos bancos e indenizações de seguros. O que o Tesouro dos EUA e o FED terão de meter nisso ultrapassa, em muito, os US$ 23,4 trilhões já despejados, usando dinheiro dos contribuintes e emitindo moeda e títulos públicos.
Aduz Chapman que o FED está em processo de monetizar US$ 2 trilhões em títulos do Tesouro e das agências públicas da área imobiliária, bem como obrigações em colateral, detidas por emprestadores. Diz mais: “É segredo o que o FED está pagando por esses papéis quase sem valor.”
Enquanto isso, órgãos da imprensa mundial transbordam de otimismo: O semanário Die Zeit, de Hamburgo: “Finalmente, a Recuperação!” O New York Times: “Banqueiros de Investimentos estabelecem tendência de alta.” E o Wall Street Journal: “Mais progresso no mundo dos negócios”
Rippert observa que essas manchetes lembram as de 1931, quando as bolsas haviam recuperado parte do perdido em 1929, embora, em 1931, a depressão estivesse em marcha. Como tenho afirmado, ela só terminou nos EUA em 1943, enquanto a maior parte do Mundo era devastada com a 2ª Guerra Mundial.
O emprego nos EUA galopa para o fundo, já se tendo acumulado mais de 9 milhões de novos desempregados nos últimos 30 meses. Na Europa a taxa de desemprego também cresceu e aumentará mais, com a dispensa dos que estão em horário reduzido.
BRASIL
Há poucos indicadores positivos e sempre, é claro, dentro dos absurdos estruturais que fazem vegetar na miséria ou em condições inadequadas a maioria da população, em afronta a seu belo potencial e aos maravilhosos recursos naturais.
Em dois anos, de 2007 a 2009, a taxa oficial de desemprego dobrou para quase 15%. O salário médio caiu mais de 20% desde 2005. De janeiro a julho de 2009, em comparação com 2008, as inadimplências de empresas cresceram 30%, e houve queda de 24% no valor das exportações e de 30% no das importações.
Como tenho dito, o Brasil não está imune à depressão mundial, que se aprofunda. Em 1º lugar, as empresas grandes e medias estão nas mãos de transnacionais sediadas no exterior, à exceção de poucas estatais, como a Petrobrás, e alguns conglomerados privados, ainda assim com participação estrangeira.
Em 2º lugar, nas exportações os bens intensivos de recursos naturais têm participação cada vez maior, já da ordem de 70%, no total. Isso denota a estrutura semicolonial do País, uma vez que no comércio mundial a participação desses bens é da ordem de 10%.
As commodities tiveram alta em 2009, em função da especulação com o dinheiro que sobra nos países importadores, cujos detentores não investem produtivamente, em face da depressão. Com o prosseguimento desta e a acumulação de estoques, especialmente na China, a demanda pelas commodities vai cair muito.
A China, que se tornou o principal importador do Brasil, também está às portas de crise, decorrente da especulação, tendo os lucros das empresas caído 30%, enquanto o índice da bolsa de Changai se elevou em 80%. Ademais, forma-se naquele país colapso imobiliário de grande intensidade.
Há, ainda, enormes perdas à vista com o iminente afundamento do dólar. Para China, Japão e outros, o montante dos títulos em dólar é catastrófico. No Brasil, eles formam a quase totalidade das reservas. Ora, sem contar o impacto proveniente da queda econômica naqueles países, isso é suficiente para tornar insustentável a posição das contas externas.
Mesmo antes de isso ocorrer, a economia brasileira vem sendo, há muito tempo, enfraquecida por se ter tornado a zona livre de saqueio que descrevi em numerosos artigos anteriores.
A estreiteza do campo de visão, por ideologia e pela mesquinhez da ótica partidária, faz que a maioria da opinião se divida em dois grupos: 1) os que imaginam estar tudo bem, acreditando que Lula faz o melhor possível, dadas as pressões do poder econômico (estrangeiro); 2) os que crêem que as coisas estão péssimas, em face de crise ética, fomentada pela mídia e por políticos “atucanados”, cujo próprio rabo fingem não enxergar. Pretendem fazer esquecer os profundos estragos estruturais infligidos ao País nos oito anos do deletério reinado de 1995 a 2002.
Uns e outros ignoram o baixo potencial de progresso e de criação de empregos sob a atual estrutura econômica, que o próprio BNDES torna ainda mais concentrada, financiando principalmente empresas transnacionais, além de poucas estatais e conglomerados privados, como mostrou M.A. Campanella, em artigo disponível em www.horadopovo.com.br.
Vai ser precisa perspectiva bem diferente para que o Brasil se salve do naufrágio global.
* Adriano Benayon é Doutor em Economia. Autor de “Globalização versus Desenvolvimento”, editora Escrituras. abenayon@brturbo.com.br
Publicado em A Nova Democracia, nº 57 – setembro de 2009 e recebido para publicação em 21/09/09
segunda-feira, 21 de setembro de 2009
Só faltaram dizer que a impressão do voto aprovada é para 2014, por Pedro Porfírio
Mais uma vez estão vendendo gato por lebre para o povo desavisado
"Por que gastar milhões de dólares em uma campanha eleitoral se você pode fraudar uma eleição por menos de 100 mil dólares?"J. Alex Halderman, pesquisador da Universidade de Michigan, sobre as urnas que não imprimem votos, usadas em alguns Estados norte-americanos.
Enquanto aprovam a impressão do voto no Brasil para 2014, na Venezuela, esta providência já vigora desde 2004, numa boa.
Francamente, como dizia o velho Briza, cada dia estou mais perplexo com a mistificação que se faz numa associação orquestrada entre os podres poderes e essa mídia de manipuladores e incompetentes.Neste exato momento, nossos parceiros estão expondo pela internet a sofreguidão pela defesa do voto impresso, tal como foi aprovado na casuística reforma eleitoral já encaminhada pela Câmara à sanção do presidente Luiz Inácio.Passa-se a sensação de uma grande vitória e a idéia de que já nas próximas eleições as urnas blindadas contra auditoria já poderão ser desbaratadas se o chefe do governo preservar o teor do artigo 5º da nova lei.Mais um falso confronto Estabeleceu-se um debate com pronunciamentos exaltados de parte à parte. Os ministros do TSE, patronos da urna blindada, chegaram ao cúmulo de dizer que a impressão do voto seria um tenebroso retrocesso. Na defesa de sua intransigência inexplicável a olho nu, dizem que há em vista outros procedimentos, como o voto biométrico, que, pelo andar da carruagem, estará implantado até 2020.Os rivais cantam em prosa e verso as virtudes do voto impresso, tal como consta do projeto enviado ao Planalto.A mim, que não sou mistificador, nem boboca, esse falso confronto causa náuseas. Porque se toda a "mini-reforma" aprovada terá validade no ano que vem, dentro de 12 meses, o artigo do voto impresso É PARA VALER SOMENTE NAS ELEIÇÕES DE 2014. Nem no pleito municipal de 2012 será possível dar uma espiadela na caixa preta que esconde o caminho percorrido por disquetes entre o nosso voto e o centro de computação.Por que ninguém diz com todas as letras que estão vendendo ilusões?< /FONT> Vou te contar. Apesar da encenação do ministro Nelson Jobim, o impune adulterador da Constituição de 1988, ministro de FHC, e, por suas mãos, ministro do Supremo; agora eminência dourada do governo Lula, o bravo presidente certamente dará uma de defensor da transparência e manterá o "polêmico" artigo do voto impresso em 2014. Se, ao contrário, ele vetar, o que duvido pelos meus cabelos brancos, é porque a encenação também terá um plano B.Esse filme eu já viVocê não sabe, porque realmente recebe informações de relance, com prazo mínimo de validade, mas o voto impresso já havia sido aprovado pelo Congresso através da Lei nº 10.408, sancionada pelo presidente Fernando Henrique em 10 de janeiro de 2002 e publicada no Diário Oficial da União no dia seguinte.Essa Lei, fruto de um esforço gigantesco de Leonel Brizola, a maior vítima do jogo perverso em que a urna eletrôni ca é parte, previa com toda clareza em seu texto:"Art. 1 - O art. 59 da Lei no 9.504, de 30 de setembro de 1997, passa a vigorar acrescido dos §§ 4o a 8o, com a seguinte redação: Art. 59§ 4o - A urna eletrônica disporá de mecanismo que permita a impressão do voto, sua conferência visual e depósito automático, sem contato manual, em local previamente lacrado, após conferência pelo eleitor. § 5o - Se, ao conferir o voto impresso, o eleitor não concordar com os dados nele registrados, poderá cancelá-lo e repetir a votação pelo sistema eletrônico. Caso reitere a discordância entre os dados da tela da urna eletrônica e o voto impresso, seu voto será colhido em separado e apurado na forma que for regulamentada pelo Tribunal Superior Eleitoral, observado, no que couber, o disposto no art. 82 desta Lei. § 6o - Na véspera do dia da votação, o juiz eleitoral, em audiência pública, sorteará três por cento das urnas de cada zona eleitoral, respeitado o limite mínimo de três urnas por Município, que deverão ter seus votos impressos contados e conferidos com os resultados apresentados pelo respectivo boletim de urna". Apesar de redigida sob pressão pessoal do mesmo sr. Nelson Jobim, então no Supremo e no TSE, a Lei não deixava dúvida quanto ao voto impresso. O pacto que revogou o voto impressoMas foi só o príncipe operário assumir, um ano depois, para que se estabelecesse um pacto, envolvendo todos os partidos, destinado à revogação do voto impresso. Nessa nova articulação casuística, destacou-se o então presidente do TSE, ministro Sepúlveda Pertence, indicado ao Supremo por José Sarney, de quem hoje é advogado, enquanto preside a simbólica Comissão de Ética Pública do Poder Executivo.Para que a Lei de revogação do voto impresso fosse aprovada, o Congresso adotou procedimentos de guerra, como detalha o site www.votoseguro.org. Com o projeto assinado pelo senador tucano Eduardo Azeredo, o mesmo da paradinha do Marcos Valério, a matéria bateu todos os recordes em agilidade e presteza: aprovado pelo Congresso às sete e meia da noite do dia 1 de outubro de 2003, o projeto foi sancionado como a Lei 10.740/03 pelo presidente Luiz Inácio na mesma noite, garantindo, por questão de horas, que as eleições municipais de 2004 escapassem de qualquer auditoria.Quer dizer: se uma Lei moralizadora caiu em desuso em menos de dois anos, antes mesmo de ser usada, i magine esse artigo 5º tão badalado, que tem cinco anos para sofrer nova emasculação, conforme os ventos e trovoadas das temporadas vindouras.Estamos, pois, diante de mais uma "batalha de Itararé", na qual as pencas de picaretas que pululam na Câmara Federal querem aparecer como mocinhos, defensores da transparência e da votação fiscalizável.Se o voto impresso é tão necessário, como qualquer bronco sabe, por que deixar para adotá-lo só daqui a cinco anos?A verdade nua e crua é que essa representação política que temos é altamente suspeita. E ninguém me garante que haja lisura no processo de votação, que começa a ser violado quando mesários são mantidos de eleição para eleição e se sentem à vontade para votar no lugar dos ausentes, principalmente nas periferias.Quer saber mais? Voltarei ao assunto.
- recebido em 21/09/09 e publicado no www.porfiriolivre.com
"Por que gastar milhões de dólares em uma campanha eleitoral se você pode fraudar uma eleição por menos de 100 mil dólares?"J. Alex Halderman, pesquisador da Universidade de Michigan, sobre as urnas que não imprimem votos, usadas em alguns Estados norte-americanos.
Enquanto aprovam a impressão do voto no Brasil para 2014, na Venezuela, esta providência já vigora desde 2004, numa boa.
Francamente, como dizia o velho Briza, cada dia estou mais perplexo com a mistificação que se faz numa associação orquestrada entre os podres poderes e essa mídia de manipuladores e incompetentes.Neste exato momento, nossos parceiros estão expondo pela internet a sofreguidão pela defesa do voto impresso, tal como foi aprovado na casuística reforma eleitoral já encaminhada pela Câmara à sanção do presidente Luiz Inácio.Passa-se a sensação de uma grande vitória e a idéia de que já nas próximas eleições as urnas blindadas contra auditoria já poderão ser desbaratadas se o chefe do governo preservar o teor do artigo 5º da nova lei.Mais um falso confronto Estabeleceu-se um debate com pronunciamentos exaltados de parte à parte. Os ministros do TSE, patronos da urna blindada, chegaram ao cúmulo de dizer que a impressão do voto seria um tenebroso retrocesso. Na defesa de sua intransigência inexplicável a olho nu, dizem que há em vista outros procedimentos, como o voto biométrico, que, pelo andar da carruagem, estará implantado até 2020.Os rivais cantam em prosa e verso as virtudes do voto impresso, tal como consta do projeto enviado ao Planalto.A mim, que não sou mistificador, nem boboca, esse falso confronto causa náuseas. Porque se toda a "mini-reforma" aprovada terá validade no ano que vem, dentro de 12 meses, o artigo do voto impresso É PARA VALER SOMENTE NAS ELEIÇÕES DE 2014. Nem no pleito municipal de 2012 será possível dar uma espiadela na caixa preta que esconde o caminho percorrido por disquetes entre o nosso voto e o centro de computação.Por que ninguém diz com todas as letras que estão vendendo ilusões?< /FONT> Vou te contar. Apesar da encenação do ministro Nelson Jobim, o impune adulterador da Constituição de 1988, ministro de FHC, e, por suas mãos, ministro do Supremo; agora eminência dourada do governo Lula, o bravo presidente certamente dará uma de defensor da transparência e manterá o "polêmico" artigo do voto impresso em 2014. Se, ao contrário, ele vetar, o que duvido pelos meus cabelos brancos, é porque a encenação também terá um plano B.Esse filme eu já viVocê não sabe, porque realmente recebe informações de relance, com prazo mínimo de validade, mas o voto impresso já havia sido aprovado pelo Congresso através da Lei nº 10.408, sancionada pelo presidente Fernando Henrique em 10 de janeiro de 2002 e publicada no Diário Oficial da União no dia seguinte.Essa Lei, fruto de um esforço gigantesco de Leonel Brizola, a maior vítima do jogo perverso em que a urna eletrôni ca é parte, previa com toda clareza em seu texto:"Art. 1 - O art. 59 da Lei no 9.504, de 30 de setembro de 1997, passa a vigorar acrescido dos §§ 4o a 8o, com a seguinte redação: Art. 59§ 4o - A urna eletrônica disporá de mecanismo que permita a impressão do voto, sua conferência visual e depósito automático, sem contato manual, em local previamente lacrado, após conferência pelo eleitor. § 5o - Se, ao conferir o voto impresso, o eleitor não concordar com os dados nele registrados, poderá cancelá-lo e repetir a votação pelo sistema eletrônico. Caso reitere a discordância entre os dados da tela da urna eletrônica e o voto impresso, seu voto será colhido em separado e apurado na forma que for regulamentada pelo Tribunal Superior Eleitoral, observado, no que couber, o disposto no art. 82 desta Lei. § 6o - Na véspera do dia da votação, o juiz eleitoral, em audiência pública, sorteará três por cento das urnas de cada zona eleitoral, respeitado o limite mínimo de três urnas por Município, que deverão ter seus votos impressos contados e conferidos com os resultados apresentados pelo respectivo boletim de urna". Apesar de redigida sob pressão pessoal do mesmo sr. Nelson Jobim, então no Supremo e no TSE, a Lei não deixava dúvida quanto ao voto impresso. O pacto que revogou o voto impressoMas foi só o príncipe operário assumir, um ano depois, para que se estabelecesse um pacto, envolvendo todos os partidos, destinado à revogação do voto impresso. Nessa nova articulação casuística, destacou-se o então presidente do TSE, ministro Sepúlveda Pertence, indicado ao Supremo por José Sarney, de quem hoje é advogado, enquanto preside a simbólica Comissão de Ética Pública do Poder Executivo.Para que a Lei de revogação do voto impresso fosse aprovada, o Congresso adotou procedimentos de guerra, como detalha o site www.votoseguro.org. Com o projeto assinado pelo senador tucano Eduardo Azeredo, o mesmo da paradinha do Marcos Valério, a matéria bateu todos os recordes em agilidade e presteza: aprovado pelo Congresso às sete e meia da noite do dia 1 de outubro de 2003, o projeto foi sancionado como a Lei 10.740/03 pelo presidente Luiz Inácio na mesma noite, garantindo, por questão de horas, que as eleições municipais de 2004 escapassem de qualquer auditoria.Quer dizer: se uma Lei moralizadora caiu em desuso em menos de dois anos, antes mesmo de ser usada, i magine esse artigo 5º tão badalado, que tem cinco anos para sofrer nova emasculação, conforme os ventos e trovoadas das temporadas vindouras.Estamos, pois, diante de mais uma "batalha de Itararé", na qual as pencas de picaretas que pululam na Câmara Federal querem aparecer como mocinhos, defensores da transparência e da votação fiscalizável.Se o voto impresso é tão necessário, como qualquer bronco sabe, por que deixar para adotá-lo só daqui a cinco anos?A verdade nua e crua é que essa representação política que temos é altamente suspeita. E ninguém me garante que haja lisura no processo de votação, que começa a ser violado quando mesários são mantidos de eleição para eleição e se sentem à vontade para votar no lugar dos ausentes, principalmente nas periferias.Quer saber mais? Voltarei ao assunto.
- recebido em 21/09/09 e publicado no www.porfiriolivre.com
domingo, 13 de setembro de 2009
DA GUERRA, texto atribuído a JOSÉ LUÍS FIORI.
Entre 1495 e 1975, as Grandes Potências estiveram em guerra durante 75% do tempo, começando uma nova guerra a cada sete ou oito anos. Mesmo nos anos mais pacíficos deste período, entre 1816 e 1913, estas potências fizeram cerca de 100 guerras coloniais. E ao contrário das expectativas, a cada novo século, as guerras foram mais intensas e violentas do que no século anterior. (J. Levy, “War in the modern Great Power System”, Ky Lexington, 1983) Por isso, se poder dizer que as guerras foram a principal atividade dos estados nacionais europeus, durante seus cinco séculos de existência, e agora de novo, o século XXI já começou sob o signo das armas. Mas apesar disto, segue sendo um tabu falar e analisar objetivamente o papel das guerras na formação, na evolução e no futuro do sistema inter-estatal capitalista, que foi “inventado” pelos europeus, nos séculos XVI e XVII, e só se transformou num fenômeno universal, no século XX. Talvez, porque seja muito doloroso aceitar que as guerras não são m fenômeno excepcional, nem decorrem de uma “necessidade econômica”. Ou porque seja muito difícil de entender que elas seguirão existindo, mesmo que não ocorram enfrentamentos atômicos entre as Grandes Potências, porque elas não precisam ser travadas para cumprir seu “papel” dentro do sistema inter-estatal. Basta que sejam planejadas de forma complementar e competitiva.
A primeira vista, tudo isto parece meio absurdo e paradoxal. Mas tudo fica mais claro quando se olha para o começo desta história, e se entende que o sistema mundial em que vivemos, foi uma conquista progressiva dos primeiros estados nacionais europeus. E desde os seus primeiros passos, este sistema nunca mais deixou de se expandir, “liderado” pelo crescimento competitivo e imperial de suas Grandes Potências, que lutam permanentemente para manter ou avançar sua posição relativa dentro do sistema. Por isto, tem razão o cientista político norte-americano, John Mearsheimer, quando diz que “as Grandes Potências têm um comportamento agressivo não porque elas queiram, mas porque elas têm que buscar acumular mais poder se quiserem maximizar suas probabilidades de sobrevivência, porque o sistema internacional cria incentivos poderosos para que os estados estejam sempre procurando oportunidades de ganhar mais poder às custas dos seus rivais...”. (Mearsheimer, “The tragedy of the great powers”, 2001: 21).
Neste processo competitivo, a guerra, ou a ameaça da guerra, foi o principal instrumento estratégico utilizado pelos estados nacionais, para acumular poder e definir a hierarquia mundial. E as potencias vencedoras - que se transformaram em “líderes” do sistema - foram as que conseguiram conquistar e manter o controle monopólico das “tecnologias sensíveis”, de uso militar. Por sua vez, esta competição pela ponta tecnológica, e pelo controle monopólico dos demais recursos bélicos, deu origem à uma dinâmica automático e progressivo, de preparação contínua para as guerras. Numa disputa que aponta todo o tempo, na direção de um império único e universal. Mas, paradoxalmente, este império não poderá ser alcançado sem que o sistema mundial perca sua capacidade conjunta de seguir se expandindo. Por que? Porque a vitória e a constituição de um império mundial seria sempre a vitória de um estado nacional específico. Daquele estado que fosse capaz de impor sua vontade e monopolizar o poder, até o limite do desaparecimento dos seus competidores. Se isto acontecesse, entretanto, acabaria a competição entre os estados, e neste caso, os estados não teriam como seguir aumentando o seu próprio poder. Ou seja, neste sistema inter-estatal inventado pelos europeus, a existência de adversários é indispensável para que haja expansão e acumulação de poder, e a preparação contínua para a guerra é o fator que ordena o próprio sistema. Assim mesmo, como a “potência líder” também precisa seguir acumulando poder, para manter sua posição relativa, ela mesma acaba atropelando as instituições e os acordos internacionais que ajudou a criar num momento anterior Ela é quem tem maior poder relativo dentro do sistema, e por isto, ela é que acaba sendo, quase sempre, a grande desestabilizadora de qualquer ordem internacional estabelecida.
Agora bem, a preparação para a guerra, e as próprias guerras, nunca impediram a complementaridade econômica e a integração comercial e financeira, entre todos os estados envolvidos nos conflitos. Pelo contrário, a mutua dependência econômica sempre foi uma peça essencial da própria competição. Às vezes, predominou o conflito, às vezes a complementaridade, mas foi esta “dialética” que se transformou no verdadeiro motor político-econômico do sistema inter-estatal capitalista, e no grande segredo da vitória européia, sobre o resto do mundo, a partir do século XVII.
Entre 1650 e 1950, a Inglaterra participou de 110 guerras aproximadamente, dentro e fora da Europa, ou seja, em média, uma à cada três anos E entre 1783 e 1991, os Estados Unidos participaram de cerca de 80 guerras, dentro e fora da América, ou seja, em média, também, uma a cada três anos. ((M. Coldfelter, “Warfare and armed conflicts”, MacFarland, Londres, 2002). Como resultado, neste início do século XXI, os Estados Unidos tem acordos militares com cerca de 130 países, ao redor do mundo, e mantém mais de 700 bases militares, fora do seu território. E assim mesmo, devem seguir se expandindo - independente de qual seja o seu governo - sem precisar ferir necessariamente o Direito Internacional, e sem precisar dar explicações a ninguém. Por isto, soa absolutamente cômica e desnecessária a justificativa de que as novas bases militares dos EUA, na Colômbia, tem a ver com o combate ao narcotráfico e a guerrilha local, assim como os argumentos que associam a instalação do escudo anti-mísseis dos EUA, na fronteira com a Rússia, com o controle e bloqueio de foguetes iranianos. Como soa ridícula, neste contexto, a evocação do “princípio básico da não ingerência”, na defesa das decisões colombianas, polacas ou checas. Neste “jogo” não há limites e por mais lamentável que seja, os “neutros” são irrelevantes ou sucumbem, e só lhes restam duas alternativas, para os que não aceitam aliar-se ou submeter-se à potencia expansiva: no caso dos mais fracos, protestar; e no caso dos demais, defender-se.
Setembro de 2009 _ recebido de Manoel Soriano Neto em 12/09/09, sem ressalva quanto à publicação.
A primeira vista, tudo isto parece meio absurdo e paradoxal. Mas tudo fica mais claro quando se olha para o começo desta história, e se entende que o sistema mundial em que vivemos, foi uma conquista progressiva dos primeiros estados nacionais europeus. E desde os seus primeiros passos, este sistema nunca mais deixou de se expandir, “liderado” pelo crescimento competitivo e imperial de suas Grandes Potências, que lutam permanentemente para manter ou avançar sua posição relativa dentro do sistema. Por isto, tem razão o cientista político norte-americano, John Mearsheimer, quando diz que “as Grandes Potências têm um comportamento agressivo não porque elas queiram, mas porque elas têm que buscar acumular mais poder se quiserem maximizar suas probabilidades de sobrevivência, porque o sistema internacional cria incentivos poderosos para que os estados estejam sempre procurando oportunidades de ganhar mais poder às custas dos seus rivais...”. (Mearsheimer, “The tragedy of the great powers”, 2001: 21).
Neste processo competitivo, a guerra, ou a ameaça da guerra, foi o principal instrumento estratégico utilizado pelos estados nacionais, para acumular poder e definir a hierarquia mundial. E as potencias vencedoras - que se transformaram em “líderes” do sistema - foram as que conseguiram conquistar e manter o controle monopólico das “tecnologias sensíveis”, de uso militar. Por sua vez, esta competição pela ponta tecnológica, e pelo controle monopólico dos demais recursos bélicos, deu origem à uma dinâmica automático e progressivo, de preparação contínua para as guerras. Numa disputa que aponta todo o tempo, na direção de um império único e universal. Mas, paradoxalmente, este império não poderá ser alcançado sem que o sistema mundial perca sua capacidade conjunta de seguir se expandindo. Por que? Porque a vitória e a constituição de um império mundial seria sempre a vitória de um estado nacional específico. Daquele estado que fosse capaz de impor sua vontade e monopolizar o poder, até o limite do desaparecimento dos seus competidores. Se isto acontecesse, entretanto, acabaria a competição entre os estados, e neste caso, os estados não teriam como seguir aumentando o seu próprio poder. Ou seja, neste sistema inter-estatal inventado pelos europeus, a existência de adversários é indispensável para que haja expansão e acumulação de poder, e a preparação contínua para a guerra é o fator que ordena o próprio sistema. Assim mesmo, como a “potência líder” também precisa seguir acumulando poder, para manter sua posição relativa, ela mesma acaba atropelando as instituições e os acordos internacionais que ajudou a criar num momento anterior Ela é quem tem maior poder relativo dentro do sistema, e por isto, ela é que acaba sendo, quase sempre, a grande desestabilizadora de qualquer ordem internacional estabelecida.
Agora bem, a preparação para a guerra, e as próprias guerras, nunca impediram a complementaridade econômica e a integração comercial e financeira, entre todos os estados envolvidos nos conflitos. Pelo contrário, a mutua dependência econômica sempre foi uma peça essencial da própria competição. Às vezes, predominou o conflito, às vezes a complementaridade, mas foi esta “dialética” que se transformou no verdadeiro motor político-econômico do sistema inter-estatal capitalista, e no grande segredo da vitória européia, sobre o resto do mundo, a partir do século XVII.
Entre 1650 e 1950, a Inglaterra participou de 110 guerras aproximadamente, dentro e fora da Europa, ou seja, em média, uma à cada três anos E entre 1783 e 1991, os Estados Unidos participaram de cerca de 80 guerras, dentro e fora da América, ou seja, em média, também, uma a cada três anos. ((M. Coldfelter, “Warfare and armed conflicts”, MacFarland, Londres, 2002). Como resultado, neste início do século XXI, os Estados Unidos tem acordos militares com cerca de 130 países, ao redor do mundo, e mantém mais de 700 bases militares, fora do seu território. E assim mesmo, devem seguir se expandindo - independente de qual seja o seu governo - sem precisar ferir necessariamente o Direito Internacional, e sem precisar dar explicações a ninguém. Por isto, soa absolutamente cômica e desnecessária a justificativa de que as novas bases militares dos EUA, na Colômbia, tem a ver com o combate ao narcotráfico e a guerrilha local, assim como os argumentos que associam a instalação do escudo anti-mísseis dos EUA, na fronteira com a Rússia, com o controle e bloqueio de foguetes iranianos. Como soa ridícula, neste contexto, a evocação do “princípio básico da não ingerência”, na defesa das decisões colombianas, polacas ou checas. Neste “jogo” não há limites e por mais lamentável que seja, os “neutros” são irrelevantes ou sucumbem, e só lhes restam duas alternativas, para os que não aceitam aliar-se ou submeter-se à potencia expansiva: no caso dos mais fracos, protestar; e no caso dos demais, defender-se.
Setembro de 2009 _ recebido de Manoel Soriano Neto em 12/09/09, sem ressalva quanto à publicação.
quinta-feira, 10 de setembro de 2009
Entrevista de Pedro Estevam Serrano , para blog do Zé Dirceu
No Brasil dois tribunais: um do Estado, outro da mídia
A conclusão é do advogado Pedro Estevam Serrano a respeito da forte influência da mídia no âmbito do direito e das decisões comunitárias no país. Com sua experiência de mais de 20 anos dedicados ao direito constitucional e administrativo, Serrano constata um tribunal lento, desatento e burocrático em casos de pouca repercussão pública e uma realidade completamente inversa ante os casos de maior repercussão jornalística.Para este professor de Direito forense na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), hoje, não é mais possível desconsiderar a influência da mídia nas decisões do Judiciário, uma realidade que permeia inclusive o conteúdo ensinado aos futuros advogados do país. Segundo Serrano "a mídia constrói símbolos, ergue e destrói personagens e interfere diretamente nas decisões comunitárias. Hoje, é mais relevante o que pensa o dono de um jornal do que qualquer parlamentar". Uma das razões pelas quais defende a responsabilização dos donos dos meios de comunicação é que eles tratam de conteúdo de interesse público, e não privado.De acordo com o advogado é urgente a necessidade da adoção de novos procedimentos para a produção da notícia. É a forma, justifica, de combater o comportamento "imperial e aristocrático dos donos dos meios de comunicação". Serrano defende a adoção de mecanismos próprios do Direito na elaboração de uma lei de imprensa realmente democrática.Sua proposta é de estabelecer procedimentos não sobre o conteúdo - essência da liberdade de imprensa - mas sobre a forma como a notícia é produzida, incluindo o direito do contraditório já na publicação da informação.
[ Zé Dirceu ] Como você avalia a mídia brasileira hoje? Podemos considerá-la um quarto poder?
[ Pedro Serrano ] Temos duas dimensões do que é considerado mídia. Hoje, há um processo de comunicação que domina todos os ambientes da vida humana. Na realidade, a natureza do capitalismo mudou. Atualmente, ele é mais uma máquina produtora de desejos do que de mercadorias, o chamado fetiche da mercadoria virou o produto principal, muito além da própria aquisição. Um autor chamado Gilles Lipovetsky afirma que a compra e as relações de consumo estão muito mais ligadas à experiência do que ao consumo material. Talvez, nunca em sua história, a humanidade tenha experimentado um período de tanta radicalização do poder do simbólico e da comunicação. Neste quadro, evidentemente, a mídia torna-se um poder social.Há também a ampliação da caracterização clássica do poder político, o uso da força física num âmbito legítimo e institucional. Hoje, o poder político implica mais do que o uso da força física, trata-se de qualquer tipo de condicionamento da vida humana e os mais diversos ambientes da vida estão permeados por esse tipo de questão.No Brasil, isso não é diferente. Quando você considera o conceito da mídia, no sentido de quem veicula notícias, o poder que ela tem sobre a vida social e comunitária das pessoas é imenso. A mídia constrói símbolos, ergue e destrói personagens e interfere diretamente nas decisões comunitárias. Hoje, é mais relevante o que pensa o dono de um jornal a qualquer parlamentar. Ele tem mais poder de decisões que interferem diretamente na vida das pessoas.Sem dúvidas, a mídia é um poder. Por isso, defendo a adoção de mecanismos próprios do Direito, ambiente que desde a Revolução Francesa vem acumulando conhecimento e portas de procedimentos em relação ao poder.Precisamos publicizaras regras de mídia.
[ Zé Dirceu ] Você acha que a adoção de uma lei de imprensa moderna como vigora nos países democráticos faz-se necessária também no Brasil?
[ Pedro Serrano ] Sim. Nós precisamos publicizar as regras da mídia. Existe uma tendência dos jornalistas a acreditar na informação imparcial, a notícia imparcial. Uma idéia que não se sustenta frente a menor observação empírica. A própria escolha do que é um fato jornalístico é uma escolha de valor. Por outro lado, isso não significa que a imparcialidade é tão inatingível que tanto faz. A busca pela imparcialidade não é um fato cientificamente apurável e não se atinge através do discurso científico, mas ela pode ser um valor ético. Óbvio que sujeita à toda subjetividade de qualquer valor, mas, sem dúvidas, é um valor ético.Notícia e imparcialidade nunca estarão juntas, mas são como duas grandes paralelas, podem estar a centímetros ou a metros, quilômetros de distância. A regulação da produção da notícia deve se dar através de mecanismos de natureza ética. Devemos entender a produção da notícia não como um produto de uma condição necessária ou de algo científica ou parcialmente verificado, mas como produto de um juízo ético.O segmento de conhecimento humano que mais tem lidado com controlar os poderes através de valores éticos é o direito público. É um fenômeno contemporâneo, você como advogado sabe, a interpenetração entre os direitos público e privado. Por exemplo, ambientes societários adotam leis do direito público; o controle tarifário é feito por concorrência, um controle típico do direito das relações privadas. Você tem uma interpenetração entre os dois fenômenos.Eu proponho que certos procedimentos próprios do Estado democrático sejam trazidos para a produção da notícia, com vistas à defesa de certos valores. Veja que os princípios jurídicos sempre incidem em tensão, jamais sozinhos, um colide com o outro. É o que ocorre nesse caso. A defesa de uma natureza democrática na produção da notícia se dá nessa tensão.Grosso modo seria a preservação da identidade de um lado, o direito de informar e de ser informado. Aí a distinção entre essa legislação democrática e uma legislação autoritária que iria contra essa tensão, servindo ao interesse do Estado. Não ponho nessa relação, em nenhum momento, o interesse do Estado como um interesse que deva ser considerado em uma lei de imprensa, até porque o governo geralmente é o principal investigado. Agora, você tem o direito da sociedade a se informar.Se informar não é sóter acesso à notíciaSe informar não é só ter acesso à notícia, mas que essa esta seja produzida por um procedimento que garanta o valor ético da imparcialidade. Creio que a sociedade - não os jornalistas, nem os donos de jornais – deva regular esses procedimentos da produção de notícia através de uma lei. Portanto, uma lei democrática de imprensa não vai discutir conteúdos, mas procedimentos. Ou seja, quais são os procedimentos que devem ser adotados na elaboração de uma notícia.Por exemplo, o outro lado não deve ser uma postura ética do jornal, mas uma válvula jurídica imposta. Quais os critérios desse outro lado? As razões que levam uma editora a negar a veiculação de uma notícia produzida por um jornalista precisam ser motivadas, o princípio da motivação. O dono de jornal está lidando com um assunto de interesse público – aliás, é esse o argumento deles para não serem censurados, o que é correto. Mas se estão realizando uma atividade de interesse público, precisam adotar um procedimento estabelecido por lei para negar, por exemplo, a veiculação da notícia ou para formatar uma notícia de dado modo. Isso tudo precisa ser justificado.Esse tipo de experimentação, o Estado já tem através do direito público com as licitações, os procedimentos de concurso, os atos administrativos etc. Trazer esse tipo de modo procedimental do direito privado para o âmbito de imprensa, talvez seja o mais adequado. Isso atende não só ao interesse da sociedade mas também o do jornalista. Na hora em que a produção dele for negada, o editor tem que justificar. É uma forma de atendermos também o direito das pessoas que foram acusadas e tem o direito de produzir a sua defesa.Como é feito hoje? Vai o jornalista do próprio jornal entrevistar o acusado. Você tem que dar o espaço de, para se a pessoa quiser, ter o seu assessor de imprensa. Que ele produza aquela notícia na formação técnica adequada e ocupe aquele espaço no jornal. Ou seja, temos que aperfeiçoar esses processos que são imperiais. O que vivemos hoje em relação à imprensa é muito semelhante ao período da aristocracia onde havia um imperador que era um governante absoluto do Estado, que não reconhecia na sociedade qualquer cidadão. A cidadania é um direito oponível ao próprio Estado. Não é a supremacia só da lei, mas que esta reconheça direitos da cidadania que possa se opor ao próprio do Estado. E que a formação da vontade estatal seja heterônoma, não autônoma.Hoje a formação da vontade de um editor é totalmente autônoma, não é heterônoma. Não obstante, eles alegam interesse público, o que é correto, a notícia é de interesse público mesmo. Desde a eleição do que é um fato jornalístico ou não é, o processo de investigação e produção da notícia, o resultado final e a aceitação pela editoria, tudo isso teria que ser procedimentalizado através de uma lei social e democraticamente discutida.Aproveitar essa vivência própria do direito público que lida com questões do interesse público e transitá-la para o jornalismo. Os donos de jornais teriam consciência de que são donos de uma atividade privada que tem caráter híbrido, ela lida com um objeto que é de interesse público. Não é como vender sapato no supermercado. E os donos de televisão mais ainda são prestadores de serviço público.Indenização para coibir o abuso
[ Zé Dirceu ] Hoje nós não temos uma Lei de Imprensa, nem a teremos em curto prazo. Ainda que a ANJ tenha manifestado interesse nisso, na verdade estamos sem direito de resposta pois não há uma regulamentação nesse sentido. O que fazemos numa situação como essa? Direito de resposta e indenização à imagem são direitos constitucionais. Regulado ou não, temos que exigir. O poder judiciário tem que respeitar e fazer valer.
[ Pedro Serrano ] Sem dúvida alguma e através de ações, há mecanismos para isso. Houve uma mudança procedimental. Um procedimento próprio de Lei de Imprensa e hoje você entra com uma ação de obrigação para atender essa demanda.Quanto às indenizações, seria bom ter uma lei de imprensa específica com o efeito contrário ao que a ANJ quer fazer. Não devemos ter censura prévia, mas que seja vedado pelo Judiciário - salvo situações excepcionais como guerra, direito de menor - fornecer liminares como esta do Estadão. Por outro lado, como você faz o controle da legalidade da conduta? Através de atitudes repressivas.A indenização não pode ser na forma como o Direito civil subentende, de compor as perdas e danos. Como nos Estados Unidos, demonstrada a má fé – expressa pela ausência de cumprimento desse procedimento que já falei – o jornal tem que pagar uma indenização que coíba esse tipo de conduta.O Judiciário funciona como um herético de mercado de preço. Você tem que dissuadir o sujeito de fazer. Dependendo da característica de má fé, a indenização é para quebrar a empresa mesmo, para que ela saia do mercado. O Judiciário funciona como controle herético, serve de exemplo. Na sociedade, todo poder tem que corresponder a uma responsabilidade, esta é a relação do Estado de direito. Se reconhecemos que a mídia tem um espaço de poder grande, tem que ter responsabilidade também, senão fica uma atitude imperial, cada um faz o que quer e não tem responsabilidade nenhuma, domina a vida das pessoas, sem nenhum tipo de limite.Tem que ter uma lei de imprensa para justamente garantir que não haja censura, como houve agora, mas sobretudo garanta a responsabilidade.
[ Zé Dirceu ] Você considera que a decisão do desembargador Dácio Vieira é uma censura, mas concorda com a comparação que o Estadão faz com o AI-5, com o DIP da Era Vargas?
[ Pedro Serrano ] Não. É diferente uma ordem judiciária de uma ordem administrativa por razões óbvias. A lógica de uma nova legislação deveria ser de coibir condutas estatais que obstaculizassem a circulação da notícia, se ela existe, tem que circular. Agora, a forma de equilibrar a responsabilidade da produção é de forma repressiva, ou seja, você estabelecer indenizações efetivamente coativas do uso inapropriado dessa produção.Aí teríamos outras questões do direito brasileiro que favoreceria à constituição da pessoa jurídica, no caso dos jornais.A notícia não deixaráde ser veiculada
[ Zé Dirceu ] E no caso do direito de resposta, como lidamos com a questão do tempo. Se um processo leva 2, 3, 4 anos, qual o procedimento?
[ Pedro Serrano ] O cidadão é obrigado já na produção da notícia a produzir a resposta. Ele oferece o espaço do investigado. Na verdade, o espaço dedicado à notícia tem que ter o espaço físico destinado ao outro lado. A produção do conteúdo do contraditório não pode ficar a cargo do jornal, se o investigado quiser, ele tem o direito de ter sua própria assessoria para produzir aquela notícia. Se ele tiver problemas, abre mão e concede a entrevista para o jornalista do Jornal, mas ele tem que ter essa possibilidade. O jornal que não cumprir isso está sujeito a sanções repressivas e a pagar indenização. A notícia não deixará de ser veiculada.Essa experiência acumulada nós temos à mão desde a Revolução Francesa. Como funcionam as coisas quando você tem um valor ético e o desejo de controlar pela sociedade a conduta do poder e ao mesmo tempo garantir a liberdade? Ninguém vai controlar o conteúdo da notícia, mas o procedimento de produção dessa notícia, ou seja, o modo como ela é produzida.É a forma de lidar com a relação de tensão. Como você garante a liberdade de imprensa? Pelo conteúdo. Ele produz o conteúdo que quiser, a responsabilidade estará se não cumprir determinado procedimento. É imperfeito? É, mas é o mecanismo humano que adquirimos de conhecimento quando lidamos com o Estado que usa a força física que é um poder imenso. O mecanismo seria esse, o outro lado teria que vir junto com a notícia, porque aí você deixa o leitor julgar. O leitor terá seu direito respeitado também. Você produz a notícia, dá sua opinião – o jornal tem um espaço de opinião bem claro do que é opinião e notícia – e na notícia tem que vir o outro lado. E o leitor julga.Tem que dar um prazo mínimo de tempo antes publicar. Mas o jornalista fala “e o furo”? O furo é interesse privado, não é interesse público.
[ Zé Dirceu ] A questão do furo foi utilizada como um contraponto à criação do blog Fatos e Dados da Petrobras. Eles alegavam que ao montar o blog, a estatal divulgaria perguntas de um determinado jornal, tirando deste informações exclusivas. Na realidade, o Fatos e Dados abriu uma nova página no jornalismo brasileiro e na disputa pela informação no país. Depois da Petrobras, ninguém ficará mais inerte, nem passivo diante uma campanha, como estão fazendo contra ela, nos jornais.
[ Pedro Serrano ] Os mecanismos de comunicação se tornam mais democráticos na medida em que as tecnologias se tornam mais acessíveis. Esse é um exemplo de construção da informação de forma artificial nos meios de comunicação. É um meio de combate. Agora, imagine só, um investigado ter que criar as condições para se defender... Nem sempre isso é possível porque muitos não tem recursos. Para poder garantir a todos, seus direitos quando investigados pela imprensa, deveríamos criar mecanismos procedimentais dentro da própria imprensa, na produção da notícia, na escolha do fato jornalístico, no processo de produção da versão que seria e que no final chega à elaboração da notícia. Ela tem que ser um produto de um procedimento anterior. E se o jornal não quiser seguir o procedimento arcará com o ônus de não o seguir.Inclusive, esse procedimento garantiria vários interesses. Do jornalista para fazer veicular a notícia que deseja, mesmo contrariamente à visão do editor. Se é notícia de interesse público, os interesses privados devem se submeter a ele. É mais importante que o investigado se defenda ou que eu garanta o meu furo? É evidente que a defesa é mais importante, esse é um valor humano superior à idéia de se aparecer e apropriar financeiramente das conseqüências de uma notícia.Então, esse tipo de hierarquização de valores nós não podemos deixar nas mãos dos donos de jornais. A sociedade tem que chamar para si essa hierarquia. Procedimentar a produção da notícia garantiria, inclusive, a possibilidade de todos terem certa a veiculação da sua versão quando forem investigados.Sem falar que melhoraria a condição dos jornais, daria mais legitimidade para a produção de noticias no país, o jornalista passaria a ter um novo papel, mais relevante, inclusive.Donos dos meios de comunicação:aristocracia imperial.
[ Zé Dirceu ] Como você está acompanhando o papel da Conferência Nacional de Comunicação? As empresas com exceção da rede TV e a da Bandeirantes, se retiraram do debate.
[ Pedro Serrano ] É natural que os donos de meios de comunicação queiram fazer os seus interesses privados sobreporem aos interesses públicos. Este é um exemplo do que vai se enfrentar. Quando você fala em procedimentalizar notícia está, na verdade, tirando poder dos donos dos meios de comunicação em benefício da sociedade brasileira e da política no sentido mais amplo dessa palavra.Veja que eles se retiraram de uma Conferência Nacional! É um debate, não custa nada, basta ir lá conversar a respeito do que está sendo proposto. Até para o diálogo eles se negam. Um sinal claro de que ainda temos uma aristocracia imperial dominando a mídia nesse país. De como a lógica ainda é aristocrática, o proprietário é o dominante. Esse é o tipo de noção que a gente verifica.
[ Zé Dirceu ] Com sua experiência como advogado, como se dá a interferência da mídia nas decisões do âmbito judiciário? Os juízes e tribunais de segunda e terceira instância são influenciados pela mídia?
[ Pedro Serrano ] Muito. O negócio é tão influente que existem dois tipos de casos: os que tem repercussão pública e os que não tem. A máquina estatal judicial e de investigação também funciona de acordo com esse critério. Quando não tem repercussão é lenta, ineficaz, desatenta, burocrática. Quando tem, é mais ágil, completamente oposta, sofre condicionamentos sociais evidentes. É uma outra modalidade de comportamento.É tão impactante que se o sujeito adota uma linhagem realista – uma modalidade do direito que detém a condição de previsibilidade nas questões judiciais - ele não tem como desconsiderar a mídia como um dos fatores que deve levar em conta. Em prática forense, uma das aulas que dou na universidade, não dá para não falar de mídia na sala de aula. A idéia da prática, o direito como realidade no setor, não tem jeito.Há dois tribunais hoje, o formal do Estado e o real da mídia. Você tem que cooperar nos dois, o advogado em sua formação como profissional tem que ter aptidão para lidar com a mídia. Isso é desejável? Para fazer justiça não. Não dessa forma imperial que a mídia produz a notícia hoje. É negativo para o efeito de julgar as pessoas.
[ Zé Dirceu ] Sobre uma questão que está na ordem do dia, a anistia. O que fazer com os torturadores ou os que colaboraram com a ditadura e estão reivindicando indenização?
[ Pedro Serrano ] Eles estavam investido de uma função publica quando realizaram as infiltrações ou foram fazer as investigações. Enquanto agentes públicos, eles cometeram um crime. Eu nunca vi um sujeito ser indenizado por cometer um crime. As funções públicas não são só exercidas por servidores públicos formalmente investidos. Qualquer particular pode agir em nome do Estado, é um princípio administrativo. Os agentes públicos são os servidores públicos, agentes políticos e particulares em colaboração com o Estado.Neste caso, eles eram particulares em colaboração com o Estado, estavam investidos de poder como qualquer funcionário público, mas também de responsabilidades. E na medida em que agindo em nome do Estado cometeram crimes ou auxiliaram no processo de produção de crimes, não tem do que ser indenizados.O que está se indenizando na Lei de Anistia? Pessoas que foram vítimas de abuso estatal nos seus direitos. A questão não é saber se o sujeito estava ou não na guerrilha, ele era um sujeito aprisionado pelo Estado e como aprisionado tinha direitos, qualquer um tem. O sujeito não deixa de ser um ser humano pelo fato de estar aprisionado. Mesmo que na época, o sujeito tenha sido considerado criminoso - temos que partir desse pressuposto - ele tinha direitos. O que hoje se indeniza são os danos ocasionados por essa lesão ao direito que a pessoa tinha como aprisionado público.Nesse caso específico, os agentes não foram aprisionados, mas colaboradores do Estado que usufruíram do beneficio dessa colaboração e que cometeram crimes no exercício dessa função. Não me parece... Que eles não sejam punidos pelos crimes, é toda uma discussão da anistia no sentido penal, a discussão é outra. Mas indenizados não, é um outro parâmetro. Você sofreu alguma lesão da conduta ilícita do Estado? Eles foram os autores da conduta ilícita! É como se eu, como torturador, torturasse alguém e quisesse indenização pela tortura. Mas eu fui o agente estatal que realizou isso. Os agentes estatais que realizaram por obviedade não tem direitos à indenização.Por exemplo, o cabo Anselmo colaborou para que pessoas fossem torturadas e assassinadas, ele foi um agente, colaborou nesse processo, praticou atos ilícitos como agente de colaboração do Estado.Ele torturou e vai ser indenizado pela tortura?
[ Zé Dirceu ] E a reciprocidade da anistia?
[ Pedro Serrano ] A reciprocidade é no campo penal, ninguém será punido. Eu não concordo com ela, porque a lei não é recíproca, ela exclui crimes violentos, dos dois lados. Ela isentou agentes públicos que cometeram crimes de seqüestro sem violência, mas você pegar uma pessoa e a conduzir até a polícia, isso é seqüestro; os crimes de abuso de poder em si, que só caracterizaram abuso de poder, foram anistiados. Agora, os crimes de sangue não, de um lado e de outro. Crimes de sangue não se colocam no quadro geral da anistia, agora esse é do campo penal para isentar a pessoa de sanções penais.O que se trata do campo cível é do direito de indenização, como qualquer um que foi prejudicado pelo Estado e pede indenização. Eu fui prejudicado em meus direitos pelo Estado, que ocasionou danos civis e materiais, perdas de valores, quero indenização por isso. Agora, o agente que cometeu ilicitude pode se beneficiar penalmente, mas civilmente não. Ele torturou e vai ser indenizado pela tortura?O que se indeniza é o sujeito que foi aprisionado pelo Estado e houve abusos em relação a ele. O sujeito que foi ilicitamente perseguido pela Ditadura, sem processo, sem direito de defesa, sem notificação, nem nada e teve que se exilar. Situações que teve repercussões na vida da pessoa pela conduta abusiva do Estado.O agente do Estado, evidente, não pode ser indenizado civilmente pelo ato que ele praticou. Eu sou um motorista do Estado, bato no seu carro, você vai ser indenizado porque eu bati e eu também porque estou dirigindo o carro? Essa é a lógica. Não tem sentido, nem nexo lógico.
[ Zé Dirceu ] Como professor de Direito na PUC, você está em contato diretamente com a juventude. Qual a sua percepção sobre ela?
[ Pedro Serrano ] Essa resposta deve ser vista com reparo, quem envelhece tem sempre um olhar crítico em relação às gerações posteriores. Mas eu avalio que é uma juventude mais marcadamente conservadora do que a da minha época. Uma geração que incorporou uma noção radicalmente individualista que a gente até estranha, como referência. Por outro lado, é uma juventude bem informada e que exige que repensemos as relações de representação na política. Pela revolução tecnológica, pela crítica.Mas no geral, eu vejo nitidamente uma franca expansão dos valores do pensamento conservador na juventude brasileira. Nunca vi caldo tão propício para isso. No meu tempo, a pessoa poderia ser de direita mas tinha vergonha de falar, hoje em dia, não, pelo contrário.
[ Zé Dirceu ] Em relação ao controle da internet?
[ Pedro Serrano ] Nesse sentido há dois lados. A Internet expandiu, mas tem riscos potenciais. A grande discussão que existe há vários anos do ponto de vista jurídico é a da proteção da privacidade. É real isso. O fenômeno das chamadas nuvens de informática, você passar para os arquivos virtuais o que guarda. Isso tudo estabelece possibilidades de mecanismos de controle da vida privada que nunca vimos antes na história.Na realidade, cabe a nós entendermos que esse processo ocorre e estabelecer mecanismos de controle. De resto, só vejo coisas positivas. A possibilidade das pessoas se comunicarem imediatamente, sem controle estatal, nem do capital, é muito boa. No geral, há mais elementos positivos do que negativos.
-Extraído (autorizadamente) do Blog do Zé Dirceu - http://www.zedirceu.com.br/ - em 10/09/09
A conclusão é do advogado Pedro Estevam Serrano a respeito da forte influência da mídia no âmbito do direito e das decisões comunitárias no país. Com sua experiência de mais de 20 anos dedicados ao direito constitucional e administrativo, Serrano constata um tribunal lento, desatento e burocrático em casos de pouca repercussão pública e uma realidade completamente inversa ante os casos de maior repercussão jornalística.Para este professor de Direito forense na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), hoje, não é mais possível desconsiderar a influência da mídia nas decisões do Judiciário, uma realidade que permeia inclusive o conteúdo ensinado aos futuros advogados do país. Segundo Serrano "a mídia constrói símbolos, ergue e destrói personagens e interfere diretamente nas decisões comunitárias. Hoje, é mais relevante o que pensa o dono de um jornal do que qualquer parlamentar". Uma das razões pelas quais defende a responsabilização dos donos dos meios de comunicação é que eles tratam de conteúdo de interesse público, e não privado.De acordo com o advogado é urgente a necessidade da adoção de novos procedimentos para a produção da notícia. É a forma, justifica, de combater o comportamento "imperial e aristocrático dos donos dos meios de comunicação". Serrano defende a adoção de mecanismos próprios do Direito na elaboração de uma lei de imprensa realmente democrática.Sua proposta é de estabelecer procedimentos não sobre o conteúdo - essência da liberdade de imprensa - mas sobre a forma como a notícia é produzida, incluindo o direito do contraditório já na publicação da informação.
[ Zé Dirceu ] Como você avalia a mídia brasileira hoje? Podemos considerá-la um quarto poder?
[ Pedro Serrano ] Temos duas dimensões do que é considerado mídia. Hoje, há um processo de comunicação que domina todos os ambientes da vida humana. Na realidade, a natureza do capitalismo mudou. Atualmente, ele é mais uma máquina produtora de desejos do que de mercadorias, o chamado fetiche da mercadoria virou o produto principal, muito além da própria aquisição. Um autor chamado Gilles Lipovetsky afirma que a compra e as relações de consumo estão muito mais ligadas à experiência do que ao consumo material. Talvez, nunca em sua história, a humanidade tenha experimentado um período de tanta radicalização do poder do simbólico e da comunicação. Neste quadro, evidentemente, a mídia torna-se um poder social.Há também a ampliação da caracterização clássica do poder político, o uso da força física num âmbito legítimo e institucional. Hoje, o poder político implica mais do que o uso da força física, trata-se de qualquer tipo de condicionamento da vida humana e os mais diversos ambientes da vida estão permeados por esse tipo de questão.No Brasil, isso não é diferente. Quando você considera o conceito da mídia, no sentido de quem veicula notícias, o poder que ela tem sobre a vida social e comunitária das pessoas é imenso. A mídia constrói símbolos, ergue e destrói personagens e interfere diretamente nas decisões comunitárias. Hoje, é mais relevante o que pensa o dono de um jornal a qualquer parlamentar. Ele tem mais poder de decisões que interferem diretamente na vida das pessoas.Sem dúvidas, a mídia é um poder. Por isso, defendo a adoção de mecanismos próprios do Direito, ambiente que desde a Revolução Francesa vem acumulando conhecimento e portas de procedimentos em relação ao poder.Precisamos publicizaras regras de mídia.
[ Zé Dirceu ] Você acha que a adoção de uma lei de imprensa moderna como vigora nos países democráticos faz-se necessária também no Brasil?
[ Pedro Serrano ] Sim. Nós precisamos publicizar as regras da mídia. Existe uma tendência dos jornalistas a acreditar na informação imparcial, a notícia imparcial. Uma idéia que não se sustenta frente a menor observação empírica. A própria escolha do que é um fato jornalístico é uma escolha de valor. Por outro lado, isso não significa que a imparcialidade é tão inatingível que tanto faz. A busca pela imparcialidade não é um fato cientificamente apurável e não se atinge através do discurso científico, mas ela pode ser um valor ético. Óbvio que sujeita à toda subjetividade de qualquer valor, mas, sem dúvidas, é um valor ético.Notícia e imparcialidade nunca estarão juntas, mas são como duas grandes paralelas, podem estar a centímetros ou a metros, quilômetros de distância. A regulação da produção da notícia deve se dar através de mecanismos de natureza ética. Devemos entender a produção da notícia não como um produto de uma condição necessária ou de algo científica ou parcialmente verificado, mas como produto de um juízo ético.O segmento de conhecimento humano que mais tem lidado com controlar os poderes através de valores éticos é o direito público. É um fenômeno contemporâneo, você como advogado sabe, a interpenetração entre os direitos público e privado. Por exemplo, ambientes societários adotam leis do direito público; o controle tarifário é feito por concorrência, um controle típico do direito das relações privadas. Você tem uma interpenetração entre os dois fenômenos.Eu proponho que certos procedimentos próprios do Estado democrático sejam trazidos para a produção da notícia, com vistas à defesa de certos valores. Veja que os princípios jurídicos sempre incidem em tensão, jamais sozinhos, um colide com o outro. É o que ocorre nesse caso. A defesa de uma natureza democrática na produção da notícia se dá nessa tensão.Grosso modo seria a preservação da identidade de um lado, o direito de informar e de ser informado. Aí a distinção entre essa legislação democrática e uma legislação autoritária que iria contra essa tensão, servindo ao interesse do Estado. Não ponho nessa relação, em nenhum momento, o interesse do Estado como um interesse que deva ser considerado em uma lei de imprensa, até porque o governo geralmente é o principal investigado. Agora, você tem o direito da sociedade a se informar.Se informar não é sóter acesso à notíciaSe informar não é só ter acesso à notícia, mas que essa esta seja produzida por um procedimento que garanta o valor ético da imparcialidade. Creio que a sociedade - não os jornalistas, nem os donos de jornais – deva regular esses procedimentos da produção de notícia através de uma lei. Portanto, uma lei democrática de imprensa não vai discutir conteúdos, mas procedimentos. Ou seja, quais são os procedimentos que devem ser adotados na elaboração de uma notícia.Por exemplo, o outro lado não deve ser uma postura ética do jornal, mas uma válvula jurídica imposta. Quais os critérios desse outro lado? As razões que levam uma editora a negar a veiculação de uma notícia produzida por um jornalista precisam ser motivadas, o princípio da motivação. O dono de jornal está lidando com um assunto de interesse público – aliás, é esse o argumento deles para não serem censurados, o que é correto. Mas se estão realizando uma atividade de interesse público, precisam adotar um procedimento estabelecido por lei para negar, por exemplo, a veiculação da notícia ou para formatar uma notícia de dado modo. Isso tudo precisa ser justificado.Esse tipo de experimentação, o Estado já tem através do direito público com as licitações, os procedimentos de concurso, os atos administrativos etc. Trazer esse tipo de modo procedimental do direito privado para o âmbito de imprensa, talvez seja o mais adequado. Isso atende não só ao interesse da sociedade mas também o do jornalista. Na hora em que a produção dele for negada, o editor tem que justificar. É uma forma de atendermos também o direito das pessoas que foram acusadas e tem o direito de produzir a sua defesa.Como é feito hoje? Vai o jornalista do próprio jornal entrevistar o acusado. Você tem que dar o espaço de, para se a pessoa quiser, ter o seu assessor de imprensa. Que ele produza aquela notícia na formação técnica adequada e ocupe aquele espaço no jornal. Ou seja, temos que aperfeiçoar esses processos que são imperiais. O que vivemos hoje em relação à imprensa é muito semelhante ao período da aristocracia onde havia um imperador que era um governante absoluto do Estado, que não reconhecia na sociedade qualquer cidadão. A cidadania é um direito oponível ao próprio Estado. Não é a supremacia só da lei, mas que esta reconheça direitos da cidadania que possa se opor ao próprio do Estado. E que a formação da vontade estatal seja heterônoma, não autônoma.Hoje a formação da vontade de um editor é totalmente autônoma, não é heterônoma. Não obstante, eles alegam interesse público, o que é correto, a notícia é de interesse público mesmo. Desde a eleição do que é um fato jornalístico ou não é, o processo de investigação e produção da notícia, o resultado final e a aceitação pela editoria, tudo isso teria que ser procedimentalizado através de uma lei social e democraticamente discutida.Aproveitar essa vivência própria do direito público que lida com questões do interesse público e transitá-la para o jornalismo. Os donos de jornais teriam consciência de que são donos de uma atividade privada que tem caráter híbrido, ela lida com um objeto que é de interesse público. Não é como vender sapato no supermercado. E os donos de televisão mais ainda são prestadores de serviço público.Indenização para coibir o abuso
[ Zé Dirceu ] Hoje nós não temos uma Lei de Imprensa, nem a teremos em curto prazo. Ainda que a ANJ tenha manifestado interesse nisso, na verdade estamos sem direito de resposta pois não há uma regulamentação nesse sentido. O que fazemos numa situação como essa? Direito de resposta e indenização à imagem são direitos constitucionais. Regulado ou não, temos que exigir. O poder judiciário tem que respeitar e fazer valer.
[ Pedro Serrano ] Sem dúvida alguma e através de ações, há mecanismos para isso. Houve uma mudança procedimental. Um procedimento próprio de Lei de Imprensa e hoje você entra com uma ação de obrigação para atender essa demanda.Quanto às indenizações, seria bom ter uma lei de imprensa específica com o efeito contrário ao que a ANJ quer fazer. Não devemos ter censura prévia, mas que seja vedado pelo Judiciário - salvo situações excepcionais como guerra, direito de menor - fornecer liminares como esta do Estadão. Por outro lado, como você faz o controle da legalidade da conduta? Através de atitudes repressivas.A indenização não pode ser na forma como o Direito civil subentende, de compor as perdas e danos. Como nos Estados Unidos, demonstrada a má fé – expressa pela ausência de cumprimento desse procedimento que já falei – o jornal tem que pagar uma indenização que coíba esse tipo de conduta.O Judiciário funciona como um herético de mercado de preço. Você tem que dissuadir o sujeito de fazer. Dependendo da característica de má fé, a indenização é para quebrar a empresa mesmo, para que ela saia do mercado. O Judiciário funciona como controle herético, serve de exemplo. Na sociedade, todo poder tem que corresponder a uma responsabilidade, esta é a relação do Estado de direito. Se reconhecemos que a mídia tem um espaço de poder grande, tem que ter responsabilidade também, senão fica uma atitude imperial, cada um faz o que quer e não tem responsabilidade nenhuma, domina a vida das pessoas, sem nenhum tipo de limite.Tem que ter uma lei de imprensa para justamente garantir que não haja censura, como houve agora, mas sobretudo garanta a responsabilidade.
[ Zé Dirceu ] Você considera que a decisão do desembargador Dácio Vieira é uma censura, mas concorda com a comparação que o Estadão faz com o AI-5, com o DIP da Era Vargas?
[ Pedro Serrano ] Não. É diferente uma ordem judiciária de uma ordem administrativa por razões óbvias. A lógica de uma nova legislação deveria ser de coibir condutas estatais que obstaculizassem a circulação da notícia, se ela existe, tem que circular. Agora, a forma de equilibrar a responsabilidade da produção é de forma repressiva, ou seja, você estabelecer indenizações efetivamente coativas do uso inapropriado dessa produção.Aí teríamos outras questões do direito brasileiro que favoreceria à constituição da pessoa jurídica, no caso dos jornais.A notícia não deixaráde ser veiculada
[ Zé Dirceu ] E no caso do direito de resposta, como lidamos com a questão do tempo. Se um processo leva 2, 3, 4 anos, qual o procedimento?
[ Pedro Serrano ] O cidadão é obrigado já na produção da notícia a produzir a resposta. Ele oferece o espaço do investigado. Na verdade, o espaço dedicado à notícia tem que ter o espaço físico destinado ao outro lado. A produção do conteúdo do contraditório não pode ficar a cargo do jornal, se o investigado quiser, ele tem o direito de ter sua própria assessoria para produzir aquela notícia. Se ele tiver problemas, abre mão e concede a entrevista para o jornalista do Jornal, mas ele tem que ter essa possibilidade. O jornal que não cumprir isso está sujeito a sanções repressivas e a pagar indenização. A notícia não deixará de ser veiculada.Essa experiência acumulada nós temos à mão desde a Revolução Francesa. Como funcionam as coisas quando você tem um valor ético e o desejo de controlar pela sociedade a conduta do poder e ao mesmo tempo garantir a liberdade? Ninguém vai controlar o conteúdo da notícia, mas o procedimento de produção dessa notícia, ou seja, o modo como ela é produzida.É a forma de lidar com a relação de tensão. Como você garante a liberdade de imprensa? Pelo conteúdo. Ele produz o conteúdo que quiser, a responsabilidade estará se não cumprir determinado procedimento. É imperfeito? É, mas é o mecanismo humano que adquirimos de conhecimento quando lidamos com o Estado que usa a força física que é um poder imenso. O mecanismo seria esse, o outro lado teria que vir junto com a notícia, porque aí você deixa o leitor julgar. O leitor terá seu direito respeitado também. Você produz a notícia, dá sua opinião – o jornal tem um espaço de opinião bem claro do que é opinião e notícia – e na notícia tem que vir o outro lado. E o leitor julga.Tem que dar um prazo mínimo de tempo antes publicar. Mas o jornalista fala “e o furo”? O furo é interesse privado, não é interesse público.
[ Zé Dirceu ] A questão do furo foi utilizada como um contraponto à criação do blog Fatos e Dados da Petrobras. Eles alegavam que ao montar o blog, a estatal divulgaria perguntas de um determinado jornal, tirando deste informações exclusivas. Na realidade, o Fatos e Dados abriu uma nova página no jornalismo brasileiro e na disputa pela informação no país. Depois da Petrobras, ninguém ficará mais inerte, nem passivo diante uma campanha, como estão fazendo contra ela, nos jornais.
[ Pedro Serrano ] Os mecanismos de comunicação se tornam mais democráticos na medida em que as tecnologias se tornam mais acessíveis. Esse é um exemplo de construção da informação de forma artificial nos meios de comunicação. É um meio de combate. Agora, imagine só, um investigado ter que criar as condições para se defender... Nem sempre isso é possível porque muitos não tem recursos. Para poder garantir a todos, seus direitos quando investigados pela imprensa, deveríamos criar mecanismos procedimentais dentro da própria imprensa, na produção da notícia, na escolha do fato jornalístico, no processo de produção da versão que seria e que no final chega à elaboração da notícia. Ela tem que ser um produto de um procedimento anterior. E se o jornal não quiser seguir o procedimento arcará com o ônus de não o seguir.Inclusive, esse procedimento garantiria vários interesses. Do jornalista para fazer veicular a notícia que deseja, mesmo contrariamente à visão do editor. Se é notícia de interesse público, os interesses privados devem se submeter a ele. É mais importante que o investigado se defenda ou que eu garanta o meu furo? É evidente que a defesa é mais importante, esse é um valor humano superior à idéia de se aparecer e apropriar financeiramente das conseqüências de uma notícia.Então, esse tipo de hierarquização de valores nós não podemos deixar nas mãos dos donos de jornais. A sociedade tem que chamar para si essa hierarquia. Procedimentar a produção da notícia garantiria, inclusive, a possibilidade de todos terem certa a veiculação da sua versão quando forem investigados.Sem falar que melhoraria a condição dos jornais, daria mais legitimidade para a produção de noticias no país, o jornalista passaria a ter um novo papel, mais relevante, inclusive.Donos dos meios de comunicação:aristocracia imperial.
[ Zé Dirceu ] Como você está acompanhando o papel da Conferência Nacional de Comunicação? As empresas com exceção da rede TV e a da Bandeirantes, se retiraram do debate.
[ Pedro Serrano ] É natural que os donos de meios de comunicação queiram fazer os seus interesses privados sobreporem aos interesses públicos. Este é um exemplo do que vai se enfrentar. Quando você fala em procedimentalizar notícia está, na verdade, tirando poder dos donos dos meios de comunicação em benefício da sociedade brasileira e da política no sentido mais amplo dessa palavra.Veja que eles se retiraram de uma Conferência Nacional! É um debate, não custa nada, basta ir lá conversar a respeito do que está sendo proposto. Até para o diálogo eles se negam. Um sinal claro de que ainda temos uma aristocracia imperial dominando a mídia nesse país. De como a lógica ainda é aristocrática, o proprietário é o dominante. Esse é o tipo de noção que a gente verifica.
[ Zé Dirceu ] Com sua experiência como advogado, como se dá a interferência da mídia nas decisões do âmbito judiciário? Os juízes e tribunais de segunda e terceira instância são influenciados pela mídia?
[ Pedro Serrano ] Muito. O negócio é tão influente que existem dois tipos de casos: os que tem repercussão pública e os que não tem. A máquina estatal judicial e de investigação também funciona de acordo com esse critério. Quando não tem repercussão é lenta, ineficaz, desatenta, burocrática. Quando tem, é mais ágil, completamente oposta, sofre condicionamentos sociais evidentes. É uma outra modalidade de comportamento.É tão impactante que se o sujeito adota uma linhagem realista – uma modalidade do direito que detém a condição de previsibilidade nas questões judiciais - ele não tem como desconsiderar a mídia como um dos fatores que deve levar em conta. Em prática forense, uma das aulas que dou na universidade, não dá para não falar de mídia na sala de aula. A idéia da prática, o direito como realidade no setor, não tem jeito.Há dois tribunais hoje, o formal do Estado e o real da mídia. Você tem que cooperar nos dois, o advogado em sua formação como profissional tem que ter aptidão para lidar com a mídia. Isso é desejável? Para fazer justiça não. Não dessa forma imperial que a mídia produz a notícia hoje. É negativo para o efeito de julgar as pessoas.
[ Zé Dirceu ] Sobre uma questão que está na ordem do dia, a anistia. O que fazer com os torturadores ou os que colaboraram com a ditadura e estão reivindicando indenização?
[ Pedro Serrano ] Eles estavam investido de uma função publica quando realizaram as infiltrações ou foram fazer as investigações. Enquanto agentes públicos, eles cometeram um crime. Eu nunca vi um sujeito ser indenizado por cometer um crime. As funções públicas não são só exercidas por servidores públicos formalmente investidos. Qualquer particular pode agir em nome do Estado, é um princípio administrativo. Os agentes públicos são os servidores públicos, agentes políticos e particulares em colaboração com o Estado.Neste caso, eles eram particulares em colaboração com o Estado, estavam investidos de poder como qualquer funcionário público, mas também de responsabilidades. E na medida em que agindo em nome do Estado cometeram crimes ou auxiliaram no processo de produção de crimes, não tem do que ser indenizados.O que está se indenizando na Lei de Anistia? Pessoas que foram vítimas de abuso estatal nos seus direitos. A questão não é saber se o sujeito estava ou não na guerrilha, ele era um sujeito aprisionado pelo Estado e como aprisionado tinha direitos, qualquer um tem. O sujeito não deixa de ser um ser humano pelo fato de estar aprisionado. Mesmo que na época, o sujeito tenha sido considerado criminoso - temos que partir desse pressuposto - ele tinha direitos. O que hoje se indeniza são os danos ocasionados por essa lesão ao direito que a pessoa tinha como aprisionado público.Nesse caso específico, os agentes não foram aprisionados, mas colaboradores do Estado que usufruíram do beneficio dessa colaboração e que cometeram crimes no exercício dessa função. Não me parece... Que eles não sejam punidos pelos crimes, é toda uma discussão da anistia no sentido penal, a discussão é outra. Mas indenizados não, é um outro parâmetro. Você sofreu alguma lesão da conduta ilícita do Estado? Eles foram os autores da conduta ilícita! É como se eu, como torturador, torturasse alguém e quisesse indenização pela tortura. Mas eu fui o agente estatal que realizou isso. Os agentes estatais que realizaram por obviedade não tem direitos à indenização.Por exemplo, o cabo Anselmo colaborou para que pessoas fossem torturadas e assassinadas, ele foi um agente, colaborou nesse processo, praticou atos ilícitos como agente de colaboração do Estado.Ele torturou e vai ser indenizado pela tortura?
[ Zé Dirceu ] E a reciprocidade da anistia?
[ Pedro Serrano ] A reciprocidade é no campo penal, ninguém será punido. Eu não concordo com ela, porque a lei não é recíproca, ela exclui crimes violentos, dos dois lados. Ela isentou agentes públicos que cometeram crimes de seqüestro sem violência, mas você pegar uma pessoa e a conduzir até a polícia, isso é seqüestro; os crimes de abuso de poder em si, que só caracterizaram abuso de poder, foram anistiados. Agora, os crimes de sangue não, de um lado e de outro. Crimes de sangue não se colocam no quadro geral da anistia, agora esse é do campo penal para isentar a pessoa de sanções penais.O que se trata do campo cível é do direito de indenização, como qualquer um que foi prejudicado pelo Estado e pede indenização. Eu fui prejudicado em meus direitos pelo Estado, que ocasionou danos civis e materiais, perdas de valores, quero indenização por isso. Agora, o agente que cometeu ilicitude pode se beneficiar penalmente, mas civilmente não. Ele torturou e vai ser indenizado pela tortura?O que se indeniza é o sujeito que foi aprisionado pelo Estado e houve abusos em relação a ele. O sujeito que foi ilicitamente perseguido pela Ditadura, sem processo, sem direito de defesa, sem notificação, nem nada e teve que se exilar. Situações que teve repercussões na vida da pessoa pela conduta abusiva do Estado.O agente do Estado, evidente, não pode ser indenizado civilmente pelo ato que ele praticou. Eu sou um motorista do Estado, bato no seu carro, você vai ser indenizado porque eu bati e eu também porque estou dirigindo o carro? Essa é a lógica. Não tem sentido, nem nexo lógico.
[ Zé Dirceu ] Como professor de Direito na PUC, você está em contato diretamente com a juventude. Qual a sua percepção sobre ela?
[ Pedro Serrano ] Essa resposta deve ser vista com reparo, quem envelhece tem sempre um olhar crítico em relação às gerações posteriores. Mas eu avalio que é uma juventude mais marcadamente conservadora do que a da minha época. Uma geração que incorporou uma noção radicalmente individualista que a gente até estranha, como referência. Por outro lado, é uma juventude bem informada e que exige que repensemos as relações de representação na política. Pela revolução tecnológica, pela crítica.Mas no geral, eu vejo nitidamente uma franca expansão dos valores do pensamento conservador na juventude brasileira. Nunca vi caldo tão propício para isso. No meu tempo, a pessoa poderia ser de direita mas tinha vergonha de falar, hoje em dia, não, pelo contrário.
[ Zé Dirceu ] Em relação ao controle da internet?
[ Pedro Serrano ] Nesse sentido há dois lados. A Internet expandiu, mas tem riscos potenciais. A grande discussão que existe há vários anos do ponto de vista jurídico é a da proteção da privacidade. É real isso. O fenômeno das chamadas nuvens de informática, você passar para os arquivos virtuais o que guarda. Isso tudo estabelece possibilidades de mecanismos de controle da vida privada que nunca vimos antes na história.Na realidade, cabe a nós entendermos que esse processo ocorre e estabelecer mecanismos de controle. De resto, só vejo coisas positivas. A possibilidade das pessoas se comunicarem imediatamente, sem controle estatal, nem do capital, é muito boa. No geral, há mais elementos positivos do que negativos.
-Extraído (autorizadamente) do Blog do Zé Dirceu - http://www.zedirceu.com.br/ - em 10/09/09
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